02 julho 2015

Efeitos Redistributivos do Programa de Ajustamento em Portugal

Não poderia ser mais oportuno este texto de Carlos Farinha Rodrigues que vem publicado num livro recentemente editado pela Fundação Calouste Gulbenkian. (Cf. Rodrigues, C.F. (2015), “Efeitos redistributivos do Programa de Ajustamento em Portugal”, in Soromenho-Marques, V. e P. Trigo (Eds). Afirmar o Futuro – Políticas Públicas para Portugal, Fundação Calouste Gulbenkian, pp. 216-259).

Concluído que foi o Programa de Ajustamento em Portugal, há que avaliar os seus efeitos directos e indirectos, fazendo-o com a devida abrangência e profundidade. Todavia, concordo com o Autor quando diz: No entanto, estas questões encontram-se praticamente ausentes do discurso oficial, exclusivamente dominado pelas questões da redução do défice e das restrições de ordem financeira, da procura de uma eficiência económica simplista e muitas vezes desprovida de valores éticos e de sensibilidade social.
 
Carlos Farinha Rodrigues aceita o desafio de preencher esta lacuna, debruça-se sobre a evolução da incidência e da intensidade da pobreza bem como sobre o nível de desigualdade na repartição do rendimento, questionando os factores que os determinam e estão associados às políticas que foram adoptadas durante o período do ajustamento.
 
Num texto recheado de evidência estatística, que o Autor, como ninguém, conhece, encontramos a demonstração inequívoca de que o Programa de Ajustamento veio inverter uma tendência que vinha do passado no sentido da redução dos elevados indicadores de pobreza em Portugal e, inclusive, se assistiu, no período em análise, ao seu agravamento.

O empobrecimento alastrou-se a grupos de maior vulnerabilidade, como sejam os desempregados ou os numerosos trabalhadores em situação de precariedade, as famílias monoparentais com filhos a cargo, os idosos e, sobretudo, as crianças e jovens. 
É, particularmente, interessante a análise que é feita da incidência das medidas de protecção social adoptadas durante a vigência do Programa de Ajustamento, designadamente os cortes e demais alterações introduzidos no RSI, no subsídio de desemprego ou no abono de família, o que concorreu não só para maior incidência como para o agravamento da severidade da pobreza.
 
O artigo ocupa-se, também, de uma análise fina das desigualdades e das principais alterações que ocorreram na distribuição do rendimento. As políticas de ajustamento agravaram a desigualdade e as políticas redistributivas adoptadas, designadamente a política fiscal, revelaram-se ineficientes.
 
O texto de cerca de 50 páginas oferece interessantes pistas para que se repense em profundidade quer as políticas de repartição funcional do rendimento, designadamente o emprego e os salários que lhe estão associadas, quer as políticas redistributivas e de protecção social.

Depois desta bem fundamentada análise e da evidência estatística que a suporta não pode continuar a afirmar-se que o custo da austeridade foi equitativamente repartido e que se cuidou, devidamente, como se impunha, de proteger os mais vulneráveis.
 
Está de parabéns o Autor pelo excelente contributo académico que nos oferece neste seu artigo.

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