26 novembro 2014

Austeridade consentida



O erro que foi a opção pela  política de austeridade na zona euro, como resposta à crise desencadeada em 2008, é uma evidência  que se impõe cada vez mais com o passar do tempo.

De facto, está demonstrada a incapacidade de assim se resolverem os problemas dos países mais fortemente endividados, dados os efeitos recessivos que a austeridade  provoca e agrava, com impacto extremamente negativo sobre as condições de vida das populações, afectadas pela pobreza, o desemprego e  por  crescente insegurança e descrença no futuro.

Acresce o impacto da austeridade sobre o enfraquecimento dos apoios sociais do Estado, os quais, em tempo de crise, deveriam antes ser reforçados.

O que se anuncia para a Europa é uma estagnação prolongada e mesmo, especialmente para alguns países de economia mais frágil, um longo período de depressão, a menos que seja abandonada a política económica centrada na austeridade e encarada, com determinação, a necessidade de reestruturar a dívida.

É certo que os obstáculos são de monta e, para serem ultrapassados da melhor forma, deveriam poder contar com uma visão esclarecida  acerca das causas da crise na Europa e com a vontade de a resolver, de forma coordenada e solidária: tudo o que não se vê acontecer.

A passividade perante este estado de coisas não é seguramente uma opção defensável, tanto mais que se conhecem políticas alternativas à austeridade, apresentadas por conceituados economistas, preocupados com a necessidade de evitar uma insuficiência crónica da procura. Paul Krugman tem insistido  neste ponto, como muitos outros académicos.

Martin Wolf, em artigo publicado no Financial Times on-line de 25 de Novembro “Radical cures for unusual economic ills”, partilha dessa ideia e apresenta algumas das soluções possíveis, entre as quais uma redistribuição do rendimento onde existe excesso de poupança, e advoga a promoção do consumo em vez da sua penalização pela via fiscal. Uma outra questão para este economista é o risco de reformas laborais orientadas para a oferta, através de reduções de salários e mais facilidade em despedimentos, o que acaba por ter reflexos negativos no consumo.

Mas o tempo passa e constatamos que estas sensatas chamadas de atenção para os efeitos perversos da austeridade e a apresentação de  alternativas  esbarram com uma teimosa persistência no erro por parte das forças políticas dominantes na Europa, por vezes em contradição com a ideologia com que dizem identificar-se.

Wolfgang Münchau em “Radical Left is right about Europe’s Debt” publicado no Financial Times, on-line de 23 de Novembro sintetiza bem esta questão quando escreve que a tragédia actual da zona euro é o sentido de resignação com qual os partidos do poder, quer  do centro esquerda quer do centro direita, estão a permitir o deslizar da Europa para o equivalente a um “inverno nuclear”, enquanto apenas os partidos da esquerda radical aparecem como apoiantes de políticas sensatas, tais como a reestruturação da dívida. A ascenção do novo partido espanhol (Podemos) é apresentada como prova de que existe procura para uma política alternativa naquele país.

É forçoso prestar atenção a que algo de muito errado está a suceder com o descontentamento crescente dos europeus em relação às principais forças políticas que os têm governado, pois estas não têm mostrado vontade ou  determinação para enfrentar o poder hegemónico da Alemanha, país que continua a ditar a política económica europeia, em que a força do mercado a tudo se sobrepõe.

A resignação, neste caso, não é uma virtude que se deva louvar, antes um pecado por omissão.

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