A avalanche de notícias que trouxeram ao
conhecimento público a realização de múltiplas e elevadas transferências de
dinheiro para paraísos fiscais sem o controlo inspectivo da Autoridade
Tributária, tem provocado reações de perplexidade e a justa revolta de uma
maioria fortemente sacrificada pelo chamado processo de ajustamento, desencadeado
pela crise de 2007.
As mentiras e as meias verdades com que
alguns pretendem mascarar factos incontroversos só contribuem para alimentar a
desconfiança em quem se esperaria - pois é esse o seu dever - que procedesse
sempre em ordem a salvaguardar o bem - comum.
A seu tempo, se for mantida a pressão
suficiente, serão conhecidos os verdadeiros contornos das referidas
transferências e apuradas todas as responsabilidades. Mais duvidoso poderá vir
a ser o cálculo do prejuízo para os cofres do Estado e ainda mais a cobrança
dos impostos devidos.
Entretanto, os partidos políticos preparam as
suas propostas de legislação com vista a um maior controlo de alguns movimentos
transfronteiriços de capitais, partindo de posições não coincidentes sobre o
que são, para que servem e que vantagens ou desvantagens decorrem da existência
de paraísos fiscais: basta ouvir a insistência com que o argumento da sua
legalidade tem sido apresentado, sem questionar os impactos perversos, não só
em matéria de perda de receitas fiscais, como de aprofundamento de
desigualdades entre pessoas e empresas e, eventualmente, a ocultação de
ilícitos.
Devemos a um conceituado especialista neste
tema - Nicholas Shaxon - uma boa definição de paraíso fiscal: “um local que procura atrair negócios
oferecendo facilidades politicamente estáveis para ajudar pessoas ou entidades
a contornarem as regras e as leis ou regulamentos de outras jurisdições”.
Particularmente interessante é a desmontagem
que este autor faz de uma série de argumentos geralmente apresentados em defesa
dos paraísos fiscais num texto que pode aqui[1] ser consultado na íntegra.
Entre os mitos aí referidos está o de que os
paraísos fiscais são bem regulados, cooperantes e transparentes, enquanto, na
realidade, eles (localizados sobretudo nos países da OCDE) são eficazes apenas
na protecção das fortunas dos mais ricos, através da evasão fiscal, informação
privilegiada sofisticada, engenharias financeiras complexas, tudo isto à custa
da sociedade em geral. São os mais pobres e a classe média que têm que
compensar o não pagamento de impostos pelos mais ricos e poderosos.
O argumento de que os paraísos fiscais nada
tiveram a ver com a última crise financeira global é outro mito muito bem
rebatido por Shaxon, que vai ao ponto de afirmar que não só eles foram centrais
nessa crise como estarão na génese da próxima.
Concluindo: os paraísos fiscais não só não
têm qualquer função económica útil, excepto o enriquecimento de uma minoria à
custa de todos os outros, pelo que a sua eliminação a prazo é um objectivo
social e economicamente defensável.
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