20 junho 2012
Bomba atómica ou cheia no Nilo?
Bomba atómica ou cheia no Nilo? (cont.)
18 abril 2012
A Propósito do Tratado Orçamental Europeu
Prevalece a noção, que muitos economistas têm denunciado como falaciosa, de que uma restrição do deficit e da dívida pública assegura que as forças de mercado são capazes de dinamizar o crescimento económico equilibrado.
Parece esquecida a análise da génese da crise económica, que a revelou como uma crise global e sistémica, que só reformas profundas, em particular as dirigidas a disciplinar o sistema financeiro, poderiam resolver.
Não é este, infelizmente, o caminho que tem sido seguido pelas instâncias internacionais e pelos governos, incluindo os europeus.
Após 15 anos de vigência do Pacto de Estabilidade e Crescimento, que impôs regras de disciplina orçamental, pelo estabelecimento de limites ao deficit e à dívida pública em percentagem do PIB, sem atender às diferentes capacidades de desenvolvimento dos estados-membros da U.E., e impedidos estes, mais tarde, com a adesão ao Euro, de usar o mecanismo da desvalorização monetária, não se criaram as condições necessárias para um crescimento harmonioso da economia europeia refém de um paradigma ultraliberal.
Agora,em vez do reforço da coordenação económica na U.E., como se impunha para fazer face à crise, o que acaba de se anunciar é a aprovação de um Tratado Orçamental Europeu com vista a um controlo orçamental muito exigente, instituindo mecanismos de penalização automática para os Estados prevaricadores.
Alega-se a inevitabilidade de adesão a estas regras para que não aconteça o fechar do acesso às fontes de financiamento e que seria inútil discutir o assunto.
Regras fundamentais da democracia ditam, pelo contrário, que os responsáveis sejam chamados a explicar quais as consequências das decisões que tomam e o que se propõem para defender os direitos dos cidadãos que representam.
Está em causa a aceitação de regras reforçadas de controlo orçamental, cuja observância depende, em grande parte, de factores de ordem exógena às decisões de um governo. Em consequência, as medidas de austeridade serão ainda mais gravosas; a recessão económica será ainda mais pronunciada; a pobreza, as desigualdades e o desemprego vão aumentar e perde-se o sentido de coesão. E, afinal, pode ficar em risco a capacidade de cumprir as obrigações de serviço da dívida, receio que até já os mercados financeiros têm vindo a manifestar.
Será possível manter por mais tempo a submissão da política europeia a regras ditadas por interesses de algumas minorias, pela perda do ideal da solidariedade europeia e pelo inquinar da teoria macroeconómica por ideologias que têm provado não favorecer um desenvolvimento equilibrado?
Se esta é uma visão pessimista, onde estão os argumentos que nos convençam do contrário?
08 dezembro 2011
Chegou o Inverno e os Srs. Marqueses insistem em manter janelas e portas abertas
Disseram-lhes que, mesmo no Inverno, deveriam manter as portas e janelas escancaradas, porque isso trazia ar fresco, limpava os pulmões e dava energia revigorada. Argumentaram que a “livre circulação” era uma virtude.
Os Srs. Marqueses acreditaram no que lhes tinha sido dito e deram instruções aos seus familiares e subordinados para manterem a livre circulação. A recomendação apresentava-se como credível porque, dizia-se, estava fundamentada em investigações científicas aprofundadas, realizadas na Universidade de Chicago (Escola de Chicago) por um cientista de nome Milton Friedman e pelos seus “rapazes”.
No palácio, nem toda a gente quis cumprir, de ânimo leve, estas recomendações, mas com mais ameaça, ou menos ameaça todos se renderam às instruções da Sr.ª Marquesa (Ângela) e do Sr. Marquês (Nicolau). Aliás, a Marquesa era a maior defensora das novas teorias; o marquês limitava-se a seguir-lhe os passos.
Sabia-se que algumas das pessoas que viviam no palácio, eram mais frágeis e se poderiam vir a constipar com as correntes de ar frio, com mais facilidade que outras, mas isso não era considerado problema demasiado sério. É certo que os que poderiam apanhar gripe iriam passar um mau bocado mas, mesmo assim, valia a pena correr o risco porque, no fim, todos lucrariam com os bons ares que continuamente limpavam o palácio de todos os maus vírus.
A grande surpresa estaria para vir. É que, a percentagem das pessoas infectadas pelo vírus veio a revelar-se muito mais elevada do que o que era inicialmente previsto. E rapidamente se transmitiu a quase toda a gente. O efeito de contágio estava a gerar uma epidemia.
Em certa altura, apesar de todas as vitaminas que tinham tomado, até os marqueses começaram a ter dores de cabeça, mas insistiam que as suas causas não estavam na livre circulação mas, antes, nos desmandos da criadagem que nas férias de Verão se tinham fartado de passear e gastar dinheiro e, agora, não tinham dinheiro para comprar os agasalhos necessários. Os marqueses viram-se obrigados a adiantar dinheiro para os agasalhos, mas a epidemia grassava cada vez com mais intensidade. Que fazer, então?
Gerou-se grande discussão, mas os marqueses insistiam na sua de manter portas e janelas abertas. Houve quem se começasse a pôr a questão de saber porque é que a livre circulação trazia consequências que não tinham sido previstos pela Escola de Chicago e pelos seus animadores?
Desde há muito era do senso comum que o ano se desenvolvia segundo um ciclo de estações (Primavera, Verão, Outono e Inverno) e que durante cada uma das estações havia comportamentos diversificados, de modo a que cada um pudesse dai retirar os maiores benefícios. Por isso, não fazia muito sentido que no Inverno se semeassem os cereais, se andasse a comer cerejas e se mantivessem as portas e janelas abertas. Daí não viriam, certamente, bons resultados. Isto é, as várias fases do ciclo económico não podem ser tratadas, todas, com as mesmas políticas.
Creio que já terão compreendido que a alegoria que acaba de ser descrita é como que a de um pequeno presépio da situação económico-financeira que hoje se verifica na Euro Zona. Nos próximos dias vai-se realizar uma Cimeira para a qual é anunciada a tomada de decisões importantes que poderão implicar a revisão dos Tratados.
Bem precisam os Tratados de ser revistos, mas não é, certamente, no sentido de que se vem falando, ou seja o de impedir que a criadagem seja “libertina” durante o Verão, obrigando-a a que no código de conduta de cada um fique inscrito o compromisso de renúncia à libertinagem.
Com efeito, nunca a vida no palácio passará a ser robusta e salutar se ela não tiver como fundamento os princípios da vida em comunidade, em que todos sabem que precisam de todos e em que, as decisões que vierem a ser tomadas, o têm que ser, no pressuposto de que, com mais ou menos tempo, o que hoje é mau para uns o será mais tarde, também, para os restantes.
Daí que se deva irradiar do clima das discussões a ideia de que para que os PIGS (Portugal, Itália, Grécia e Espanha) se salvem será necessário que países como a Alemanha façam sacrifícios. Em primeiro lugar, porque está longe de ser verdade que esses sacrifícios existam; em segundo, porque mesmo que existissem eles não poderiam deixar de ser encarados como investimento, cujos frutos serão colhidos no futuro.
Chegados aqui, a pergunta é: mas então o que é que se propõe ou deveria ser proposto para que o futuro da Europa se tornasse sustentável? São essas as propostas que deveriam fornecer a substância da revisão dos Tratados.
Este post já não contem espaço que permita que se avance na reflexão sobre essas propostas. Fá-lo-ei num próximo.
02 dezembro 2011
Algumas coisas sobre a “dívida” que você gostaria de saber e que porventura ainda não sabe
De entre um conjunto de países em que se incluem, a Alemanha, a Espanha, os EUA, a França, a Grécia, a Irlanda, a Itália, o Japão, Portugal e o UK, Portugal é o país que, em valores absolutos, possui a dívida externa mais baixa. A alemã é 10,5 vezes superior à portuguesa, a do UK é 18,3 vezes superior e a dos EUA 27,3 vezes superior.
Se em vez do total da dívida externa, tomarmos apenas a dívida pública, Portugal continua a ser o país com menor montante de dívida, seguido da Grécia, Espanha, UK, Itália, França, Alemanha, Japão e EUA.
É verdade que não tem muito sentido compararmos a dívida em valor absoluto mas, mesmo assim, não é totalmente despiciendo fazê-lo, já que por aí vai correndo a ideia de que a dívida nos PIGS (Portugal, Itália, Grécia e Espanha) ultrapassa todos os limites, o que pode levar muitos dos leitores a pensar que se trata dos valores absolutos.
Vejamos então indicadores mais sensatos como o da dívida per capita. Surpresa: a Espanha, a Alemanha, a França e o UK possuem dívidas per capita superiores à portuguesa; a Grécia, os EUA, a Itália e o Japão possuem dívidas mais baixas. No entanto, por ex., a dívida portuguesa é, apenas 8% superior à dos EUA; em sentido contrário, a da Alemanha, é superior à de Portugal, em 33%, a da França 74%, a do UK, 208%, etc.
Uma outra questão interessante é a de saber qual é o peso das dívida pública no total da divida externa: em Portugal é de 42%, na Alemanha é de 47%, na Grécia é de 66%, nos EUA é de 99%.
Tudo isto parece muito estranho, pelo menos quando comparado com a empastada informação que nos tem sido transmitida.
Tudo isto e muito mais pode ser encontrado aqui. Este aqui é a BBC.
Alguma da explicação para esta perplexidade poderá ser encontrada se, no sítio acima referido, formos ver quem é que possui a dívida de cada um dos países, nomedamente a dos PIGS.
Cá está o tal efeito “sistémico”!
05 agosto 2011
Hamster impossível
02 junho 2011
A Eurozona sob Fogo Cruzado e a Dívida Portuguesa
12 abril 2011
Uma Acção de Cidadania - Denúncia acerca de três Agências de Rating
28 fevereiro 2011
A Hora da Verdade - a Imperativa Mudança de Paradigma
03 fevereiro 2011
Por Onde Vai o “Estado Social”?
05 janeiro 2011
Crise e Regulação Financeira
A gravidade da crise financeira e o seu impacto nos vários espaços económicos mundiais, nomeadamente fenómenos de desemprego, estagnação e desequilíbrios orçamentais e nas contas externas, motivaram o GES a reflectir sobre o tema da regulação financeira e a convidar para o debater um conjunto de pessoas especialmente qualificadas, cujos pontos de vista se encontram nesta publicação.
Como é sabido, os problemas referidos não se encontram de todo resolvidos à escala global, nem a U. E. se tem mostrado capaz de os enfrentar eficazmente.
Perante uma séria ameaça à zona euro, que alguns economistas consideram já de sobrevivência duvidosa, é lamentável que a U.E. aposte, sobretudo, em políticas assentes em apoios financeiros a alguns estados membros em maiores dificuldades, ao mesmo tempo que lhes impõe um rápido reequilíbrio orçamental e reformas estruturais com evidentes efeitos recessivos.
De facto, tem vindo a tornar-se cada vez mais evidente que só uma mais forte integração europeia e a adopção de medidas de coordenação das economias teriam a possibilidade de salvaguardar o futuro do projecto europeu.
Enquanto a U.E. não opta por este caminho o poder dos mercados financeiros parece fortalecer-se cada vez mais, ditando as regras do jogo perante a submissão dos Estados.
Com a divulgação deste livro desejamos contribuir para que as questões em aberto na reforma do sistema financeiro, que a todos interessa, sejam devidamente ponderadas por aqueles que têm especial responsabilidade, designadamente as instâncias políticas, nacionais e comunitárias, o mundo académico e o profissional.
20 dezembro 2010
Conversemos a sério sobre a Saúde
Ora o risco de degradação do Sistema de Saúde português, com as dificuldades já patentes no orçamento da saúde para 2011, que algum marketing aproveita para vender a “miragem” de modelos incompatíveis com a coesão social (como, por exemplo, os que defendem uma certa concepção de livre escolha em matéria de cuidados de saúde, só acessível aos mais afluentes), torna da maior urgência uma séria reflexão por parte de todos nós.
Por isso é irrecusável o convite à reflexão e ao compromisso exigente com o bem comum, como é apresentado por Constantino Sakellarides, no livro que recentemente publicou: Novo Contrato Social da Saúde – Incluir as pessoas.
Compromisso exigente pelo que pressupõe de procura de equilíbrio entre o interesse individual e o bem comum; compromisso exigente porque não se satisfaz com um acordo pontual, antes implica uma permanente atenção à forma como ele é posto em prática, algo que temos tendência a subvalorizar.
No conjunto dos doze “sítios” em que nos podemos sentar a conversar que o autor nos apresenta, encontra-se espaço para a intervenção de todos os agentes relevantes do sector, incluindo as pessoas comuns chamadas ao exercício responsável da cidadania.
Como ficarmos alheios à distribuição dos recursos na saúde?
Como não sermos claros acerca do que esperamos do desempenho do sistema de saúde e como tomarmos consciência do possível?
Porquê não incentivarmos parcerias locais, intersectoriais, para alcançar metas relevantes para a saúde?
Como não aceitar o desafio de uma melhor capacitação de todos nós em saúde?
A procura de um “novo contrato social para a saúde” que reforce os valores de “solidariedade”, “previdência” e “coesão social” como referências civilizacionais essenciais de uma “sociedade de bem-estar” inclusiva, compatível com um crescimento económico centrado na qualificação é o cenário apresentado por Constantino Sakellarides que nos interessa ajudar a construir.
13 dezembro 2010
"A economia sem muros" – um contributo à mudança necessária
09 dezembro 2010
A nova Economia dispensa rótulos.
01 dezembro 2010
"Afinal Vale a Pena Protestar!"
...e não desistir de procurar outras propostas
30 novembro 2010
Economia social e desenvolvimento local
- Uma combinação virtuosa
Não nos iludamos com a generosidade ocasional, pois o maior desafio continua a ser o de permitir viabilizar, no nosso País, uma economia real, integrada e sustentável, que gere emprego para todos, assegure a justa repartição do rendimento, proporcione qualidade de vida e bem-estar colectivo e erradique a pobreza.
26 novembro 2010
É a Guerra dos Mercados ou a Guerra de Outra Maneira?
Tem-se falado muito da agressividade dos mercados financeiros quando a eles se dirigem países com fragilidades económico-sociais, como as que têm vindo a ser reveladas por países como a Grécia, a Irlanda, Portugal e até a Espanha. Explicar essa agressividade apenas com a existência de fragilidades de quem procura o crédito, nomeadamente, as que decorrem do peso elevado das suas dívidas externas (pública e privada), é o mesmo que medir a dimensão do iceberg através da sua parte emersa.
Aquela agressividade tem-se caracterizado pela extorsão (crime, que em termos individuais está sujeito a sanção pelo Código Penal) feita sobre os recursos dos países que recorrem ao crédito e que se traduzem, em particular, por insuportáveis subidas de taxa de juro. Este comportamento não tem, no entanto, similitude com o que é adoptado face a outros países com necessidades de endividamento equivalentes. O que pode explicar a diversidade de comportamento?
Como é conhecido, o nível de actividade económica baixou, substancialmente, nos países mais desenvolvidos, na sequência dos acontecimentos do Outono de 2008. Isto significa que diminuíram as oportunidades de investimento na actividade produtiva, ou diminuíram, pelo menos, as oportunidades de retorno de taxas de remuneração do capital tão elevadas como as que eram obtidas anteriormente. Não é de excluir, também, que tenha chegado à maturidade a vaga tecnológica que até há pouco assegurou remunerações elevadas, mas que começam, por essa razão, a diminuir.
Assim sendo, a liquidez existente vai-se afastando da actividade produtiva e concentra-se em aplicações financeiras, à procura de remunerações mais elevadas. Importa referir de onde vem essa liquidez. É colocada no mercado por particulares (especuladores ou não), mas também, e talvez sobretudo, pelos Estados. Para realizarem essas colocações, Estados e particulares servem-se de intermediários financeiros (bancos, mas não só) que procuram satisfazer os apetites dos seus representados. Por isso, concentram baterias junto dos Estados que necessitando de crédito, para negociarem das taxas de juro razoáveis, se encontram em situação de maior debilidade, a curto, médio e longo prazo.
Tem-se vindo a verificar que, por ocasião da colocação das emissões de dívida, apesar de a oferta ser superior à procura, mesmo assim o preço do dinheiro sobe. Isso só pode ser explicado pela cartelização dos intermediários financeiros. E porque nesta guerra estão, também, envolvidos Estados, bem se pode falar de extorsão de uns países sobre os recursos dos outros, tal como aconteceu e acontece em todas as guerras.
A guerra financeira surge, assim, como uma outra face das designadas guerras limpas (químicas, bacteriológicas, biológicas ou outras). Ela tem os mesmos efeitos da ocupação (influência) territorial das guerras clássicas.
Depois dos anunciados pedidos de apoio feitos pela Irlanda ao Fundo Monetário Internacional e à União Europeia, tem-se especulado sobre se a pressão sobre Portugal, para a subida das taxas de juro, vai diminuir ou aumentar. O argumento de que a situação portuguesa é diferente da da Irlanda tem servido para justificar que a pressão diminuirá.
Do meu ponto de vista ela só diminuirá, se a liquidez existente nos mercados financeiros for capaz de encontrar aplicações alternativas que considere mais compensadoras, o que não me parece que seja o caso, ou se, devido à intervenção de instâncias internacionais, o país passar a dispor da liquidez de que necessita, sem se socorrer dos mercados financeiros. Por isso, se quisermos mais dinheiro, ou pagamos o que os mercados nos exigem (não estamos em condições de os contrariar) ou vamos ao Fundo, ou aos Fundos.
Quererá isto dizer que, numa perspectiva de curto prazo, perdemos toda a nossa capacidade de decisão e intervenção? Creio que não. É oportuno recordar que, também o David venceu Golias, socorrendo-se de uma simples fisga. Está, certamente chegada a altura de irmos buscar as fisgas ao armário e de começar a fazer alguns exercícios de pontaria.
Tendo efeitos equivalentes aos das outras guerras justifica-se plenamente que contra esta guerra (que nos é imposta) nos mobilizemos como faríamos contra outras de cariz militar. Como?
Procurando construir mecanismos de independência nacional suportados por opções de modelos de desenvolvimento alternativos, que nos libertem, pouco a pouco, da necessidade crescente de pedir dinheiro emprestado, ainda que para isso seja necessário regressar ao “maquis” (território da resistência).
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22 novembro 2010
A Cimeira da NATO
promove a competitividade de Portugal
Voltemos à crise. As razões da crise, para além do fósforo que acendeu a fogueira, não estão no fósforo (embora se não existisse não teríamos, provavelmente, fogueira tão rapidamente), mas no lixo a que o fósforo pegou fogo. É a criação de lixo que tem que ser evitada. A crise entre nós, para além das suas raízes internacionais pegou-se, de forma mais persistente, precisamente devido à nossa falta de competitividade. E que tem isto a ver com a Cimeira? Muito.
21 novembro 2010
Para uma Nova Economia
16 novembro 2010
Sempre vamos ao Fundo? E depois?
Tem alguma, mas não tanta quanto, por vezes, se tenta fazer crer. E é assim, pela simples razão de que o fundo já muitos o tocam e lhe sofrem as consequências. Esses, e são muitos, não ficarão muito piores com a chegada do Fundo (Fundo Monetário Internacional) Mas há o risco de muitos outros, que ainda não tocaram o fundo, para lá poderem ser atirados. Com efeito, não são, necessariamente, os que do Fundo mais falam e observam de longe, os que dele poderão vir a sofrer as mais gravosas consequências, mas antes os que na carteira, mas também no corpo, sofrem a dureza da falta de emprego, de sustento e de abrigo, para si e para as suas famílias.
Para estes pouco importa falar da necessidade de apertar o cinto, uns porque já não têm mais furos no cinto, outros porque já nem cinto possuem. São estes “sem voz” que mais nos devem interessar e preocupar. Há que lhes devolver a voz e com ela a dignidade, princípio fundador de toda e qualquer sociedade democrática. Os outros, os que mais falam da crise, e mais ameaçam com o fundo (e com o Fundo) são os que porventura apanham algumas beliscadas no seu património, mas não deixam, por isso, de continuar a acumular fontes de rendimento, a gozar férias, a ir aos restaurantes e, muito provavelmente, a jogar golfe.
De facto, a resposta tem uma importância relativa, porque os passos e as políticas que vão ter de ser seguidas serão sempre muito violentas. A diferença poderá (poderia) estar no facto de que sem Fundo poderíamos mais facilmente escapar à aplicação das suas “receitas” tradicionais optando por medidas de política que melhor soubessem escolher entre os que mais têm e os que menos têm. Há muitas dúvidas de que essa margem de opções de escolha seja salvaguardada, mas não é por isso que devemos deixar cair os braços.
Vai-se dizendo que chegamos ao fundo por causa do exagero da “dívida pública soberana” e do valor das taxas de juro que nos são exigidas, sempre que recorremos ao mercado, justificadas, precisamente, por causa desse exagero. Há várias passagens neste argumentário que apenas nos podem deixar perplexos. Convém, além disso, que não se esqueça que para esse valor tanto contribui a dívida pública, como a dívida privada.
Diz-se, habitualmente, que só tem problemas com a dívida, quem se endivida, para daí inferir que quem não quer ter problemas com a dívida não se deve endividar. É uma ilação abusiva, porque o recurso ao crédito pode ter virtualidades positivas. Basta que se possa adquirir o crédito a um preço (taxa de juro) que seja mais do que compensado pelos benefícios que podem vir a ser recolhidos com as utilizações que com ele são feitas. Se os custos são superiores aos benefícios, de forma previsivelmente permanente, o endividamento só se ultrapassa comprometendo o futuro do país aos credores.
Só que nesta matéria, de avaliação dos custos e dos benefícios, importa a que é feita por quem vai ao crédito mas, também, a de quem o concede. Teoricamente, as duas posições deveriam encontrar-se no mercado e aí tentar compatibilizar-se. Ora este mercado não está apenas povoado de anjos. Há nele quem tenha posições dominantes e quem a elas tenha que se submeter.
Que significam as posições dominantes e porque é que acontecem? Quando se invocam as virtualidades do mercado tem que se pressupor que os agentes de mercado (compradores e vendedores, neste caso de crédito) actuam de forma perfeitamente livre e sem condicionamentos que não sejam os do volume da oferta e da procura. Se uma parte dos agentes tem condições para assumir posições dominantes, isso significa que o mercado não é livre.
Ora, é isso que estamos vendo acontecer: a oferta criou condições para condicionar a procura, ou uma parte dela. Quem oferece dinheiro, procura para ele obter a maior remuneração e não hesita em bater à porta de quem possa condicionar a pagar-lhe a remuneração mais elevada possível.
Ora, no mercado, os agentes da procura não são igualmente poderosos. A dimensão, física e económica, dos países e as suas capacidades de desenvolvimento potencial condicionam esse poder. Temos vindo a verificar que quanto mais pequena é aquela dimensão e quanto mais frágeis são as suas bases de crescimento, mais facilmente esses países se tornam presas do capital financeiro internacional. Fala-se de contágio, como na gripe: os que são mais fracos deixam-se contagiar mais facilmente. Para os que emprestam quanto maior for o contágio, melhor.
Há poucos dias, por ocasião da colocação de mais uma tranche de dívida no mercado internacional, ouvimos os mais variados comentadores dizer, sem qualquer tremor de voz, que a taxa de juro subiu, mas que a oferta, mesmo assim, foi superior à procura colocada no mercado. Ninguém se lembrou de perguntar, porque é que, se há mercado e se a oferta é superior à procura, o preço (taxa de juro) não desceu?
Evidentemente que a taxa de juro deveria ter descido mas, para isso, seria necessário que os pequenos tivessem o poder dos grandes. Como os donos do dinheiro se fixam determinados objectivos de remuneração e não a podem obter junto dos mais poderosos, vão forçar os mais fracos a pagar-lha. É, por isso que quem está na berlinda são países como a Grécia, a Irlanda e Portugal, e não outros que possuem pesos da dívida equiparáveis e mesmo superiores.
E “o depois”? O depois exigiria delongas que já não são compatíveis com a dimensão deste post. Mesmo assim importa dizer que “o depois” tem que ser construído, substituindo, progressivamente, e cada vez mais, os recursos financeiros externos pelos internos, qualificando os nossos recursos materiais e organizativos (quer dizer, aumentado a produtividade) e adaptando os nossos modelos de consumo àquilo que são as nossas capacidades colectivas, nunca fazendo concessões em relação a objectivos de equidade e de desenvolvimento sustentável.
Tudo isto terá que ser feito com um grande esforço de mobilização colectiva, em que cada um se sinta parte e não incluído nos “outros”.