“Ouvir as propostas dos programas eleitorais dos partidos políticos relativamente a esta temática”, acreditando que o próximo acto eleitoral pode “marcar a diferença através de uma aposta clara na coesão social, onde os direitos dos cidadãos são protegidos e onde a luta contra a pobreza e a exclusão social se assume como uma prioridade na agenda política», constitui o principal objectivo dos promotores deste debate.
Mas não é possível discutir o futuro sem entender claramente o presente e, em particular, a tragédia social que se abateu sobre o nosso país no passado recente.
As políticas de austeridade implementadas desde 2010 traduziram-se num inequívoco aumento da taxa de pobreza que, entre 2009 e 2013, passou de 17.9% para 19.5%. Este valor reconduz-nos aos níveis de pobreza registados no início do século. De facto, é necessário recuar a 2003 para encontrar um nível de pobreza superior ao verificado em 2013.
A intensidade da pobreza, uma medida de quantos pobres são os pobres, alcançou em 2013 o valor de 30.3%. Este valor traduz não somente um pesado agravamento face aos valores ocorridos nos anos anteriores mas constituí mesmo o valor mais elevado desde o início da série iniciada pelo INE em 2004. Comportamento similar registaram os indicadores de privação material, traduzindo uma forte degradação das condições de vida das famílias.
Os números anteriores são conhecidos. O forte retrocesso registado em termos sociais, o agravamento das situações de pobreza e de exclusão social são hoje factualmente incontestáveis quer a nível nacional quer internacionalmente.
Mas permanecem áreas menos conhecidas dos efeitos das políticas seguidas, que alimentam mitos e criam uma nuvem de incerteza que, em última instância tendem a justificar essas mesmas políticas ou, no mínimo, a sua inevitabilidade.
Pretendemos aqui analisar dois desses mitos sobre o que se passou nos últimos anos em Portugal.
O primeiro, provavelmente o preferido do primeiro-ministro e do Governo, é a de que as políticas de austeridade como os cortes dos salários e das pensões tentaram sempre isentar as famílias e os indivíduos mais pobres.
O segundo, aceite por muitos comentadores críticos do processo de empobrecimento seguido, é a de que a crise foi particularmente sentida pela classe média.
Ambos os mitos não são mais do que… mitos. A realidade, infelizmente, é bem diferente.
O gráfico seguinte ilustra a variação percentual do rendimento médio dos vários decis da distribuição do rendimento equivalente, entre 2009 e 2013.
Variação do Rendimento Disponível por Adulto Equivalente 2009-2013 por decis (%)
Fonte: INE, ICOR 2010 e ICOR 2014 |
Todos os decis registam um
decréscimo do seu rendimento disponível como consequência da profunda crise económica
e das políticas seguidas. O rendimento dos 10% mais ricos regista um decréscimo
de cerca de 8%. Os rendimentos dos decis 3 a 7 descem menos de 7%. O rendimento
dos 10% mais pobres diminui 24%!
Nem as classes médias foram as
que mais sofreram com as políticas seguidas nem os mais pobres foram poupados
no processo de empobrecimento.
A forte contracção dos
rendimentos dos indivíduos mais pobres, gerada pela conjugação da crise
económica, do desemprego e do forte recuo das transferências sociais é a verdadeira
imagem de marca das políticas de ajustamento seguidas.Sem reconhecer esta realidade trágica é fútil falar num futuro de erradicação da pobreza. Como sempre o passado não é exemplo mas é lição. E a lição a tirar é a da necessidade urgente de mudar de políticas, de assegurar um crescimento sustentável e inclusivo que recoloque a solidariedade e a justiça social no centro das diferentes políticas.
Este desmitificar do que a propaganda governamental, a começar pelo primeiro-ministro, diz sobre a atenção aos mais pobres merecia ser divulgado, "multiplicado". Precisamos de actualizar, por assim dizer, acções como a do livro que, há 2 anos, se intitulou "Não acredite em tudo o que pensa - mitos do senso comum na era da austeridade".É que esses mitos são construídos, muito, pela propaganda do primeiro-ministro e cª, com a ajuda de certa comunicação social.
ResponderEliminarEste desmitificar do que a propaganda governamental, a começar pelo primeiro-ministro, diz sobre a atenção aos mais pobres merecia ser divulgado, "multiplicado". Precisamos de actualizar, por assim dizer, acções como a do livro que, há 2 anos, se intitulou "Não acredite em tudo o que pensa - mitos do senso comum na era da austeridade".É que esses mitos são construídos, muito, pela propaganda do primeiro-ministro e cª, com a ajuda de certa comunicação social.
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