O argumento de que só um governo global, a
ser criado, pode tornar compatíveis com o bem-estar de todos as políticas que cada país prossegue, usando o
seu poder soberano, tem servido à maravilha para não atender os protestos dos
perdedores da globalização.
Protestos que deveriam ser ouvidos, dado que,
ao longo do tempo, têm sido registados efeitos transfronteiriços extremamente
nocivos de algumas políticas, aquilo a que os economistas chamam
“externalidades negativas” as quais, não por acaso, afectam sobretudo os menos
ricos.
Como o estabelecimento de um governo global é
ilusório, aconselha Stiglitz [1] que ”as atenções se
concentrem nas áreas em que as externalidades transfronteiriças são
particularmente significativas” e exemplifica com a insuficiente atenção que
tem sido dada à concorrência fiscal- a infame corrida para o fundo- paraísos
fiscais e fluxos de capitais de curto prazo.
Muito tem sido revelado sobre a fuga aos
impostos praticada por empresas transnacionais e pessoas singulares, usando a
cobertura que lhes é oferecida por certos governos, sem que tenha sido possível
formar um consenso na U.E. capaz de lhes por cobro. Quando estas questões são
discutidas no Parlamento Europeu, acabam por não ter tradução em medidas
concretas e eficazes, pois esbarram com a regra da unanimidade no Conselho,
onde sempre se encontra quem esteja interessado em manter o Status quo.
É neste contexto que tomamos conhecimento da
aprovação, pelo ECOFIN de 5 de Dezembro de uma lista de “jurisdições não
cooperantes” em matéria fiscal, num total de 17 países que não cumprem os
padrões adequados no domínio da fiscalidade, a que se soma um lista de 47 que
se comprometem a convergir para aqueles padrões.
- O que podemos concluir desta lista que, pela primeira vez, a U.E. aprovou?
- A lista pode ser considerada completa?
- Que consequências para os que nela se
incluem?
- Será este o passo necessário e suficiente
para combater os abusos em matéria de fiscalidade que a lei (mas não a ética) permite?
O que verificamos – com surpresa – é que na
lista negra se encontram pequenos países não-europeus e dela não constam os
países da U.E. claramente envolvidos em concessão de facilidades para o
planeamento fiscal agressivo como o Reino Unido, as Países Baixos, a Irlanda, o
Luxemburgo, Chipre e Malta.
Parece, pois, fazer sentido a opinião de Alex
Cobham, presidente executivo da Tax Justice Network, segundo o qual “ a lista é
politicamente enviesada e não baseada em critérios objectivos ao restringir-se
a países economicamente fracos e politicamente isolados”.
Quanto às consequências esperadas da lista é
duvidoso que a maior transparência poderá actuar, como alguns têm defendido, no
sentido de criar uma expectativa de fim da impunidade face às práticas de
evasão e fuga fiscal e assim induzir, em geral, uma alteração no comportamento dos
intervenientes.
O próprio Comissário Moscovici disse, após a
aprovação da lista pelo ECOFIN, que se tratava de uma “resposta insuficiente” e
incitou a um acordo futuro sobre sanções efectivas.
A resposta à última interrogação é também
negativa.
Teria sido preferível inventariar um conjunto
de práticas fiscais condenáveis, ainda que legais. O próprio Comissário Moscovici
disse no Parlamento Europeu (possivelmente admitindo a intervenção de normas
europeias de defesa da concorrência) que, se o planeamento fiscal agressivo
muitas vezes é considerado completamente legal, haverá que actuar com um novo
quadro legal.
Certo é que a necessidade de prosseguir propondo
novas políticas de combate à fuga aos impostos é assumida pela Comissão, com o
objectivo de aumentar a transparência da actuação dos intermediários, bancos e
advogados, bem como o estabelecimento da obrigação de reportar os lucros das
empresas, país a país.
Mas que crédito merecem estes propósitos
quando irão enfrentar as mesmas pressões
que levaram a tornar inofensiva uma simples lista de países faltosos como a agora aprovada?
[1] Joseph E. Stiglitz in
“Globalization and its Discontents Revisited – Anti-Globalization in the era of Trump - pag. 79 - W.W.Norton & Company 2018
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