O mais elementar princípio de justiça impõe
que as empresas devem pagar os impostos no país onde realizam lucros, assim
possibilitando os meios financeiros necessários para financiar o investimento,
a criação de emprego e todo um conjunto de prestações que são obrigação dos Estados
em ordem ao bem-estar social.
É bem sabido que práticas de planeamento
fiscal agressivo - isto é, de fuga aos impostos - por parte de algumas
empresas, causam uma distorção de concorrência que beneficia muito
especialmente as multinacionais, hábeis em aproveitar a acesa competição entre os
Estados na captação de investimento externo.
Assim se vai facilitando a existência de
regimes tributários permissivos, porventura defendidos para evitar a dupla
tributação, mas que acabam por possibilitar o não pagamento de impostos,
amplificando esquemas muito sofisticados que aquelas empresas mantêm em
funcionamento.
É certo que, ao longo dos tempos, se têm
sucedido iniciativas de reforma do regime tributário das multinacionais,
concebido nos anos 30 do século passado, mas os resultados são decepcionantes, como
tem vindo a ser comprovado por factos que envolvem tanto empresas como os
governos que as protegem.
Poder-se-ia esperar que, confrontadas com revelações
de comportamento não ético, as empresas mudassem as suas práticas, mas tal não
sucede: segundo a Comissão Europeia o Código de Conduta sobre a Tributação das
Empresas é de aplicação facultativa e, nos últimos anos, tem-se revelado menos
eficiente para tratar das questões colocadas por regimes tributários especiais.
Empresas como a Microsoft, a Apple, a Google e a Starbucks, têm sido dadas como
exemplos de como se pode, sem cair fora da lei, pagar montantes mínimos de
impostos nos países onde operam, transferindo para paraísos fiscais somas
astronómicas.
A crise que está a afectar as economias
desenvolvidas poderia, se para tal existisse vontade política, ser o motor de
um consenso alargado para a tomada de medidas efectivas de reforma profunda das
regras internacionais para tributação dos lucros.
Na Europa, encontram-se importantes
jurisdições protegidas por segredo fiscal, desde logo a Suíça, mas também a Alemanha
e outras jurisdições de menor dimensão: Luxemburgo, Mónaco, Andorra, Gibraltar,
Malta, Chipre, Liechtenstein, Ilha de Man, Guernsey, Jersey, para além da City
de Londres, que tem sido chamada «o centro da parte mais importante do sistema
offshore global».
Às iniciativas do G8, do G20, da OCDE, vem
agora somar-se o relançamento, pela Comissão Europeia, de uma outra, que estava
parada desde 2011, para uniformizar regras de determinação da matéria
colectável comum consolidada. Sem dúvida, é uma iniciativa muito relevante e da
maior oportunidade, assim ela possa ser concluída com êxito e em prazo
razoável, apesar de, como a Comissão admite, alguns Estados Membros não
desejarem maior cooperação em matéria fiscal.
Em todo o caso, algumas dúvidas começam já a
ser colocadas sobre a iniciativa da Comissão, como a seguir se exemplifica.
De facto, não se entende que critérios
explicam que na lista de paraísos fiscais que os Estados Membros indicaram à Comissão
Europeia, aqueles territórios europeus não tenham sido incluídos; assim como
não se entende a necessidade de lançar mais uma consulta pública acerca do
mérito de relatórios públicos, por países, que permitam conhecer os impostos
que as multinacionais pagam nos países onde estão presentes, pois esta informação
é claramente necessária para evitar a fuga aos impostos.
Em causa está o risco de captura do
regulador, que pode, mais uma vez, conduzir a um impasse no processo de reforma
do sistema tributário das multinacionais, indispensável para travar um processo
de esgotamento dos recursos financeiros, mais do que nunca necessários, para
combater as desigualdades de rendimento e para promover o desenvolvimento
sustentável.
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