05 fevereiro 2018

Os Jovens, a Educação e o Emprego – Desfazendo velhos mitos -II

As expectativas de sobre remuneração

Caracterizando agora a qualidade do emprego dos jovens portugueses com o 1º ciclo do Ensino Superior (ES, licenciatura), com idades entre os 20 e os 29 anos, constatamos que cerca de 17,7% se encontravam, em 2016, em auto emprego.  No total de jovens daquele escalão etário, e no mesmo ano, a percentagem de auto emprego era de apenas 5%. Não dispomos, no entanto, de informação associada àqueles valores que nos permita saber se aquela constituía uma opção ou, pelo contrário, um recurso dos jovens licenciados. A versão optimista indicar-nos-ia que o mercado de trabalho reconheceria positivamente as qualificações mais elevadas, fazendo-lhes corresponder, neste caso, níveis maiores de responsabilidade…

Será assim?

Consideremos, então, outros indicadores da qualidade de emprego dos licenciados, obtidos a partir da base de dados do EUROSTAT. No 2º trimestre de 2017, 34,3% dos jovens dos 25 aos 34 anos, com emprego, encontrava-se em situação de emprego temporário. Destes, 40,1% eram licenciados. Encontramo-nos aqui, por certo, perante a conhecida situação de estágios sucessivos, tantas vezes não remunerados, a que estes jovens se têm visto cada vez mais sujeitos. Por outro lado, também o trabalho a tempo parcial (part time) involuntário parece afectar em Portugal sobretudo a população jovem e até meio do ciclo de vida activa (25 a 49 anos), já que aqui representa 57,9% do total, em 2016. Entre os licenciados, aquela percentagem desce, entretanto, para 6,2% e coincide com a percentagem do tempo parcial involuntário para o total da população daquele escalão de idades.

Vejamos agora a situação relativa às remunerações, tal como consta da base de dados da OCDE. No que respeita às chamadas profissões liberais (professionals), exercidas quase exclusivamente por licenciados, o ganho horário dos indivíduos de 30 a 39 anos situou-se, respectivamente, a 52%, 69% e 72% da média global, em 2006, 2010 e 2014. É sabido como a experiência tem constituído em Portugal um factor importante na determinação dos níveis salariais e, portanto, tal poderá explicar, pelo menos em parte, aquele desvio em desfavor dos jovens, como nos explica Jacob Mincer (1974).

Mas com regimes de emprego em que predomina o trabalho temporário e a descontinuidade recorrente perante o emprego, como poderá aquela experiência vir a acumular-se?

E aqui nos defrontamos com outra das hipóteses fortes da TICH, a do incentivo a prosseguir para estudos superiores. Ou seja, postula aquela Teoria que, ao aumentar o número de anos de estudo e, em particular, ao concluir o Ensino Superior (ES), o indivíduo terá uma expectativa de vir a obter, ao longo de toda a vida activa, um sobre ganho face, designadamente, a quem detiver apenas o Ensino Secundário. Claro que para obter níveis de escolaridade mais elevados, o indivíduo incorrerá em diferentes tipos de custos adicionais – directos, como o gasto em propinas e livros, por exemplo; e de oportunidade, medidos estes essencialmente pelo montante de salários não ganhos de que abre mão para continuar a estudar. Obviamente, se não for estudante trabalhador. 

Então, mais nada haveria a considerar, para decidir optar por aquele investimento, do que a comparação, à taxa de juro de mercado, entre o montante daqueles custos adicionais e a expectativa de ganhos adicionais a ocorrerem durante toda a vida activa. Vida activa essa que é suposta ininterrupta, isto é, sem tempos mortos entre a conclusão da licenciatura e a obtenção do primeiro emprego, ou de sucessivos estágios nem sempre remunerados, ou ainda de desemprego ou inactividade em diferentes momentos da vida activa, situações muito frequentes entre os jovens diplomados portuguese, como temos vindo a descrever. Situações essas em que as expectativas referidas se verão pura e simplesmente goradas.


- EUROSTAT Database:
- Mincer, J. (1974). Schooling, Experience and Earnings. Human Behavior & Social Institutions, nº2.

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