A inovação tecnológica não é
um fenómeno novo, mas tem-se revestido, nas últimas décadas, de uma
abrangência, complexidade e aceleração, que justificam a ideia de que está em
curso uma quarta revolução industrial, com consequências dramáticas para a vida
das pessoas, a economia e a organização sociopolítica.
Já são visíveis os seus
efeitos. Estarão os cidadãos preparados para responder adequadamente aos seus
desafios?
Um exemplo: o cruzamento da
digitalização com a robotização está a criar uma nova economia e um novo mundo
do trabalho. Porém, o consenso acaba aqui: Criará ou destruirá postos de
trabalho? Modificará ou deslocalizará empregos? Será o trabalho mais ou menos
digno? Que consequências para a sustentabilidade ambiental? Como se repercute
na repartição do rendimento? Qual o seu impacto no estado social adoptado pelos
vários países europeus? Podemos esperar que os pontos fortes e as oportunidades
que se criam sejam superiores aos pontos fracos e às ameaças para os
trabalhadores e para a sociedade no seu todo?
As opiniões divergem, o que
mostra como se torna indispensável e urgente um amplo debate na sociedade europeia
e nos vários países membros, para que se possa encontrar o melhor caminho para
uma sociedade mais justa, próspera e inclusiva. Globalização e competitividade
Para compreender a revolução
tecnológica em curso e os seus impactos há que começar por situá-la no contexto
de globalização e competitividade à escala mundial em que aquela ocorre.
É de admitir que a inovação
tecnológica origine maior produtividade e proporcione melhoria da qualidade de
vida das populações que venham a ser beneficiadas, mas nada garante que, num
contexto de economia globalizada e mercados mundiais desregulados, os
benefícios potenciais da inovação tecnológica não se convertam em perdas
significativas para alguns grupos sociais e para os países menos preparados
para dela tirarem partido.
Com efeito, o crescimento da
digitalização e da automatização na indústria e nos serviços, decorrente das
rápidas evoluções em áreas como a inteligência artificial, a robótica, a
nanotecnologia, a impressão a 3D, vai tornar obsoletos muitos dos actuais
postos de trabalho. Compreende-se, pois, que a maior preocupação social
relativa à revolução tecnológica e digital em curso é que, dadas as exigências
da globalização e da competitividade de um mercado internacional sem regras
claramente instituídas, a revolução industrial contribua para o agravamento das
desigualdades na repartição da riqueza e do rendimento, conduzindo ao aumento
das tensões sociais entre ricos e pobres, tanto no interior dos países mais
desenvolvidos, como nas comparações internacionais.
A globalização, construção
social planetária correspondente a uma necessidade civilizacional, obriga, porém,
a uma reflexão mais profunda. Não deverá a globalização conhecer quaisquer
restrições? Os seus defensores dão muitas vezes como exemplo o aparente sucesso
atribuído à globalização no combate à pobreza, como no caso da China. Mas será esse
o modelo de economia e de sociedade que se pretende desenvolver?
Por
outro lado, conhecem-se hoje soluções alternativas à globalização. Tal é o caso
da re-internalização do offshoring. Através
da introdução de novas tecnologias pode redesenhar-se, no país de origem, uma
unidade de produção previamente deslocalizada, bastando para tal que se consiga
diminuir o custo da unidade de computação.
Vivendo
sob o lema da competitividade nos mercados globais, é fundamental ter em conta
que ela depende fundamentalmente do progresso da digitalização, e que, no
contexto actual, a perda de competitividade afecta não apenas uma dada empresa
mas toda uma parte da população que, directa ou indirectamente, dela depende. Estamos,
com efeito, no domínio da economia em rede: o vencedor apanha tudo, ou pelo
menos o suficiente para impor um standard,
obrigando outros a observá-lo. Trata-se de uma falsa concorrência que, de facto
a globalização induz, já que é um número reduzido de empresas de topo que
controla o mercado. Tecnologia, capital e poder político reforçam-se mutuamente.
Importa reconhecer que a
transição será difícil e as pessoas menos qualificadas terão, certamente, menos
possibilidades de se adaptarem à mudança, o que constitui, desde logo, um forte
desafio, em especial no que respeita à educação das novas gerações e à formação
das pessoas ao longo da vida, para garantir uma melhor adaptação à nova
realidade tecnológica.
Há, por conseguinte, que
pensar atempadamente em soluções que permitam gerir a transição no respeito por
princípios de equidade na partilha de custos e benefícios e na óptica de uma
ecologia integral. A digitalização e o seu impacto
A crescente digitalização e o
seu impacto na economia e no mercado de trabalho estão a gerar grande debate
não só na academia mas também na política e no mundo do trabalho, tanto na
Europa como nos Estados Unidos. Este debate pode ser simbolizado com o que está
a suceder no caso da Uber no sector de transporte de passageiros.
Segundo alguns, estamos perante o prenúncio do
fim do trabalho assalariado, a total liberalização dos serviços e o alargamento
da concorrência mundial, que vai muito para além da muito contestada proposta
da directiva europeia Bolkstein sobre a liberalização dos serviços.
A generalização deste tipo de
iniciativas poderá, eventualmente, pôr um fim ao modelo social europeu tal como
o conhecemos hoje: não mais lei do trabalho; não mais horários de trabalho para
os escritórios; não mais procedimentos especiais de despedimento. Em vez disso,
teremos contas de internet criadas e eliminadas por decisão de uma qualquer start-up situada algures no mundo. Assim
sendo, tornar-se-ão irrelevantes e inconsequentes quaisquer acções colectivas
de defesa dos trabalhadores. E que dizer sobre possível incidência sobre a
fiscalidade, as receitas públicas e, de um modo geral, sobre o financiamento do
estado social?
Vejamos mais em pormenor a
questão da Inteligência Artificial (IA).
Esta é um ramo da ciência da computação que se propõe elaborar dispositivos que
simulem a capacidade humana de raciocinar, perceber, tomar decisões e resolver
problemas. Na vida real são já várias as suas aplicações: jogos, programas de
computador, aplicativos de segurança para sistemas informacionais, robótica,
dispositivos para reconhecimento de escrita à mão e de voz, programas de
diagnósticos médicos e muito mais.
Os desafios da IA têm que ver,
essencialmente, com a sua aplicação a qual coloca três tipos de problemas:
autonomização nos serviços de transportes, mas não só; a complementaridade ou
substituição entre a tecnologia e o factor trabalho; a necessidade de
identificar os domínios de complementaridade entre a IA e o humano,
vislumbrando-se já vários caminhos nesse sentido.
Segundo alguns cientistas, o
futuro está longe dos filmes catastrofistas em que a IA toma conta da
humanidade. Os robôs ainda sabem fazer « poucas coisas» e terão sempre
limitações, pelo que a colaboração entre o ser humano e a máquina será obrigatória. É este conceito de automação simbiótica que está a
revolucionar a robótica no mundo, e que, por exemplo, está na base da
investigação de Manuela Veloso que há 30 trinta anos investiga em Pittsburg nos
Estados Unidos, tendo recebido o prémio de carreira atribuído pela Fundação
Nacional de Ciências norte-americana.
Está na base da criação dos cobots
ou colalaborative robots, que navegam
pela Faculdade de Ciências Computacionais da Carnegie Mellon University e
executam várias tarefas, libertando os humanos das funções mais rotineiras e,
quando precisam, pedem ajuda. .No futuro continuará a haver trabalho, mas não tem
de ser das 9 às 18 horas.
A principal função dos cobots é processar informação sobre os
espaços físicos e à medida que forem sendo utilizados vão recolhendo informação
e aprendendo. O desafio é juntar a classificação à cognição e depois à ação e
dessa forma ajudar os humanos a tomar decisões. Se já o fazem em Wall Street,
por que não em nossa casa? É possível mandar os cobots fazer uma determinada pesquisa e ele apresentará a sua
melhor opção. Como saber que esta é a mais acertada? Segundo parece, os robôs
são ainda caixas pretas. Tomam decisões mas não se faz a mínima ideia do porquê
de tais decisões. Muita da investigação que está a ser feita actualmente
procura tornar as máquinas mais transparentes.
A ênfase está em tornar as
máquinas da IA mais acessíveis aos humanos do ponto de vista da confiança.
Contudo, apesar dos evidentes
benefícios destas máquinas, é indispensável avançar para a regulamentação de
robôs e sistemas de IA, ara garantir que sejam os humanos a definir como
trabalham as máquinas e, sobretudo, para defender a Ética.
De uma forma sintética, a
3ªrevolução industrial caracterizou-se pelo extraordinário desenvolvimento do hardware sob o comando de uma elite,
enquanto, na fase actual, assistimos ao incremento contínuo do software, do
intangível, do imaterial e do simbólico, operados por um número cada vez menor
de trabalhadores. A discussão sobre a posição relativa do capital e do trabalho
no processo de produção vai perdendo a sua razão de ser face ao crescente peso
do factor imaterial.
Algumas pessoas consideram esta
visão como exageradamente pessimista, admitindo que o desenvolvimento da
economia digitalizada criará novas oportunidades no sector dos serviços onde
serão facilitados projectos de colaboração e partilha, com ganhos no valor de
uso mais do que no da propriedade, através do uso partilhado de bens de custo
elevado, tais como carros, casas, equipamentos; reparação em vez da
substituição; financiamento local e partilhado em vez de empréstimos bancários;
impacto na indústria onde as linhas de produção serão cada vez mais inteligentes
e tornarão mais flexível o contributo do trabalhador, para se conseguir uma
nova forma de colaboração entre humanos e máquinas. Ter-se ia, assim, um modelo
económico novo, com um custo marginal de zero e que, em pouco tempo, conduziria
a um crescimento económico poderoso com elevada criação de novos empregos.
Com visão mais ou menos
optimista ou pessimista, o certo é que, em Abril de 2014, a Uber, uma startup, criada cinco anos antes,
inundou o mercado europeu do transporte, usando a sua aplicação de transporte
partilhado. Esta situação mostrou aos europeus as tremendas oportunidades
concebidas a partir do desenvolvimento tecnológico, mas também constituiu uma
ameaça para os transportes tradicionais.
Se nada se fizer, com uma
aplicação móvel e alguns algoritmos, qualquer pessoa pode tornar-se num serviço
de táxis. Sem formação, sem pagar impostos, sem contribuições para a segurança
social, sem constrangimentos regulatórios, estes condutores auto indicados
podem, de um dia para o outro, concorrer com a tradicional empresa de táxis ou
de pequenos bus. Uma forma regulada de fornecimento de serviços é, de um
momento para o outro, ameaçada por uma start
up americana que não tem um único veículo em seu nome…
O fenómeno é emblemático de
uma completa ruptura com a prática usual, de tal modo que hoje se fala de uma possível
uberização da economia. Dos táxis às televisões, aos produtores de filmes, aos
restaurantes, aos bancos, a maneira como os indivíduos e as empresas fazem
negócios está-se a modificar tão aceleradamente que algumas empresas acham
difícil acompanhar o ritmo da mudança que decorre da acção conjugada de três factores:
a internet e o desenvolvimento de redes de alta velocidade; o aparecimento de
plataformas de internet com massas colossais de informação utilizáveis de forma
pessoal, comercial, geográfica e comportamental; o aparecimento de novas formas
de serviços móveis, smartphones, iphones, tablets, etc. que dão, aos
consumidores, trabalhadores e produtores de serviços, acesso a internet móvel a
cada momento e em qualquer lugar.
Estes três desenvolvimentos tiveram o efeito
de, em poucos anos, eliminar distâncias e fronteiras, graças às redes, criando
novas matérias-primas – os dados – que são directamente exploráveis pelas plataformas,
empresas ou startups. Esta mudança
afecta os sectores dos serviços e das indústrias, o trabalho manual e
intelectual, os trabalhadores assalariados convertem-se em auto-empregados. O sistema produtivo
Como resultado da recente
combinação entre os progressos da digitalização e da inovação tecnológica, têm
surgido novas empresas que aproveitam do desenvolvimento de aplicações informáticas
que lhes permitem tornar lucrativas áreas de serviços de resposta a novas
necessidades em sectores-chave como sejam o transporte, a entrega de
encomendas, a procura e o arrendamento de alojamentos, acesso a financiamentos,
reparações de equipamento, etc…).
Hoje em dia, qualquer indivíduo
equipado com um smartphone pode tornar-se
produtor, criar serviços ou colocar serviços em oferta, por forma a obter deles
alguns benefícios.
Por outro lado, certos activos
de investimento oneroso (viaturas, locais, certas ferramentas, softwares) e de
utilização incompleta por um único proprietário (indivíduo ou empresa) podem ser
partilhados por diversos utilizadores, com a correspondente economia de custos
e consequente acréscimo de competitividade.
A ruptura que se opera entre o
utilizador e o proprietário do bem utilizado em partilha traz novos desafios
acerca da relação entre a plataforma que faz a gestão do bem em causa e o
utilizador e fornecedor do serviço a terceiros, com impactos no modo de
definição dos proveitos e na atribuição de impostos. Acresce que o negócio
assume, muitas vezes, uma dimensão internacional, o que, necessariamente, vem potenciar
o agravamento das desigualdades sociais e criar maiores dificuldades à
sustentabilidade do modelo social, designadamente à regulação do mercado
laboral e à imposição fiscal que lhe subjaz.
Através da acção conjugada da internet, big data e smartphone, está a
surgir um novo modo de produção e uma nova economia que configuram um novo
mundo para o mercado do trabalho e para as famílias.
As estatísticas existentes não
detectam, por ora, o verdadeiro impacto destes desenvolvimentos, dada a natureza
específica dos bens digitais, muitas vezes intangíveis, e cujo valor
acrescentado é mal avaliado pela medida do PIB, não existindo, por isso uma
visão clara dos seus verdadeiros efeitos.
Alguns autores entendem que se
trata de um desenvolvimento, que se tem realizado com rapidez, mas que não é
revolucionário nem comparável à generalização da electricidade no sec.XIX. A impressão
a 3D, os robots, etc., sendo dispositivos relevantes, não têm impactos
comparáveis à descoberta da electricidade e à água canalizada. Pensam que não
se pode confiar nestes recursos para constituírem a alavanca de um crescimento
acelerado nos próximos anos. Outros não hesitam em falar de uma situação de
verdadeira ruptura já em marcha, pois os novos desenvolvimentos quebram os
modos correntes de organização das empresas.
Por outro lado, a adopção destas tecnologias pelas empresas, se forem bem incorporadas no capital físico e humano, permitem às economias criarem mais valor com menos matéria-prima. Isto significa que não se trata de uma adaptação a novas práticas mas de uma criação/destruição de capital, que obriga a quebrar e a acabar com o velho modelo, para entrar num modelo completamente novo em termos de métodos de produção, recursos e modelo de gestão. Esta tecnologia é vista como o último factor da optimização: zero custo marginal, segunda era da máquina, eliminação das polémicas ligadas ao aquecimento global, evolução da biodiversidade, etc.
Os mais optimistas admitem que a digitalização contribuirá para uma sociedade optimizada, para uma governança racional sem erros ou desperdícios e que estamos a passar de uma sociedade onde a energia era a chave do progresso, da inovação e da produtividade, para outra, onde os dados e a informação tecnológica a eles ligados serão a chave do progresso.
A transição para uma economia do conhecimento
Como já se referiu, é no mundo do trabalho que mais directamente se farão sentir os efeitos da revolução tecnológica em marcha. Não basta, porém, pensar que se resolvem os problemas apenas com maior e mais exigente qualificação dos trabalhadores, mais especialização e reforço da formação. Importa ter a consciência de que é necessário entrar num mundo do trabalho onde tudo será diferente. Tão pouco podemos circunscrever a problemática em causa ao nosso país, dada a sua integração na Europa e no Mundo.
Por outro lado, a adopção destas tecnologias pelas empresas, se forem bem incorporadas no capital físico e humano, permitem às economias criarem mais valor com menos matéria-prima. Isto significa que não se trata de uma adaptação a novas práticas mas de uma criação/destruição de capital, que obriga a quebrar e a acabar com o velho modelo, para entrar num modelo completamente novo em termos de métodos de produção, recursos e modelo de gestão. Esta tecnologia é vista como o último factor da optimização: zero custo marginal, segunda era da máquina, eliminação das polémicas ligadas ao aquecimento global, evolução da biodiversidade, etc.
Os mais optimistas admitem que a digitalização contribuirá para uma sociedade optimizada, para uma governança racional sem erros ou desperdícios e que estamos a passar de uma sociedade onde a energia era a chave do progresso, da inovação e da produtividade, para outra, onde os dados e a informação tecnológica a eles ligados serão a chave do progresso.
A transição para uma economia do conhecimento
Como já se referiu, é no mundo do trabalho que mais directamente se farão sentir os efeitos da revolução tecnológica em marcha. Não basta, porém, pensar que se resolvem os problemas apenas com maior e mais exigente qualificação dos trabalhadores, mais especialização e reforço da formação. Importa ter a consciência de que é necessário entrar num mundo do trabalho onde tudo será diferente. Tão pouco podemos circunscrever a problemática em causa ao nosso país, dada a sua integração na Europa e no Mundo.
Em particular, é fundamental
que a EU tenha uma visão comum acerca do modo como a digitalização deverá
evoluir (Kowalsky, 2015).
No sector dos serviços, por exemplo, o que deverá mudar? A relação com o trabalhador ou antes com o fornecedor ou ainda com o empregador ou talvez com o algoritmo que fornece o trabalho, calcula o pagamento e prepara a folha de pagamento? O contrato de emprego, a negociação salarial, o processo de despedimento, a desactivação de contas também mudarão? Como ficará a segurança social, a saúde ocupacional, os padrões de segurança e higiene no trabalho, etc?
No sector industrial, também os modos de produção estão a mudar, a inter-accão entre o trabalhador e a máquina inteligente será diferente, o acompanhamento e o controlo do trabalhador também, e as práticas de gestão poderão implicar um aumento de pressão e, no limite, criar novas modalidades de opressão e exploração dos trabalhadores.
No que diz respeito aos consumidores, a combinação e a soma total de informação quantitativa e qualitativa de natureza pessoal, comercial, geográfica e comportamental, disponível nas redes digitais – internet, telefones móveis, satnavs etc. – exploráveis como matéria-prima, particularmente no contexto das aplicações móveis (apps) constitui hoje uma nova matéria-prima.
A economia digital e as suas startups, procurando dar valor a esta matéria-prima utilizam plataformas gigantes, incluindo a Google, Facebook, Apple, Amazon, IBM, etc, que produzem e gerem um volume brutal de informação sobre os seus clientes, e usam algoritmos para converter a big data em informação explorável e utilizável. Também nesta questão se levantam problemas éticos que carecem de solução.
O crescimento destes dados é exponencial (90% dos dados que hoje circulam na internet foram criados nos dois últimos anos). O sector da big data tem crescido a 40% ao ano, sete vezes mais do que a informação da base de dados da Comissão Europeia, em 2015. De acordo com a International Data Corporation (IDC), o mercado tecnológico e de dados representa uma oportunidade de negócio de muitos biliões de dólares e cresce aceleradamente.
As três características fundamentais da Big Data, o volume, a velocidade, e a variedade, permitem, numa série de campos, prever a reacção ou antecipar o comportamento do consumidor, do condutor, do vendedor, do trabalhador e, por que não, do político. Deste modo, as plataformas de Big Data tornam-se inteligentes e podem constituir máquinas de aprendizagem que, alimentadas pelos dados e pela informação, começam a desempenhar tarefas inimagináveis, diagnosticando doenças, conduzindo veículos, escrevendo artigos para os jornais, prevendo epidemias, restaurando a visão aos parcialmente cegos e muitos outros avanços.
A «informação inteligente» abana e ultrapassa procedimentos de retalho, formas de organização industrial e empresarial, atingindo não apenas o interior das organizações mas também campos mais vastos como o da saúde, educação, agricultura, ambiente, energia, transportes, gestão do tráfego, planeamento urbano, etc. Alguns autores falam de uma segunda economia distinta da tradicional economia física de produção de bens e serviços.
Em termos de organização empresarial, estamos a passar de uma economia em que o dono das infra-estruturas criava e capturava o valor, para uma economia em que o dono dos dados e da informação cria e absorve todo o valor.
Até há pouco tempo, os grandes industriais europeus pensavam, erradamente, que as suas actividades estavam protegidas da ameaça digital. Contudo, o Comissário Europeu, Gunther Oettinger, mostrou alguma preocupação com a indústria automóvel europeia que tem um papel fundamental na economia da Europa e que, apesar do seu avanço tecnológico e de já ter iniciado o seu processo de digitalização, pode ter de enfrentar a concorrência, designadamente da Apple, uma vez que esta decidiu fabricar automóveis.
Embora com fornecedores diversificados, será a Apple a desenhar o modelo do carro do futuro que vai incorporar todo o sistema de informação, dado que o carro se está a transformar numa extensão do computador e do smartpfone ou seja num computador com rodas. Com razão é de temer que um tal projecto venha a representar uma ameaça fatal para a indústria europeia de automóveis.
O carro, por muito bom que seja, fica por vezes bloqueado pelo trânsito. Contudo, na era digital, o carro inteligente (ver a app da Waze) propõe o caminho mais rápido em tempo real, como também realiza novos serviços de transporte com a partilha ou o recurso ao pooling de carros.
Em síntese: na sociedade do futuro, as plataformas de informação serão as fábricas do século XXI e a base da economia do conhecimento.
Ficará a Europa marginalizada?
No sector dos serviços, por exemplo, o que deverá mudar? A relação com o trabalhador ou antes com o fornecedor ou ainda com o empregador ou talvez com o algoritmo que fornece o trabalho, calcula o pagamento e prepara a folha de pagamento? O contrato de emprego, a negociação salarial, o processo de despedimento, a desactivação de contas também mudarão? Como ficará a segurança social, a saúde ocupacional, os padrões de segurança e higiene no trabalho, etc?
No sector industrial, também os modos de produção estão a mudar, a inter-accão entre o trabalhador e a máquina inteligente será diferente, o acompanhamento e o controlo do trabalhador também, e as práticas de gestão poderão implicar um aumento de pressão e, no limite, criar novas modalidades de opressão e exploração dos trabalhadores.
No que diz respeito aos consumidores, a combinação e a soma total de informação quantitativa e qualitativa de natureza pessoal, comercial, geográfica e comportamental, disponível nas redes digitais – internet, telefones móveis, satnavs etc. – exploráveis como matéria-prima, particularmente no contexto das aplicações móveis (apps) constitui hoje uma nova matéria-prima.
A economia digital e as suas startups, procurando dar valor a esta matéria-prima utilizam plataformas gigantes, incluindo a Google, Facebook, Apple, Amazon, IBM, etc, que produzem e gerem um volume brutal de informação sobre os seus clientes, e usam algoritmos para converter a big data em informação explorável e utilizável. Também nesta questão se levantam problemas éticos que carecem de solução.
O crescimento destes dados é exponencial (90% dos dados que hoje circulam na internet foram criados nos dois últimos anos). O sector da big data tem crescido a 40% ao ano, sete vezes mais do que a informação da base de dados da Comissão Europeia, em 2015. De acordo com a International Data Corporation (IDC), o mercado tecnológico e de dados representa uma oportunidade de negócio de muitos biliões de dólares e cresce aceleradamente.
As três características fundamentais da Big Data, o volume, a velocidade, e a variedade, permitem, numa série de campos, prever a reacção ou antecipar o comportamento do consumidor, do condutor, do vendedor, do trabalhador e, por que não, do político. Deste modo, as plataformas de Big Data tornam-se inteligentes e podem constituir máquinas de aprendizagem que, alimentadas pelos dados e pela informação, começam a desempenhar tarefas inimagináveis, diagnosticando doenças, conduzindo veículos, escrevendo artigos para os jornais, prevendo epidemias, restaurando a visão aos parcialmente cegos e muitos outros avanços.
A «informação inteligente» abana e ultrapassa procedimentos de retalho, formas de organização industrial e empresarial, atingindo não apenas o interior das organizações mas também campos mais vastos como o da saúde, educação, agricultura, ambiente, energia, transportes, gestão do tráfego, planeamento urbano, etc. Alguns autores falam de uma segunda economia distinta da tradicional economia física de produção de bens e serviços.
Em termos de organização empresarial, estamos a passar de uma economia em que o dono das infra-estruturas criava e capturava o valor, para uma economia em que o dono dos dados e da informação cria e absorve todo o valor.
Até há pouco tempo, os grandes industriais europeus pensavam, erradamente, que as suas actividades estavam protegidas da ameaça digital. Contudo, o Comissário Europeu, Gunther Oettinger, mostrou alguma preocupação com a indústria automóvel europeia que tem um papel fundamental na economia da Europa e que, apesar do seu avanço tecnológico e de já ter iniciado o seu processo de digitalização, pode ter de enfrentar a concorrência, designadamente da Apple, uma vez que esta decidiu fabricar automóveis.
Embora com fornecedores diversificados, será a Apple a desenhar o modelo do carro do futuro que vai incorporar todo o sistema de informação, dado que o carro se está a transformar numa extensão do computador e do smartpfone ou seja num computador com rodas. Com razão é de temer que um tal projecto venha a representar uma ameaça fatal para a indústria europeia de automóveis.
O carro, por muito bom que seja, fica por vezes bloqueado pelo trânsito. Contudo, na era digital, o carro inteligente (ver a app da Waze) propõe o caminho mais rápido em tempo real, como também realiza novos serviços de transporte com a partilha ou o recurso ao pooling de carros.
Em síntese: na sociedade do futuro, as plataformas de informação serão as fábricas do século XXI e a base da economia do conhecimento.
Ficará a Europa marginalizada?
A posição virtualmente monopolista, de empresas como a Google, Facebook, Apple, Amazon, Linkdin, Microsoft, etc., dados os seus elevados recursos financeiros e forte capacidade de inovação, constitui grandes desafios para a economia europeia.
Cabe anotar que estas empresas são relativamente pequenas em termos de número de técnicos, porém são enormes em termos de capitalização, reflexo do interesse dos investidores nesta nova economia, e de uma forma geral devido ao interesse demonstrado pelos seus utilizadores. O seu poder financeiro permite-lhes comprar no ecossistema digital todas as startups que pretenderem, para aumentar, fortalecer e inovar os seus próprios serviços. (Instagran e Whats App compradas pelo Facebook ; Youtube e Deopcam,,Uber Waze compradas pela Googlel; Séri, Embark, etc compradas pela Apple; Twitch pela Amazon etc.
Por outro lado, têm tendência para se expandirem para muitos e diversificados sectores, tais como o automóvel, a saúde, as finanças, a educação, a música etc., pondo em causa de forma radical o modelo de negócios de grandes empresas, por estarem em posição de obterem elevados ganhos de produtividade, capturando rendas a nível global.
Por causa deste poder financeiro enorme, bem como pela sua capacidade de fazer lobby conseguem operar nas fronteiras da legalidade, optando por crescer primeiro e depois tentar a sua legalização através do respectivo poder.
Neste contexto, há que perguntar: De onde poderá vir o crescimento europeu? Qual o futuro do sector fabril europeu? Ficarão as PME escravas das plataformas digitais? Ficará a Europa dependente do processo de plataformização ou da informação e dos dados dos Estados Unidos? Estará a Europa em risco de ficar marginalizada na corrida para a digitalização da economia?
Não se nega que já existem muitas startups na Europa, mas não possuem nem tantos recursos financeiros nem a mesma profundidade de conhecimento e de apoio tecnológico. O mesmo se pode dizer do desenvolvimento da robótica, que é, também, muito maior nos Estados Unidos.
Numa perspectiva de médio
prazo, Atkinson é peremptório quando afirma que, depois de um longo período em
que a Europa se aproximou das condições de produtividade americanas, desde
1995, o gap tem aumentado em cada ano e não dá sinais de vir a diminuir. Isso
deve-se, em grande parte, ao facto de não ter sabido utilizar a revolução
digital e tecnológica como sucedeu nos Estados Unidos
Apesar desta constatação, não devemos deixar de referir que recentemente a Comissão Europeia difundiu os seus planos para ajudar a indústria europeia, as PME, os investigadores e as autoridades públicas a tirarem o máximo partido das novas tecnologias.
Reconhece-se que estão em curso transformações tecnológicas profundas nos processos produtivos de bens e serviços, designadamente pela via da crescente digitalização, as quais carecem de apoio, coordenação de esforços entre as iniciativas nacionais e normalização, de modo a retirar o maior benefício possível da inovação à escala europeia.
A Comissão Europeia vai promover o investimento na digitalização, através de redes e parcerias estratégicas, definir normas comuns em domínios prioritários como as redes de comunicação 5G ou a ciber segurança e a modernização dos serviços públicos.
De destacar também o projecto de criação de um nuvem europeia que terá como objectivo proporcionar aos investigadores e aos professores nos domínios da ciência e da tecnologia um ambiente virtual para armazenar, gerir, analisar e reutilizar grandes volumes de dados de investigação. Espera-se, assim, que a revolução industrial em curso seja impulsionada pela revolução digital e que as empresas e os serviços públicos possam satisfazer, com eficiência, as suas necessidades de informação, transparência e gestão de recursos.
O caso português
Apesar desta constatação, não devemos deixar de referir que recentemente a Comissão Europeia difundiu os seus planos para ajudar a indústria europeia, as PME, os investigadores e as autoridades públicas a tirarem o máximo partido das novas tecnologias.
Reconhece-se que estão em curso transformações tecnológicas profundas nos processos produtivos de bens e serviços, designadamente pela via da crescente digitalização, as quais carecem de apoio, coordenação de esforços entre as iniciativas nacionais e normalização, de modo a retirar o maior benefício possível da inovação à escala europeia.
A Comissão Europeia vai promover o investimento na digitalização, através de redes e parcerias estratégicas, definir normas comuns em domínios prioritários como as redes de comunicação 5G ou a ciber segurança e a modernização dos serviços públicos.
De destacar também o projecto de criação de um nuvem europeia que terá como objectivo proporcionar aos investigadores e aos professores nos domínios da ciência e da tecnologia um ambiente virtual para armazenar, gerir, analisar e reutilizar grandes volumes de dados de investigação. Espera-se, assim, que a revolução industrial em curso seja impulsionada pela revolução digital e que as empresas e os serviços públicos possam satisfazer, com eficiência, as suas necessidades de informação, transparência e gestão de recursos.
O caso português
Que consequências podemos
antever para Portugal desta revolução? Temos condições para a acompanhar, dados
os investimentos em infra-estruturas científicas e tecnológicas realizadas nos
últimos anos? A existência e a qualificação dos recursos jovens bem como a nova
geração de empresários serão suficientes?
Serve de exemplo o que ocorre
com a indústria automóvel em Portugal.
A Auto Europa já tem impressão
a 3D na linha de produção, mas esta evolução irá estender-se, certamente, a
outros sectores. Poderemos esperar grande transformação nas fábricas, nas linhas
de produção, nas relações destas com os clientes, nas cadeias de logística e no
comércio electrónico.
Foi lançada no Porto, no
princípio de Junho, a Startup Portugal,
e definida uma Estratégia Nacional de Empreendedorismo composta por quinze
medidas que visam apoiar os empresários que decidirem criar negócios
inovadores. Além de reforçar os instrumentos de financiamento, o Governo cria
um sistema fiscal favorável aos empreendedores: vão poder deduzir ao IRS até
100 mil euros se forem investidos em startups, além da revisão do regime de
mais-valias, mais favorável para os investimentos em empresas tecnológicas.
Pretende-se desta forma atrair investimento estrangeiro (IDE) e reter técnicos
jovens que de outra forma emigrariam.
Peça importante desta
estratégia foi o lançamento do Manifesto Português de startup, uma espécie de magna carta onde estão elencados os
desafios e as acções que os jovens têm de vencer para serem competitivos no
sector.
É indispensável ter em atenção
dois tipos de desafios, diferentes e ambos fundamentais: um deles tem que ver
com a literacia digital que deveria exigir um programa especial para o seu
desenvolvimento, não sendo suficiente a formação profissional presentemente
disponível; outro, uma reflexão de longo prazo sobre o que pretendemos para o
país num horizonte de 20 anos.
O processo actual de
planeamento, se é que se lhe pode dar esse nome, visa o médio prazo e abrange
pouco a modernização de hardware e
muito menos o software. Impõe-se, por
conseguinte, definir e consensualizar uma visão de longo prazo: Qual deverá ser
a nossa estratégia de longo prazo?
Acompanhar os mais avançados, como fizeram o
Japão e mais recentemente a China, ou desejavelmente, saltar etapas (leap frogging) como serve de exemplo o
caso da Coreia do Sul? Conclusão
Como se referiu de início, a
digitalização e a robotização não são um fenómeno novo e têm-se desenvolvido ao
longo de décadas, havendo hoje um consenso de que se atingiu um ponto alto e
irreversível, fenómeno este que, possivelmente, se acelerará no futuro. Destacaremos
três aspectos que carecem da maior atenção:
- Inevitabilidade do choque digital e social em curso;
- Alteração das condições de criação de valor;
- O facto de os robôs, nas actuais circunstâncias, não contribuírem para o financiamento da Segurança Social e como tal porem em risco o modelo de estado social.
Pode até pensar-se que a inovação,
além da sua inevitabilidade, nos irá surpreender e porventura assumir um perfil
ainda mais acentuado. O conceito de Big
data é talvez temporário e traz como novidade o facto de permitir
relacionar dados de natureza diferente. Mais do que termos robôs em casa,
acontecerá relacionarmo-nos com uma grande diversidade dos mesmos, em vários
domínios, permitindo-nos processar actividades muito diversificadas, com maior
eficiência. Será que o aumento da produtividade é inimiga do emprego ou se a
tecnologia permitir superar a execução de tarefas repetitivas e monótonas não
será tanto melhor? Em qualquer caso, torna-se indispensável encontrar modelos
políticos, económicos, e sociais que enquadrem esta evolução, de forma a não
agravar, mas antes a corrigir, as desigualdades de oportunidades e de
rendimento, riqueza e capacitação.
São muitas as interrogações
acerca do futuro e do melhor caminho para fazer a transição. As percepções e
opiniões dividem-se, mas é inquestionável a convicção de que é indispensável e
urgente promover um amplo debate na sociedade europeia e nos vários países
membros, para que, os cidadãos participem das escolhas que importa fazer e para
que se possa encontrar caminho para uma sociedade mais justa, próspera e
inclusiva. São necessárias políticas que favoreçam os pontos fortes (mundo
conectado, sistemas abertos, economia do conhecimento, acesso baseado na funcionalidade
e não na propriedade, governança optimizada, etc.) bem como as oportunidades
(organizações mais ágeis e flexíveis, mais trabalho autónomo, eliminação de
tarefas repetitivas, melhor ergonomia, tarefas pesadas e complexas mais
facilitadas, novas formas de cooperação e colaboração, etc..)
Do mesmo modo, deverão ser
combatidos e evitados os aspectos negativos da revolução tecnológica em curso,
tais como o menor crescimento do emprego, a concentração do poder e da riqueza
em poucas empresas, com a correspondente perda para outras e para alguns países
e sectores, a diminuição da classe média e a polarização da sociedade entre um
número reduzido de trabalhadores no topo da escala e um grande número, uma
massa, no fim da escala, bem como evitadas as ameaças, designadamente a destruição
massiva de empregos de tecnologia média, a perda de controlo por parte do trabalhador
da sua própria técnica, experiência e livre arbítrio, tornando-se na ferramenta
de uma máquina, a erosão da base fiscal e do financiamento da segurança social,
etc.
O funcionamento da democracia
no contexto global e de rápida evolução tecnológica levanta importantes
questões de ética que não podem, igualmente, ser esquecidas e que é
indispensável ter presentes. Por exemplo, as seguintes:
- O vivo e as tecnologias do vivo
- Os problemas de privacidade inerentes a Big data, Big brother, etc.
- A ética da inteligência artificial
- A excessiva polarização no mundo do trabalho
Em suma: É necessário e
urgente que as sociedades democráticas alarguem o espectro do debate público e
as escolhas democráticas a estas questões que têm muito a ver com a qualidade
de vida das pessoas e da sociedade, já no tempo presente e, sobretudo, com as
suas implicações para as gerações futuras.
Elsa Ferreira (GES)
30 Janeiro 2017
Sem comentários:
Enviar um comentário
Os comentários estão sujeitos a moderação.