16 outubro 2016

17 Outubro – Dia Mundial pela Erradicação da Pobreza

Vai celebrar-se mais uma jornada na longa luta pela erradicação da pobreza.

Na origem deste dia está um homem, o Padre Joseph Wresinski (1917-1988). Cabe lembrar o seu testemunho e a sua acção.
 
Contactou de perto com a grande pobreza, sem jamais se conformar com o dogma da “inevitabilidade”. Ele próprio nasceu e viveu a sua adolescência num bidonville de Angers (França).
 
São dele estas palavras que, hoje, recordo em sua homenagem:
 
Nesse dia, atolei-me no infortúnio (…) Fiquei possuído pela ideia que estas famílias não poderiam sair da miséria, enquanto não fossem acolhidas, no seu conjunto, como um povo e, isto nos locais onde os outros homens têm por hábito tomar decisões. Prometi a mim mesmo que, se ficasse junto delas, faria tudo quanto estivesse ao meu alcance, para que viessem a subir os degraus do Vaticano, do Eliseu, da ONU... "

Não é de alimentos nem de roupa que mais precisam, mas sim de dignidade. Precisam, sobretudo, de não estarem dependentes do que querem ou não querem os outros, dependentes dos caprichos da boa vontade alheia
.
 
O Padre Wresinski assim pensava e assim agiu. São passos relevantes neste seu percurso os seguintes:

. A primeira acção colectiva junto das famílias de Nosy-le-Grand para a criação no local de um jardim de infância e de uma biblioteca e, posteriormente, a formação de uma associação de voluntários, da qual viria a surgir ATD - Aide à toute détresse (1957) com o objectivo de, entre outras acções, dar voz aos pobres junto das instâncias do poder público. A miséria é obra dos homens. Só os homens a podem destruir.
 
- Passo a passo, o povo do Quarto Mundo consegue ter voz no Conselho Económico e Social da República Francesa com a publicação de um relatório elaborado pelo conselheiro Joseph Wresinski intitulado Grande Pobreza e Precariedade Económica e Social o qual viria a ser adoptado pela Assembleia Nacional, no dia 11 de Fevereiro de 1987. É a voz do Quarto Mundo que, pela primeira vez, entra na agenda política da República Francesa.  O relatório reconhece a extrema pobreza como uma violação dos Direitos Humanos e proclama que não é possível suprimi-la sem associar, logo à partida, os mais pobres como parceiros de pleno direito.

- Esta importante decisão é consagrada por uma multidão de cidadãos e cidadãs (mais de cem mil), reunida no Adro das Liberdades e dos Direitos Humanos, no Trocadéro, em Paris. Era o dia 17 Outubro de 1987. Nessa ocasião foi inaugurada uma Lage, em lembrança dos mais pobres e excluídos, com réplicas, hoje, em várias cidades do Mundo, incluindo Lisboa, em frente do Arco da Rua Augusta.  Na inscrição pode ler-se: Onde os homens estão condenados a viver na miséria, aí os Direitos Humanos são violados. Unir-se para os fazer respeitar é um dever sagrado.
 
- Este gesto simbólico de há 30 anos, está na origem da celebração anual do dia 17 de Outubro como Jornada Mundial para a Erradicação da Pobreza a que, em 1992, as Nações Unidas deram um alcance universal.
 
As temáticas destacadas em cada ano não só mostram como é importante continuar a dar voz e vez aos excluídos como apontam para as diferentes faces da pobreza. Lembro o tema deste ano: Da humilhação e da exclusão à participação: Eliminar a pobreza sob todas as suas formas.
 
Transcrevo do manifesto redigido para a celebração de 2016 algumas ideias chave que merecem a nossa reflexão e empenho.

Eliminar a pobreza sob todas as suas formas e no mundo inteiro. Reconhece-se, explicitamente, que a pobreza não provém da falta de um só factor, mas da falta acumulada de numerosos factores interdependentes que afectam a vida das pessoas. Isso significa que devemos ir além duma definição da pobreza que a considera simplesmente como uma falta de rendimentos ou do estritamente necessário para assegurar o bem-estar material - como a alimentação, o alojamento, a terra, etc. – a fim de a compreendermos plenamente nas suas múltiplas dimensões.
 
Da humilhação e da exclusão à participação. Sublinha-se até que ponto é importante reconhecer e levar em conta a humilhação e a exclusão sofridas por numerosas pessoas que vivem na pobreza. A humilhação pode levar à indigência total, porque muitas vezes as pessoas que a sofrem têm vergonha de aparecer em público e, consequentemente, ficam excluídas socialmente, já que se lhes torna impossível participar na vida comunitária. Um tal isolamento e uma tal exclusão social podem levar a outras privações e limitar outras liberdades.
 
A importância dos aspectos não materiais. Os decisores políticos devem sublinhar os aspetos não materiais fundamentais da pobreza – como a vergonha, a humilhação e a exclusão social -, aspetos esses que afetam a vida das pessoas e a sua dignidade humana. É pois necessário disponibilizar dados mais completos e indicadores de pobreza mais fiáveis, pois o fato de poder avaliar e compreender a pobreza de forma multidimensional irá enriquecer a nossa compreensão e permitir o desenvolvimento de estratégias e de políticas mais maleáveis e eficazes para vencer a pobreza sob todas as suas formas.
 
A participação efectiva dos pobres na vida pública. A participação efetiva e significativa é não só um direito que permite a cada indivíduo e a cada grupo participar na vida pública, mas favorece também a inclusão social e permite verificar se as políticas de luta contra a pobreza sob todas as suas formas são sustentáveis e respeitam as verdadeiras necessidades e a dignidade humana das pessoas vivendo na pobreza.


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