14 junho 2013

Crise - as causas e os remédios

Perante um problema, qualquer que seja a sua natureza, é do senso comum, para o resolver, partir da explicitação das causas que lhe deram origem. E, a partir daí, feito um bom diagnóstico, o que é necessário é atacar aquelas causas, tendo em linha de conta as diferentes formas de o fazer e os impactos previsíveis de cada uma delas.

A persistência da crise nos chamados países periféricos da Europa e os indícios de que economias europeias mais robustas começam também a fraquejar põe em dúvida que aquele exercício elementar tenha sido efectuado: São desconhecidas as verdadeiras causas da crise?
Adoptaram-se remédios errados?
Não se avaliaram correctamente os seus impactos?

A primeira interrogação já não tem qualquer razão de ser, pois não há dúvida de que foi a actuação dos Bancos europeus e a desregulação dos mercados financeiros que lhe deram origem.

A este respeito, são bem claras as palavras, que transcrevemos, do Vice-Governador do BCE, discursando em Atenas, a 23 de Maio do corrente ano: “…o afluxo de financiamento relativamente barato originou uma enorme expansão de crédito nos países agora sob pressão. Como sabemos, o crédito não foi perfeitamente optimizado por agentes privados racionais…”

”Do lado da oferta, os bancos europeus e os mercados financeiros não actuaram segundo a teoria na gestão do risco de crédito. Foi isto que conduziu então ao sobreaquecimento, à pressão sobre os salários e preços, a perdas de competitividade e a altos deficits nas balanças correntes”.

E ainda, mais adiante: ”Os desequilíbrios financeiros e macro económicos resultantes das actividades dos Bancos europeus até 2007, conjugados com a crise financeira internacional, foram os causadores primeiros da crise na Europa. Sem isto, a crise da dívida soberana não se teria aproximado da severidade registada”.

E, apesar destes factos, em Portugal continuamos a ouvir “ explicações” diferentes, mas que servem a quem quer apontar outros culpados e/ou justificar medidas penalizadoras do bem-estar social, preconizando, por exemplo, a redução do papel do Estado, privatizando ou lançando acções que apontam para esse fim, a oferta de bens ou serviços que deveriam manter-se na esfera pública, nomeadamente, os correios ou o abastecimento de água.

Mas será que, entretanto, estão a ser tomadas as medidas necessárias para que os Bancos e os mercados financeiros não voltem a criar instabilidade e a afectar a economia real?

Não há, a este respeito, qualquer razão para optimismo: do outro lado do Atlântico, as leis aprovadas tendem a ser suavizadas, por actuação dos poderosos lóbis enquanto que na União Europeia, apesar de reconhecida a necessidade urgente de uma União Bancária, a sua concretização tem importantes obstáculos pela frente. As medidas de apoio do BCE ao sector bancário servem para ganhar tempo mas não substituem as reformas de fundo na deficiente arquitectura da zona euro.

Se, antes da crise, os “bancos e os mercados de capitais nem sequer eram considerados importantes como fonte endógena de instabilidade que poderia ter impacto sobre a economia real”, visto que se tinha como certo o seu comportamento racional, parece agora que, em nome da confiança dos mercados, que urge conquistar a todo o custo, são tidos como negligenciáveis os impactos do ajustamento pela austeridade que, com esse pretexto, vão cavando a recessão e fazem disparar o desemprego.

Uma visão estreita na UE, ditada sobretudo pela política alemã, faz apertar o cerco aos orçamentos nacionais dos países em dificuldades, confundindo este policiamento com a efectiva coordenação das políticas económicas europeias.

Acreditar que, um dia, os mercados, apreciando como foram corajosos os cortes orçamentais, decidirão oferecer a recompensa, baixando os custos do endividamento, como disse Neil Irwin, a propósito dos motivos que levaram o BCE a advogar políticas de severa austeridade, ”é apostar com muita fé no poder da confiança” (citação de Paul Krugman em recensão de 6 de Junho de 2013 “How The Case for Austerity Has Crumbled” publicada na New York Review of Books).

Certo é que, qualquer que seja a motivação dos seus defensores, a austeridade tem subjacente a opção preferencial pelo interesse dos credores em detrimento dos trabalhadores: as medidas anti-crise rolam a velocidades e intensidades muito diferentes, consoante os grupos visados.

A rejeição, ou a tibieza, de políticas alternativas de estímulo à economia, talvez encontre aí uma explicação, pois, na realidade, não é consistente o argumento de ser arriscado concretizá-las…

Em qualquer caso, não dar a relevância devida à enormidade dos custos da austeridade sobre o bem-estar e a coesão social é que parece corresponder a uma ideia de construção europeia que diverge, seguramente, da que conduziu à adesão de países de economia mais frágil.

É uma outra Europa, que, de União, pouco ou nada terá.

1 comentário:

  1. Pois é os lóbis! Os piores nem sequer são os que andam com a cabeça à mostra, mas aqueles de que não se sabe onde meteram a cabeça.
    Quanto aos comportamentos racionais dos agentes e, neste particular, dos bancos, a racionalidade faz-me lembrar a muito comentada história do bater de asas da borboleta que gera tornados no Arizona. Tem-se visto que esta racionalidade dos bancos outra coisa não tem gerado senão tempestades nos mercados financeiros e nas situações económicas e financeiras de alguns países (vide os do ajustamento).
    Se a tempestade não amaina, vai ser muito difícil lançar as fundações da construção da nova Europa!
    Este post da Isabel tem o grande mérito de contribuir para a desmontagem da engrenagem que à maioria vem torturando.

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