Introdução
Repensar o trabalho é uma
reflexão que se impõe para enfrentar os desafios presentes e os do futuro. Foi
através do trabalho que o ser humano, ao longo dos tempos, se organizou e se
socializou, definindo o trabalho/emprego como um direito inalienável e
indispensável. As mudanças que se estão desde já a sentir e que têm sido
atribuídas à conjugação do aprofundamento da globalização com o avanço
tecnológico, bem como as que se perspectivam para o futuro, estão a provocar
alterações na produção e, consequentemente, no trabalho. Tais alterações questionam
os modelos tradicionais e colocam questões a que é preciso responder,
designadamente no que respeita à coesão social.
Segundo a Organização
Internacional do Trabalho[i], o mundo do trabalho é o teatro de uma mutação profunda, num período em
que a economia mundial não cria empregos suficientes… E ao desemprego massivo,
junta-se a profunda transformação que conhece a relação de trabalho, portadora
de novos desafios a vencer.
Nas economias avançadas,
a recuperação dos postos de trabalho está a fazer-se lentamente, mas o emprego
permanece bem abaixo dos níveis antes da crise, em muitos países da OCDE,
especialmente na Europa[ii]. De acordo com esta
organização, o tempo está a esgotar-se
para evitar que as cicatrizes da crise se tornem permanentes, com milhões de
trabalhadores apanhados na armadilha da permanência no fundo da escada
económica. O longo legado da crise terá feito subir as desigualdades e
existe o perigo do aumento do número de trabalhadores no desemprego crónico ou
movendo-se entre o desemprego e os empregos precários e mal pagos.
Contudo, são cada vez
mais os que defendem que a nova agenda para o trabalho, que tem vindo a desenvolver-se
desde há alguns anos, não se deve fundamentalmente à crise, mas que se faz
sentir antes de 2008, e se traduziu no declínio da protecção legal do trabalho
e na desvalorização dos salários e das qualificações. A agenda política teria
aproveitado a crise para introduzir alterações significativas ao modelo de
funcionamento do mercado de trabalho.
Emprego
e desemprego em Portugal
O mercado de trabalho em
Portugal, que se tem caracterizado, desde há alguns anos, por um baixo ritmo de
criação de emprego, a par de um crescimento modesto, quando não estagnação do
PIB, conheceu a partir de 2011 uma descida importante do nível de emprego,
acompanhada por um aumento do desemprego para níveis até então desconhecidos,
pese embora uma certa reversão, nos últimos anos, nalgumas das tendências que
se vinham a observar.
A população activa em
Portugal desceu consistentemente entre 2011 e 2015 (5428,3 mil e 5195,2 mil,
respectivamente), registando apenas um aumento em 2016, onde os dados do 3º
trimestre apontam para um volume de 5211,0 mil activos. Em contrapartida, a
população inactiva tem vindo a crescer continuamente. A emigração registou um
salto abrupto em 2011, tendo subido para mais de 100 mil ao ano, contra cerca
de 20 mil na década anterior, com um pico máximo de 135 mil em 2014.
Em conformidade com o
exposto no parágrafo anterior, a taxa de actividade caiu de 60,5% para 58,5%,
entre 2011 e 2015, verificando-se apenas um aumento de 0,2 pontos percentuais
em 2016 (58,8% no 3º trimestre). Apesar das melhorias verificadas em 2016,
tanto o volume da população activa como a taxa de actividade permanecem abaixo
do valor encontrado no início do período em análise.
O emprego registou também
um decréscimo acentuado tendo-se perdido cerca de 310,7 mil empregos entre 2011
e 2013, ano a partir do qual se verificou um crescimento moderado, de 1,6% e
1,1%, respectivamente em 2014 e 2015. Em 2016, os dados do 3º trimestre apontam
para um crescimento de 1,9%, relativamente ao trimestre homólogo de 2015. Estes
crescimentos não foram contudo suficientes para repor os valores do emprego de
2011.
O volume e a taxa de desemprego cresceram
dramaticamente entre 2011 e 2013, tendo-se atingido, neste último ano, um valor
de 855,2 mil desempregados (mais 167 mil do que no início do período em
análise). Paralelamente, a taxa de desemprego, que era em 2011 da ordem dos
12,7%, subiu para um valor máximo de 16,2% em 2013. A partir deste ano, o
número de desempregados começou a descer muito lentamente e a taxa de
desemprego caiu para 12,4% e 10,9%, respectivamente em 2015 e no 3º trimestre
de 2016. O desemprego afecta mais pesadamente os jovens, com taxas de
desemprego persistentemente acima dos 30%, ao longo do período em análise. A
parcela representada pelo desemprego de longa duração no desemprego total
registou uma subida em flecha, já que a percentagem ocupada pelos desempregados
há 2 anos ou mais foi da ordem dos 45,9%, em 2015, contra 31,6%, em 2011.
Os desafios do trabalho face à tecnologia
As alterações que se
estão a verificar e se vão fazer sentir nos modos de produzir, com implicações
na vida de trabalho, têm essencialmente a ver com: i) novos comportamentos
induzidos pela utilização de redes sociais, que vão permitir uma partilha da
informação e favorecer a construção de comunidades de colaboradores; ii)
tecnologias e plataformas colaborativas, que permitem formas de trabalho
diferentes das do passado, com maior mobilidade, outras possibilidades de
formação e aprendizagem ao longo da vida e com diferente repartição entre os
períodos de trabalho e de lazer; etc.
De facto, a evolução
tecnológica está a transformar aquilo que antes era ficção em factos reais. É o
que se passa com os robôs que já substituem em 35% a 40% do que fazemos nas
fábricas e têm a capacidade de realizarem as mais variadas tarefas, tanto nos locais
de trabalho como em casa.
Com o aproximar da 4ª
Revolução Industrial, muitos empregos vão desaparecer ou ficar substancialmente
reduzidos e outros vão surgir ou crescer. Entre os empregos que vão crescer
contam-se os relacionados com a economia baseada no conhecimento, as
oportunidades criadas pela digitalização no sector dos serviços e o crescimento
das profissões ligadas à conservação e manutenção dos novos equipamentos.
Em contrapartida, vão registar-se descidas no
emprego de numerosos sectores e profissões, de que são exemplo:
- Os empregos que dependem exclusivamente do uso de fósseis, através da progressiva substituição do carvão e petróleo por energias limpas e verdes.
- Os empregos em fábricas que conseguirem implementar a robotização
- Os empregos onde se recorre à produção à distância, que dispensam a presença física.
- Os empregos ligados aos transportes, quando for introduzida a condução guiada por automatismo que prescinde do condutor.
- Etc.
Em muitos casos, esta
evolução poderá trazer consigo vantagens para o equilíbrio do meio ambiente, a
preservação da natureza, e a poupança de matérias-primas raras e esgotáveis. As
alterações são também bem-vindas se obrigarem a uma mudança qualitativa do trabalho,
com menos horas de laboração, melhorias sobre a fragmentação e as rotinas de
trabalho, novas perspectivas para enriquecer o conteúdo e o significado do
trabalho, mais tempo para o lazer e a formação ao logo da vida, maior
conciliação entre a vida profissional e familiar, etc. Mas existem indícios de
que tal não venha a ocorrer, na ausência de políticas destinadas a prevenir os
possíveis efeitos negativos.
De facto, as
oportunidades abertas pelas alterações tecnológicas comportam também riscos
elevados, de que se destacam o aumento das formas transitórias de trabalho e da
precariedade, o crescimento da mobilidade espacial e funcional, com impacto nefasto
sobre a inserção dos trabalhadores na sociedade, a dispersão dos locais de
trabalho, desligando os trabalhadores da comunidade, a redução dos direitos do
trabalho, etc.
A próxima vaga
tecnológica coloca ainda desafios relevantes no que respeita à distribuição dos
frutos do crescimento e à redução das desigualdades dos rendimentos, uma vez
que as tecnologias actuais são fortemente enviesadas a favor do capital, que
tem vindo a aumentar significativamente a parcela por si ocupada no rendimento
total, em detrimento do trabalho. O capital tem vindo então a apropriar-se mais
do que proporcionalmente dos aumentos de produtividade proporcionados pela
evolução tecnológica. Ora, a relação salarial foi resultado de um longo
processo de consolidação, que nem sempre foi consensual. Estaremos
provavelmente a entrar numa nova fase, que exige um reforço da participação
democrática, incluindo a sindical.
O
balanço entre os ganhos e as perdas de emprego
Podemos perguntar se conseguiremos
criar, a curto e médio prazo, os empregos suficientes, porque não é ainda claro
o balanço entre as perdas e os ganhos de empregos que se irão verificar em resultado
das alterações que se têm vindo a referir.
Os números revelam que na
maior parte dos países europeus se verificou, a partir de 2008, um aumento da
polarização, com os empregos dos quintis salariais do meio a decrescerem, não
só durante o período da recessão, mas igualmente após 2013. Este declínio dos
empregos pagos nos quintis médios tem sido predominantemente atribuído à
automatização e às deslocalizações[iii].
Por profissões,
registou-se um forte crescimento do emprego, entre 2011 e 2015, nos
profissionais das tecnologias de informação e comunicação em programação,
consultadoria e actividades similares, que são também os melhores pagos. Outro
grupo onde o emprego cresceu muito foi o dos cuidados pessoais, mas trata-se de
uma actividade onde as novas tecnologias ainda não têm um impacto significativo
e que é , em geral, mal paga. As maiores descidas verificaram-se entre os
profissionais da construção e transformadoras e entre os empregados de
escritório. Trata-se de empregos claramente situados no meio da hierarquia dos
salários. Resta saber se os trabalhadores que perderam os seus empregos nestas
profissões serão capazes de transitar para empregos mais qualificados e melhor
pagos, onde a procura vai ser grande, ou se têm que aceitar empregos pior pagos
e menos qualificados para conseguirem permanecer no mercado de trabalho[iv]. O que se tem vindo a observar é que os novos
empregos, se bem que mais qualificados do que os do passado, não são, sempre,
melhor pagos, o que pode configurar uma fractura geracional.
O facto de algumas
qualificações se tornarem obsoletas e de novas competências terem de ser
desenvolvidas coloca exigências acrescidas em matéria de educação e formação. Muito
embora haja acordo sobre o facto das economias modernas precisarem de
trabalhadores mais qualificados, não deixa de ser surpreendente verificar que
cada vez menos trabalhadores são necessários para desenvolverem áreas cruciais
da actividade económica[v]. Veja-se o caso do
Facebook, Microsoft e GlaxoSmithKline, onde o volume de trabalhadores
empregados é muito baixo comparativamente com o valor de mercado dos seus
produtos.
Qualquer destas
companhias fornece serviços procurados por milhões de pessoas, cria software
que suporta aumentos de produtividade em larga escala e desenvolve remédios que
são procurados por milhões de pessoas. Esta desconexão entre emprego e valor
acrescentado é comum às tecnologias de informação e comunicação e caracteriza-se
por dois aspectos cruciais: os aumentos de produtividade são dramaticamente
mais rápidos do que os que eram nas fases iniciais da mudança tecnológica e o software criado pode ser copiado sem
limites quase a custo marginal zero[vi]. Estes factores
possibilitam uma automação a baixo custo, num número cada vez maior de
actividades, conduzida por uma força de trabalho minoritária e altamente
qualificada.
Finalmente, interessa
referir que as novas oportunidades de emprego podem também nascer de
necessidades não satisfeitas, designadamente as ligadas aos bens relacionais,
culturais e ambientais, desenvolvidos por sectores de mercado ou por
actividades cobertas pela Economia Social. A este respeito, há também que inventar um novo pacto social,
para que a economia social não tenha apenas a função de redistribuir recursos,
mas também a de criá-los”[vii].
Novas
formas de trabalho e emprego
As alterações que hoje já
se fazem sentir nas formas e conteúdos do trabalho vão conhecer novos e rápidos
desenvolvimentos. Ao lado das oportunidades criadas por formas de trabalho cada
vez mais autónomas e eventualmente mais compensadoras, especialmente para as
profissões mais qualificadas, existe o perigo do aparecimento de novas
dependências e inseguranças, que exigem uma protecção acrescida, para assegurar
que o progresso beneficie todos e não deixe ninguém para trás.
As tendências em presença
apontam para que o padrão tradicional do emprego, ou seja, o emprego
assalariado a tempo inteiro e por tempo indeterminado, conheça um declínio
significativo, a favor dos free-lancers,
das profissões liberais, dos empregos ligados à “economia a pedido”, às start-ups e às formas inspiradas na
uberização.
Uma avaliação realizada
para estas formas de emprego[viii] revelou que algumas
delas constituem oportunidades e beneficiam da preferência de alguns
profissionais, sobretudo mais jovens, mas que os riscos são superiores aos
aspectos positivos para a maioria dos trabalhadores. De facto, tem-se vindo a
assistir a uma intensificação do ritmo de trabalho e do stress, ao aumento da
precariedade, à dificuldade em planear o tempo de trabalho e de descanso, ao
aumento do trabalho nocturno e ao fim de semana, à exigência de se estar sempre
disponível para trabalhar, etc., o que dá lugar a empregos de pior qualidade e
também à degradação das condições de vida pessoal, familiar e social.
Relação
Social e Negociação do Trabalho
O ritmo e o alcance das
actuais mudanças no mundo do trabalho terão atingido, de acordo com a OIT[ix], um ponto de tal forma
crítico, que desafia o próprio fundamento da relação de trabalho, tal como a
conhecemos actualmente, como o produto de um processo histórico e evolutivo. Ao
longo do tempo, a relação de trabalho
típica tornou-se um ponto central da regulamentação do direito do trabalho,
provando, em simultâneo, o seu valor económico e social como solução de
compromisso na qual a subordinação no local de trabalho constituía a condição
de acesso à protecção contra os riscos associados ao mercado de trabalho[x].
Actualmente,
intensificou-se a pressão sobre a relação de trabalho, o que coloca desafios,
sobretudo porque se assiste à progressiva desregulamentação do mercado de trabalho, com o enfraquecimento da legislação do
trabalho e o declínio da negociação colectiva, o que tem contribuído para a sua
desvalorização e precarização. São também frequentes práticas abusivas, de que
constitui um exemplo a manutenção do trabalho temporário para além de limites que
põem em causa relações laborais mais estáveis e justas. Tal como afirma Stiglitz,
a desregulação é, de facto, uma
“reregulação”, isto é, um novo conjunto de regras para gerir a economia, que
favorece um conjunto específico de actores”[xi].
Desde a década de 80,
tem-se verificado um desenvolvimento de estratégias explícitas de
descolectivização e de individualização das relações de trabalho, que se
intensificaram com as mudanças em curso e colocam novos desafios para o futuro.
De acordo com a OIT [xii], podem ser considerados
3 cenários para a relação do trabalho: i) relação de trabalho resiliente às
mudanças profundas, o que implica que o emprego típico mantenha o modelo
dominante e as formas atípicas de emprego sejam geridas de maneira a garantir
benefícios mútuos para as empresas e os trabalhadores, contribuindo assim para
o aumento da estabilidade do mercado de trabalho; ii) adaptação da relação de
trabalho à nova realidade, prosseguindo o seu caminho histórico e evolutivo, de
modo a reforçar as condições de trabalho nos empregos atípicos e a assegurar
que todos os trabalhadores têm acesso às condições mínimas de trabalho,
independentemente da sua situação contratual; iii) alteração da relação de
trabalho típica, através de novos contractos que acabem com a distinção entre
empregos permanentes e temporários, ou da introdução ou reforço de elementos
não contributivos e redistributivos de protecção social, sobretudo dos grupos
mais vulneráveis, de que a forma mais radical se traduza na concessão a todos de
um rendimento básico, independentemente da sua situação de emprego, ou ainda
desenvolvimento de formas de organização do trabalho eficazes e transformativas
através de empresas cooperativas e de outras empresas da economia social e
solidária.
Qual
vai ser o futuro?
As estimativas recentes,
designadamente as constantes do World
Employment and Social Outlook – Trends 2015, apontam para uma recuperação
do emprego nalgumas economias avançadas, uma evolução muito modesta nos países
do Sul da Europa e uma deterioração nas economias emergentes e em
desenvolvimento.
De acordo com Juan Somavia, antigo
director da OIT: Actualmente, o principal objectivo da OIT consiste em promover
oportunidades para que mulheres e homens possam ter acesso a um trabalho digno
e produtivo, em condições de liberdade, equidade e dignidade”.
O conceito de trabalho digno, defendido
pela OIT, resume as aspirações do ser humano no domínio profissional e abrange
vários elementos: oportunidade para realizar um trabalho produtivo com uma
remuneração equitativa; segurança no local de trabalho e protecção social para
as famílias; melhores perspectivas de desenvolvimento pessoal e integração
social; liberdade para expressar as suas preocupações; organização e
participação nas decisões que afectam as suas vidas; e igualdade de
oportunidades e de tratamento para todas as mulheres e homens. E
acrescenta-se: O trabalho digno deveria estar no centro das
estratégias globais, nacionais e locais que visam o progresso económico e
social.
Para contrariar as
previsões traçadas para a maioria das economias, a OIT defende a sustentação da
procura agregada e do investimento, cujo défice tem persistido nos anos pós-crise,
o que impõe que o crédito seja reorientado para o apoio à economia real,
designadamente para as pequenas empresas, exigindo que se introduzam as
necessárias reformas no sistema financeiro. Recomenda ainda que se adoptem
políticas públicas de reforço dos aspectos institucionais do mercado de
trabalho e se aperfeiçoem os sistemas de protecção social, uma vez que importa
velar para que todos os tipos de emprego beneficiem de uma cobertura
apropriada. As desigualdades crescentes devem ser contrariadas, nomeadamente
por intermédio das políticas do mercado de trabalho e fiscal e por políticas de
rendimento.
Pese embora a justeza
destas recomendações, há quem preveja que não vão existir no futuro empregos
suficientes para todos, em resultado predominantemente do avanço da digitalização,
o que impõe que não se olhe tanto para o passado, mas antes que nos viremos para
o futuro, através da implementação de medidas inovadoras.
Foi por isso que a OIT
propôs várias iniciativas, entre quais se conta A Iniciativa sobre o futuro do trabalho. Trata-se de um processo,
que se desenvolverá até 2019, data da celebração dos 100 anos da criação desta
organização. Pretende-se reunir um vasto conjunto de contributos que tornem possível
uma reflexão sobre o futuro do trabalho.
De acordo com a OIT, a evolução do mundo do trabalho,
independentemente do que pensamos sobre o assunto, é o resultado de uma
multiplicidade de decisões tomadas aos níveis nacional e internacional, tanto na
esfera pública como privada e em todos os domínios. Do mesmo modo, e apesar da dinâmica da mudança já observada e
de algumas realidades duras, o futuro do trabalho será o que fizermos dele [xiii].
Entre as possíveis fontes
de criação de empregos são geralmente apontadas a economia verde, uma vez que é
necessário investir em métodos eficientes de produção de energia, e os serviços
às pessoas, dado o envelhecimento demográfico da maioria dos países e, em
particular, de Portugal, onde este fenómeno se apresenta com contornos muito
preocupantes. Cada uma destas fontes exige um financiamento equitativo da
transição para um modelo de crescimento sustentável [xiv].
Para além das questões
relacionadas com a necessidade de criar empregos em número adequado às
necessidades e de fazer descer o desemprego para níveis suportáveis, as
matérias relacionadas com a qualidade dos empregos adquirem igualmente uma
importância fundamental.
Em particular, o debate
sobre o futuro da relação de trabalho merece uma atenção especial, estando no
centro das decisões a tomar. Daí a importância dos 3 cenários traçados pela OIT
e referidos no ponto anterior.
Se a hipótese da
resiliência da relação de trabalho não parece particularmente realista,
afigura-se que os restantes cenários devem ser objecto de um amplo debate. O
cenário da adaptação da relação de trabalho pressupõe a existência de relações
laborais que permitam equilibrar os interesses das empresas e dos
trabalhadores. A garantia da relevância e da eficácia da relação de trabalho no
futuro terá, porém, que ser objecto de uma reflexão séria, para a qual terão
que ser chamados os actores em presença. Questão fundamental é a de saber como
vão ser assegurados os direitos humanos fundamentais dos trabalhadores e qual o
papel das políticas públicas e da negociação colectiva de trabalho, cuja
importância tem vindo a decrescer substancialmente. O último cenário é o mais
radical, podendo levar, em última análise, ao fim da relação salarial, tal como
foi construída ao longo do tempo e que contempla salário, actividade, protecção
social e participação num colectivo, consubstanciados num contrato. Trata-se de
matéria porventura mais ética do que económica, que tem a ver com o modelo de sociedade
que queremos construir e o valor a atribuir ao trabalho, o que irá exigir o
redesenhar das instituições e o construir de um quadro diferente do passado.
Importa por isso prosseguir
com a reflexão sobre estas matérias, já que o futuro do trabalho e do emprego irá
ditar seguramente muitas facetas do futuro das nossas sociedades.
Pense-se, por exemplo, no
impacto das
novas formas de trabalho e emprego sobre os fundamentos das políticas de
protecção social tal como têm vindo a ser desenvolvidas, designadamente subsídios
de desemprego ou doença, pensões de reforma, etc. Ou:
como deverá ser tido em conta o cuidado prestado a dependentes,
maioritariamente por mulheres? Ou, ainda, o lugar a atribuir ao trabalho
voluntário em serviços de utilidade social?
2017/2/4
Eduarda Ribeiro
João Lourenço
[i] OIT, Emploi et Questions Sociales dans le
Monde, Des modalités d’emploi en pleine mutation, 2015.
[iii] Juan Menéndez-Valdés,
“Current changes to the labour market may well define the future of Europe”.
[iv] idem
[v] Adair Turner, “The skills delusion”
[vi] Idem
[vii] Bruni,
“O trabalho deve ser salvo”
[viii] Juan Menéndez-Valdés, “Current
changes to the labour market may well define the future of Europe”.
[ix] OIT, O
Futuro do Trabalho – Iniciativa do Centenário. 3 Série Notas Temáticas
[x] Idem
[xi]
Stiglitz e outros, “Rewriting the rules”
[xii] Ver
nota ix.
[xiii]
Relatório do Director Geral da 104ª sessão da Conferência Internacional do
trabalho, 2015, “O futuro do trabalho –iniciativa do centenário”
Gostei. Claro que o comboio não vai parar...ou antes pára no apeadeiro e arranca.As sociedades e os indivíduos vão-se transformando e readaptando-se..E como se diz " quando se fecha uma porta abre-se uma janela" Estou esperançado que todos em conjunto vamos saber dar a volta..sempre foi assim..nós não seremos diferentes! Termino com uma sugestão e um desejo. Poderemos e deveremos todos tirar mais proveito da população mais idosa (60/70 anos), da sua grande sabedoria e da sua grande vivência em sociedade, por vezes em tempos bem mais difíceis que os nossos. (Não me esqueço do que disse Popper antes de nos deixar " (..)apesar de todos estes problemas atuais nunca se viveu tão bem como nos dias de hoje.."). Eles resistiram e venceram.Nós também vamos vencer!
ResponderEliminar