13 junho 2013

A Dívida Social cresce e já não admite adiamentos

Discute-se, até à exaustão, a questão da dívida soberana e a responsabilidade do Estado em satisfazer os compromissos assumidos com os credores e multiplicam-se as medidas de política e as, eufemísticamente designadas, reformas estruturais, que, pretensamente, irão satisfazê-los.

Discute-se, ainda que moderadamente, a excessiva dívida privada (créditos concedidos às famílias e às empresas) e definem-se regras mais apertadas para disciplinar as instituições bancárias no que respeita à concessão do crédito.

Sobre a dívida social, porém, paira, nas instâncias de decisão política, um manto de silêncio e correspondente ausência de resposta adequada, passando ao lado das vozes que se erguem, na sociedade civil e nos seus vários sectores profissionais organizados, para denunciar as inúmeras situações sociais graves e para protestar contra a fria indiferença dos governantes e de outros actores políticos.

A dívida social forma-se do conjunto das privações que põem em risco a subsistência, a dignidade das pessoas, as oportunidades de trabalho remunerado e de realização pessoal ou subtraem direitos adquiridos em domínios fundamentais da existência humana e da vida em sociedade. Nos documentos da doutrina social da Igreja, o conceito de dívida social é mais exigente, pois engloba também a perda ou enfraquecimento do sentido de vida e de pertença e a falta de participação efectiva dos cidadãos e cidadãs nos processos de decisão política, cujo défice normalmente está associado à privação material.

Seja um ou outro o conceito de dívida social, que queiramos adoptar, não podemos ignorar que a dívida social vem atingindo, no nosso País, proporções gigantescas e com consequências dramáticas que afectam, directa ou indirectamente, a vida corrente da maioria dos cidadãos e cidadãs assim como apresenta, desde já, riscos de insustentabilidade ambiental e social para as gerações futuras. Exige-se, por isso, não só um debate aberto sobre estes problemas, situado ao mais alto nível de decisão política (Governo, Assembleia da República, e outras instâncias de poder), como uma mobilização mais assertiva da sociedade civil e das comunidades espirituais, no sentido de exigir que a dívida social se inscreva com prioridade na agenda política. Está em causa o valor inestimável da dignidade humana e a sustentabilidade da vida democrática.

Agora - e não sem tempo - que se começa a questionar a deriva austeritária e a admitir a urgência de medidas de crescimento económico, importa lembrar que tais medidas não devem visar apenas o reforço da capacidade produtiva do País e o aumento do PIB, por mais necessários que sejam estes objectivos. Importa que aquelas sejam acompanhadas pelo desenho de uma estratégia compreensiva e coerente de desenvolvimento direccionada para fazer face a esta enorme dívida social para com os cidadãos e cidadãs, que se traduz em elevado desemprego massivo e de longa duração, carência de recursos materiais para satisfação de necessidades básicas, menor qualidade de bens públicos como sejam os cuidados de saúde e a educação, insegurança em situação de doença, deficiência e idade, falta de acesso à habitação, perda ou enfraquecimento de direitos laborais, … e, sobretudo, défice de confiança nas instituições e de perspectiva de futuro.

2 comentários:

  1. É extraordinariamente bem-vindo e oportuno este novo "post" da Manuela Silva", nomeadamente quando nos diz que "Sobre a dívida social, porém, paira, nas instâncias de decisão política, um manto de silêncio".
    Permito-me, no entanto, fazer uma pequena observação, não sobre a substância, mas sobre a forma.
    Com efeito, do meu ponto de vista, "nas instâncias de decisão política" não existe silêncio. Pelo contrário, elas têm vindo a clamar, alto e bom som, que não existe uma "dívida social" mas, antes um "crédito social" a favor dos que maior acumulação de capital vêm realizando e que dele terão vindo a ser espoliados, pelo menos desde o 25 de Abril. O argumento do equilíbrio das contas públicas não passa de um mecanismo de transferência de rendimentos a favor dos que agora entenderam ter chegado o momento de se ressarcir.

    ResponderEliminar
  2. MBA tem toda a razão no comentário que faz (e que agradeço!).
    Eu também tenho razão. Ao pôr em evidência o conceito de dívida social, pretendi chamar a atenção para o facto de a dívida social ter vindo a cescer a ritmo acelerado e já ter atingido patamares verdadeiramente insustentáveis. Quis, assim, acender uma luz vermelha ao rumo que a governação vem seguindo e que MBA bem identifica como um mecanismo de transferência de rendimentos (dos mais pobres para os mais ricos, acrescento eu).
    Um condutor sensato sabe que diante de um sinal vermelho tem de fazer stop.
    No caso presente, além de parar, deve, urgentemente, fazer inversão de marcha, antes que condutor e carro caiam na ravina!

    ResponderEliminar

Os comentários estão sujeitos a moderação.