27 setembro 2014

A Saúde no post-troika



Terminado o período marcado pela aplicação de receitas impostas pela troika, com tantos sacrifícios para a maioria dos portugueses, é tempo de criar condições para um desenvolvimento equilibrado e justo.

Se há reformas que devem ser feitas, importa que estas se enquadrem numa preocupação pelo bem comum e não se deixem, novamente, capturar por ideias que, sem fundamento científico válido, levaram a minar as políticas públicas sobre as quais assenta o Estado Social, ao mesmo tempo que o mercado é apresentado como a cura para todos os males.

Um sector particularmente sensível é o da Saúde, em que as reformas devem poder conjugar a igualdade de acesso aos cuidados e a exigência de qualidade, esta comprovada por indicadores fiáveis, sem descurar o controlo dos gastos públicos.

É pois de saudar o contributo da sociedade civil, em particular o que tem sido oferecido pela Fundação Calouste Gulbenkian em múltiplas iniciativas no domínio da saúde, agora acrescentado com a apresentação do Relatório “Um Futuro para a Saúde” que sintetiza as propostas de uma comissão de  peritos, nacionais e estrangeiros, preparadas  ao longo de 18 meses.

Aí se defende a mudança de um sistema de saúde centrado no doente para um outro centrado nas pessoas e na sua participação na promoção da saúde, o que terá não só um impacto positivo nos indicadores de saúde como também na sustentabilidade financeira do SNS.

Os três desafios lançados pela Fundação (redução das infecções hospitalares, combate à diabetes, aposta no cuidado com a saúde infantil), concretizam as metas a atingir, em termos de indicadores relevantes, e apontam as reduções de custos que assim se poderiam alcançar.

É certo que, desde há muito, especialistas nacionais vinham a alertar para  que uma menor qualidade dos cuidados de saúde se traduzia em maiores custos, mas as suas recomendações chocavam com a preocupação quase exclusiva com a redução rápida da despesa pública.

A tónica na participação das pessoas também não é propriamente uma novidade, mas a verdade é que a implementação desta ideia tem sido esquecida, quando não contrariada.

Veremos agora o início de uma mudança,  com o impulso dado pelas propostas da Comissão e os desafios lançados pela Fundação?

Um dos aspectos negativos que terá surpreendido o Presidente da Comissão autora do Relatório, é a pouca qualidade de vida dos portugueses mais idosos, quando comparada com a de outros países europeus.

Seria bom conhecer, com rigor, os factores que explicam esta nossa triste realidade, para sobre ela actuar com eficácia: qual a influência das condições socio-económicas ao longo da vida activa e na velhice, do acesso mais ou menos difícil aos serviços de saúde, da perda de apoio económico e familiar, e também da iliteracia em saúde?

O que temos como certo é que só um processo amplamente participado e uma adequada articulação das políticas públicas em múltiplos sectores que, de alguma forma, têm impacto sobre a saúde física ou mental, poderão vir a dar bons frutos, contribuindo para que o aumento da esperança média de vida que já alcançamos, e de que nos orgulhamos, seja uma benção para todos os portugueses.

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