Não
venha por esta via, continue nessa onde vai: é o que nos diz o sentido
proibido, se queremos tomar, por exemplo, um desvio por onde pensamos que
iríamos mais depressa.
Mas
não venho aqui falar de segurança rodoviária. Estou, com a metáfora, a falar de
segurança laboral, isto é, de um mínimo de segurança na relação trabalhador –
patrão.
Vem
isto a propósito do recente Acórdão do Tribunal Constitucional sobre uma lei
(Lei nº 23/2012 de 26 de junho, que entrou em vigor em agosto desse ano) que
fez alterações ao Código do Trabalho e de que alguns artigos foram sujeitos a
apreciação de constitucionalidade a requerimento de 24 deputados da oposição. A
comunicação social tem-se referido ao Acórdão e o jornal PÚBLICO de ontem, 27,
traz uma síntese do que foi declarado inconstitucional - o tal sentido proibido
- e do que não o foi - a tal via que o governo pode continuar a seguir.
Não
sendo jurista (embora tenha convivido muito com o direito do trabalho) e tendo
em conta o contexto de um simples post, não vou entrar em análises do Acórdão.
Mas não deixo de observar desde já que não é, de modo nenhum, um acórdão que
põe em causa a via que o governo segue. E, por isso, várias das disposições
cuja apreciação se requeria, mantêm a sua validade porque o TC não as considera
inconstitucionais (referentes aos bancos de horas por acordo, redução de
compensações relativas a trabalho extraordinário ou as que alguns contratos
colectivos previam por despedimento colectivo, eliminação de feriados,
majoração de dias de férias por assiduidade, despedimentos por baixa de
produtividade ou qualidade da parte do trabalhador).
Não é, pois um acórdão contra a Troika. De
facto até dá relevância ao Memorando. O TC evidentemente não apresenta como
fundamento da sua decisão disposições do Memorando, mas faz-lhe uma referência
razoavelmente detalhada no seu nº 11 (na parte II – Fundamentação), na qual se
fala também do acordo com “…a maioria do parceiros sociais com assento na
Comissão Permanente da Concertação Social” e que enquadra nos “trabalhos
preparatórios da Lei nº 2372012…”, não deixando porém de assinalar que “em
relação a reformas desta natureza, as apreciações são muito diversas, ainda
que, em geral, salientem a coerência material com as exigências do citado Memorando de Entendimento”, citando
vários autores dos quais alguns são muito críticos da reforma da legislação
laboral pretendida pela Troika e posta entusiasticamente em execução pelo
actual governo.
Mas
voltemos ao sentido proibido. Neste acórdão, isso significa que é (embora
minimamente) contrariada a arbitrariedade de dois poderes: o governamental e o
patronal.
Contra
a arbitrariedade governamental está a declaração de inconstitucionalidade de
duas normas que pretendiam (e fizeram-no enquanto estiveram em vigor, afinal
tornado agora sem efeito) anular disposições de contratos colectivos referentes
a descanso compensatório por trabalho extra e a aumento de duração de férias.
Também a pretensão de fazer cair automaticamente para metade os valores de
pagamento de trabalho suplementar previstos em contratos colectivos não
revistos ao fim de dois anos foi declarada inconstitucional. Ou seja, a
contratação colectiva tem que funcionar como uma reserva mínima de segurança de
algumas condições de trabalho. Quando (como se mostra no PÚBLICO de 3/8/2013)
os trabalhadores abrangidos por contratação colectiva diminuíram de 1.270000 em
2010 para 194500 em 2013, isto não deixa de ser importante. E todos sabemos que
a contratação individual, só por si, deixa a maioria dos trabalhadores indefesos.
Mas
é sobretudo contra a arbitrariedade patronal (claro, apoiada pela política de
legislação laboral do governo) que este acórdão é um pequeno travão ou um sinal
de atenção: “não vão por aí!”. Nem fica ao livre arbítrio do patrão estabelecer
os critérios para despedir qual ou quais trabalhadores “por extinção do posto
de trabalho”, nem se exime o patrão de fazer um esforço para encontrar posto
compatível, porque o contrário “lesa desnecessária e excessivamente a segurança
no emprego”. E também o pretexto da inadaptação deixa de ser abusivamente
utilizado.
A
nossa cultura é dominantemente autoritária e grande parte do patronato (do
pequeno ao grande) é adepto do “quero, posso e mando”. Numa situação em que o
medo é, em tantas empresas, o ar que se respira, ainda bem que surgem estas
pequenas travagens ou sentidos proibidos.
Mas
não embandeiremos em arco, como alguns parece terem feito. Como diz A. Monteiro
Fernandes em artigo de hoje (PÚBLICO, pg. 17) “…trata-se de um acórdão generoso
e tolerante…; tudo o que de legítimo podia invocar-se, na perspectiva racional
das empresas…foi acolhido e adoptado como fundamento de decisões”. E
acrescenta: “para uma lei economicamente inútil e socialmente nefasta, não se
podia exigir mais”.
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