29 setembro 2014

Até parece um “exclusivo” sobre a “exclusividade”

Não me recordo de que, alguma vez, quer os meios de comunicação social, quer os círculos políticos, tenham dedicado ao tema da exclusividade tanto tempo e tanto espaço, como na última semana. Infelizmente não me parece que o tenham feito da melhor forma. Centraram a sua atenção mais sobre as eflorescências do que sobre a substância da exclusividade.
 
Claro que tenho como pano de fundo as explorações políticas que têm sido feitas em torno da eventual colaboração, com a empresa Tecnoforma, do atual primeiro-ministro, num período em que foi deputado e se encontraria em situação de exclusividade. A quase totalidade dos interessados em explorar o assunto tem tido como preocupação principal a de saber se:
 
1.     No período indicado o primeiro-ministro se encontrava em situação de exclusividade, ou não;
2.     Estando, recebeu remunerações, ou não;
3.     Não tendo recebido remunerações, foi beneficiário de ajudas de custo e despesas de representação, ou não.
 
Tem-se concluído que se:
1.     O primeiro-ministro, estando em situação de exclusividade, recebeu remunerações, cometeu uma grave ilegalidade e falha de responsabilidade política;
2.     Não recebeu remunerações, mas apenas ajudas de custo, ou despesas de representação, então nenhuma falha lhe pode ser imputada, a menos que esses valores não tenham sido declarados ao fisco.
 
A lógica de análise acima descrita sofre de miopia avançada. Para quem possui um estatuto de exclusividade em determinadas funções, o receber, ou não, contrapartidas monetárias e financeiras pelo exercício de outras atividades é, apenas, um indicador do exercício dessas funções.
 
Ora, o estatuto da exclusividade tem como objetivo fazer que quem dele beneficia abdique de exercer qualquer outra atividade para poder dedicar-se em plenitude (em exclusividade) àquela de que beneficia do estatuto de exclusividade. E, por isso, é-lhe atribuído um subsídio adicional à sua remuneração corrente, designado subsídio de exclusividade.
 
Quer isto dizer que, se alguém possuindo o estatuto de exclusividade, exerce, a título permanente, ou ocasional, uma qualquer outra atividade, mesmo que desse exercício não receba qualquer contrapartida financeira, viola o estatuto da exclusividade. Com efeito o tempo e o esforço gasto com esta outra atividade foi como que tempo e esforço roubado ou desviado da atividade principal.
 
A sustentabilidade do argumento das ajudas de custo ou das despesas de representação perde, assim, todo o sentido. Estas não são remunerações certas e permanentes, mas indiciam o desenvolvimento de uma atividade paralela àquela em que se dispõe do estatuto de exclusividade.
 
As ajudas de custo só têm sentido ser pagas a quem tem um estatuto de vinculação permanente a uma certa atividade. Não é assim com as despesas de representação mas, certamente, que ninguém acredita que sejam pagas despesas de representação (almoços, por ex.) a quem não tenha exercido uma qualquer atividade a favor da entidade que as paga.
 
Isto é, havendo o desenvolvimento de uma qualquer atividade, remunerada, ou não, paralela àquela em que se possui o estatuto de exclusividade, há violação desse estatuto.
 
Certamente que esta violação não é um atributo particular do Sr. primeiro-ministro. Na sociedade portuguesa são múltiplas as situações em que se verifica a violação deste estatuto, e é precisamente por isso que o problema é aqui levantado, procurando chamar a atenção para que o importante não é a aparência de violação, mas a sua substância.

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