Há períodos, mais ou menos longos, na história dos países e dos povos em que a realidade socioeconómica e as instituições que a enquadram permanecem relativamente estáticas; mas existem outros tempos em que as alterações são tão profundas e rápidas que propiciam a emergência de uma nova época. Penso que é esta a situação em que, presentemente, nos encontramos na Europa e, designadamente, em Portugal.
A crise do sector financeiro, que eclodiu no verão de 2007 nos EUA, em breve se propagou a outros países e passou a assumir contornos de crise económica e social que abalaram os alicerces de todo o sistema, sendo hoje justamente reconhecida como apresentando características de crise sistémica.
Os governos nacionais e as instâncias internacionais foram obrigados a reagir; e têm-no feito em defesa da sustentação dos chamados mercados, indo ao encontro dos seus respectivos interesses. Por exemplo, injectando capital público em bancos insolventes.
Paradoxalmente, com os argumentos da escassez de recursos ou da eficiência do mercado em detrimento da administração pública, vêm sendo reduzidos a mínimos os conteúdos do “estado social”, com a concomitante limitação do papel do estado em domínios fundamentais do bem-estar individual e colectivo. Do mesmo modo, paulatinamente, em alguns sectores de opinião e de liderança política, se vem pondo em questão o próprio modelo do “estado social”.
Admito que o modelo que conhecemos carece ser repensado em função de actuais constrangimentos, em conjugação com novas potencialidades e com o aprofundamento dos valores próprios da nossa civilização e cultura, mas sei que não cabe aos chamados mercados ditarem as soluções desejáveis para a construção do nosso futuro colectivo, pese embora a influência que vão exercendo a nível do pensamento dominante através da tecno-estrutura que os serve e dos fóruns de discussão com que alimentam os média e estes, por sua vez, a opinião pública.
Compete, certamente, aos governantes escutar a voz das pessoas, acolher e interpretar os seus gritos de mal-estar (o desemprego, a desigualdade, a pobreza, por exemplo), ir ao encontro de legítimas aspirações de progresso material e civilizacional de toda a comunidade, promover a sustentabilidade e a coesão social, honrando a sua legitimidade democrática e por isso cabe-lhes aperfeiçoar o modelo de “estado social”, mas não desconfigurá-lo.
Nesta transição, inevitável, creio, a definição das trajectórias a seguir assume particular importância, e nela deve empenhar-se, lucidamente, o conjunto dos cidadãos e cidadãs. Por isso aqui deixo a interrogação: Por onde vai o “estado social”?
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