05 fevereiro 2018

Os Jovens, a Educação e o Emprego – Desfazendo velhos mitos - I

O acesso ao mercado de trabalho

A situação escolar da população jovem portuguesa melhorou de forma expressiva, como nos revelam os indicadores que descrevemos a seguir. O abandono precoce da escola tem vindo a descer significativamente nos últimos anos, situando-se em Portugal, em 2016, num valor de 14,3% para os jovens dos 18 aos 24 anos, contra um valor correspondente de 19,8% para a EU-28, no mesmo ano. Embora a ritmo bastante mais lento, também a percentagem de jovens portugueses que não se encontram a trabalhar nem em educação ou formação tem diminuído, situando-se em 2016 em 18,2% da população dos 15 aos 34 anos, valor a que correspondem 23,4% para a média comunitária. Por outro lado, o aumento da percentagem de jovens dos 30 aos 34 anos que detém o Ensino Superior (ES) tem vindo a aumentar ainda mais abertamente, embora continue a situar-se abaixo da correspondente média para a EU-28: 34,6% contra 39,1%, em 2016 (EUROSTAT, Education and Training Database (http://ec.europa.eu/eurostat/web/education-and-training/data/database):

Como tem, então, correspondido esta evolução à da situação dos jovens perante o emprego?

Segundo alguns dos pressupostos da teoria neoclássica do investimento em capital humano (ICH), maiores níveis de educação corresponderiam a entradas mais fáceis no mercado de trabalho (e também a uma expectativa de salários mais elevados), como desenvolve desde logo Becker (1975).
Ora segundo o EUROSTAT, a taxa de desemprego dos jovens diplomados pelo Ensino Superior (1º ciclo) que se encontram à procura de emprego há mais de um e menos de três anos depois de concluído aquele ciclo, é ainda extremamente elevada em Portugal. Considerando o período de 2007 a 2016, constata-se que aquela taxa aumentou explosivamente no auge da última crise. E tendo vindo a diminuir desde 2012, mantém valores ainda bastante superiores aos do período pré-crise:


Fonte: EUROSTAT Database


A figura acima ilustra bem a amplitude do efeito cíclico do desemprego dos jovens licenciados portugueses. Mas revela também a importância do efeito persistência (ou histerese) do mesmo, cuja descida praticamente abrandou nos últimos dois anos. Nas palavras de Heidenreich (2015), trata-se do fim da lua-de-mel da teoria neo-clássica do capital humano, já que cada vez menos se verifica a correspondência positiva entre mais educação e mais fácil acesso ao emprego.

Por outro lado, ao contrário do que sucede com a taxa de desemprego dos ensinos secundário e dos graus inferiores a este, que têm vindo a decrescer sistematicamente entre trimestres homólogos no pós-crise, a taxa de desemprego correspondente do ES não só voltou a subir em 2016 (2º trim.) como se tem mantido superior à do Ensino Secundário nos períodos homólogos dos últimos 3 anos. 


Esta caracterização das condições de acesso ao emprego dos jovens licenciados portugueses, bem como da sua evolução cíclica, constitui só por si factor suficiente para refutar aquela teoria neoclássica do ICH. Com efeito, a natureza segmentada dos mercados de trabalho, o peso que os factores institucionais detêm nos mesmos, as razões da viscosidade que os atravessa, entre outros aspectos, têm constituído objecto de múltiplas análises críticas do pensamento dominante em Economia do Trabalho. Para já não falar da crítica indispensável à forma como é considerada a Educação na Teoria ICH, em número de anos de escolaridade: como sabemos, entre outros, por Hanushek & Woessmann (2010), o que conta é sobretudo a qualidade da Educação e das competências gerais da população enquanto factores de desenvolvimento e não o número de anos de estudo.

Assim, constatamos que, por um lado, o desemprego não afecta de modo igual os diferentes grupos sociais; e, por outro, que ele penaliza bastante mais os jovens mesmo os de maiores habilitações.

Além desta crítica ao pensamento mainstream em Economia do Trabalho e da Educação, convirá abordar outros aspectos que afectam igualmente o emprego dos jovens e que a TCH não considera. Fá-lo-emos no post seguinte.


-          Becker, G. S. (1975). Human Capital – a Theoretical and Empirical Analysis with Special Reference to Education. NBER. ISBN: 0-226-04109-3. 2nd. Edition;

-          Hanushek, E.A. & Woessmann, L. (2010). Education and economic growth. In: Peterson, P. (Org.) International Encyclopedia of Education. Oxford: Elsevier. S. 245-252;

-          Heidenreich, M. (2015). The end of the honeymoon: The increasing differentiation of (long term) unemployment. Journal of European Social Policy, vol. 25, nº 4.

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