Intervindo
na Conferência Internacional “Democracy and Participation in the 21st Century”,
organizada pela Associação Internacional de Sociologia no ISEG, nos dias 12 a
14 deste mês de Julho, colocávamos, entre outras, as seguintes questões:
- será a alternância democrática
suficientemente eficaz para erradicar as sequelas da inércia institucional, da
burocracia e das medidas austeritárias que
a ideologia neo-liberal e os governos de direita têm vindo a reforçar?
-
e os governos, enquanto reguladores e promotores de novas políticas públicas, conseguirão,
efectivamente, fazer vingar as renovadas preocupações democráticas face à
resistência daquele muro de inflexibilidade ?
Numa fase em que cada vez mais a
política é vista como espectáculo por parte da opinião pública, corre-se o
risco de muitas das medidas anunciadas não deixarem de parecer simples
retórica, dada a impossibilidade de superação do colete de forças prevalecente.
Sem que o queiramos, instala-se progressivamente uma dúvida avassaladora:
-
será que a ideologia neo-liberal não continuará a estar presente mesmo depois
da mudança de orientação política do
governo?
Vinham
estas questões a propósito das novas políticas e programas de desenvolvimento
do conhecimento, anunciadas pelo actual governo português, e que se inscrevem
abertamente no objectivo de construção de uma ampla democracia deliberativa
naquele domínio[1].
No
entanto, inércia institucional, burocracia e sequelas austeritárias continuam a
marcar também muitos outros domínios da realidade portuguesa dos nossos dias. É
isso que vemos na falta de recursos, na teia hierárquica de incompetências
várias, na inércia das decisões que obrigam – deviam obrigar – as cadeias de
comando em tempo útil, na falta de transparência perante a opinião pública, na
demora na contabilidade e reparação dos estragos. Estamos a pensar na situação
dramática que o país vive com os incêndios, devastadores como nunca,
intermináveis, diariamente reacendidos. Tal como no ano passado, no anterior,
em sucessivos e demasiados anos anteriores, voltamos a ouvir as mesmas culpas e
sugestões, a assistir aos mesmos debates, a tomar contacto com diversos estudos
de outros tantos peritos, a ouvir falar da constituição de comissões de
investigação. Como se há cerca de 5 semanas não tivessem morrido tantas dezenas
de pessoas e tantas outras não tivessem ficado sem meios de vida, debilitadas
para sempre.
Mesmo quando, perante a tragédia brutal, queríamos crer que desta
vez não seria assim…
Mas
poderíamos chegar a conclusões idênticas noutros domínios, como o da Educação,
onde o único meio aparentemente eficaz para vencer a burocracia é ... a
ilegalidade, como nos mostra a presente questão das matrículas.
Não
há democracia que vingue sem capacidade de decisão efectiva, desassombrada e
surgindo em tempo oportuno. Ou então correrá o risco de se confundir com mero
exercício de retórica.
[1][1] Consultar o
portal do Ministério para a Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, em: http://www.portugal.gov.pt/pt/ministerios/mctes.aspx e, especialmente, o anúncio de medidas como o
Orçamento Participativo para a Ciência e a Tecnologia e o correspondente Programa
Plurianual , ainda hoje sem data prevista para a sua implementação.
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