Acordo Concertação Social 2012
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Reflexões em torno do “Acordo de concertação social 2012"

1. Justificação
As condições em que foi celebrado o último acordo de concertação social bem como o seu respectivo conteúdo no que respeita a princípios básicos de regulação de relações laborais mereceram séria reflexão por parte do Grupo “Economia e Sociedade” de cujo fruto se entende dever dar conhecimento público.

Move-nos o desejo de poder contribuir para o aprofundamento do lugar do trabalho humano na economia e na sociedade, trave mestra de uma democracia real e, bem assim, defender o papel da concertação social na definição de uma indispensável e urgente estratégia de desenvolvimento a prazo.

2. Os fundamentos da concertação social: marcos históricos

As práticas de concertação tripartida, envolvendo governo, confederações sindicais e confederações patronais, têm uma longa tradição em alguns países europeus.

Em Portugal, a concertação social iniciou-se com a criação do Conselho Permanente de Concertação Social (Decreto - Lei 74/84 de 2 de Março) o qual veio a ser extinto em 1992. Foi, contudo, de imediato, substituído pela Comissão Permanente de Concertação Social como órgão do Conselho Económico e Social, criado em 1991. Este Conselho encontra-se consagrado na Constituição da República Portuguesa (art.92º), apontando-se, explicitamente, entre as suas funções a de concertação social no domínio das políticas económica e social. Estamos, por isso, perante órgãos e funções com o mais elevado grau de legitimidade jurídica. Embora apenas com finalidades de consulta, à concertação social é conferido um papel importante na definição da estratégia de desenvolvimento do País.

O resultado da concertação social traduz-se em acordos, que não têm validade legal, mas cujas orientações os governos se comprometem a transformar em diplomas legais.

A concertação social é um elemento globalmente positivo no aprofundamento da participação social e aparece com a finalidade de promover o diálogo social tripartido, com vista a concertar interesses e posições eventualmente antagónicas.

Com efeito, a noção de concertação social teve a sua génese no pressuposto de que determinados problemas da sociedade eram melhor geridos numa base de cooperação/concertação do que numa abordagem de conflito, que muitas vezes se encontra presente na negociação bilateral.

Face a parceiros sociais representando interesses antagónicos (de um lado os trabalhadores, de outro lado os detentores do capital), o governo, tutelando a sua aproximação e defendendo o interesse geral da sociedade, contribui mais eficazmente, para criar condições propícias à normalização, equidade e estabilização das relações sociais.

Presentemente, para além de contemplar a política de rendimentos e preços ou problemas específicos da área das relações laborais, a concertação social abrange também a área da política macroeconómica. Assim sendo, pretende-se construir um novo modelo de funcionamento da economia e da organização social em que o Estado deixa de concentrar em si todo o poder de decisão procurando compatibilizar, antecipadamente, as suas estratégias com as dos restantes agentes económicos.

Os acordos já negociados em Portugal traduzem esta evolução e esta diferença de concepções. Enquanto os acordos iniciais se destinavam a tratar sobretudo de problemas salariais (Acordos de Preços e Rendimento) ou de condições de trabalho, (Acordo de Higiene e Segurança, de 1991, por exemplo) surgem outros acordos de maior amplitude (Acordo Económico e Social de 1990 ou o Acordo de Concertação Estratégica de 1996/99).

Ao designar o acordo de Janeiro último Compromisso para o Crescimento, Competitividade e Emprego, pretendeu-se aliar os parceiros sociais a uma estratégia global de desenvolvimento, ainda que esta não esteja explícita no texto do Acordo.

3. A concertação social, a paz social e a credibilidade externa

Admite-se que de um maior grau de participação e de um conhecimento aprofundado da situação económica resultará a assumpção de níveis mais elevados de consciencialização por parte dos agentes económicos, levando-os à adopção de comportamentos e objectivos compatíveis com a estratégia do governo. Desta forma entende-se que se estará a contribuir para amortecer custos e tensões sociais resultantes de mudanças que as reformas em curso e a situação da economia exigem. Ou seja, pressupõe-se que assim será possível atingir maior eficácia na obtenção de resultados de desempenho económico e maior equilíbrio social. A existência de um acordo constitui, deste modo, uma garantia adicional para assegurar níveis mais confortáveis de governabilidade e, portanto, uma maior paz social. No caso do presente acordo, pretende-se também obter alguns resultados positivos na credibilidade externa.

4. Os pressupostos da concertação social

Os objectivos acima mencionados, por mais legítimos que sejam, não podem, porém, ser conseguidos a qualquer custo. Há um conjunto de princípios orientadores que subjazem aos processos de concertação social e que, em todas as circunstâncias, devem ser respeitados.
Entre eles, cabe mencionar os seguintes:

- A dignidade da pessoa humana a que se associa o direito ao posto de trabalho, a condições de higiene e segurança, ao descanso e lazer, à conciliação do trabalho com a vida pessoal e familiar do trabalhador, a remuneração justa e pontualmente satisfeita.

- O trabalho não é uma mercadoria. Independentemente do seu menor ou maior valor objectivo, o trabalho “é expressão essencial da pessoa, é actus personae. Qualquer forma de materialismo e de economicismo que tentasse reduzir o trabalho a mero instrumento de produção, a simples força de trabalho, a valor exclusivamente material, acabaria por desvirtuar irremediavelmente a essência do trabalho, privando-o da sua finalidade mais nobre e profundamente humana.” (Compêndio da Doutrina Social da Igreja, 271). Assim sendo, o trabalho tem que ser defendido, através de regulação adequada, já que ninguém acredita que o mercado do trabalho seja capaz de se auto-regular.

- O reconhecimento de que, embora em termos económicos trabalho e capital sejam ambos factores de produção, não podem estes serem tratados da mesma forma no plano negocial, pois, sobretudo nas actuais condições, os detentores do capital dispõem de muito maior poder de decisão e dominação no mercado de trabalho, pelo que é expectável que a concertação social deva compensar com maior protecção a parte mais vulnerável.

- Da concertação social devem resultar benefícios para todas as partes e, no cômputo dos ganhos e das perdas, o balanço líquido de um acordo há-de traduzir-se em alguns ganhos (a par de algumas perdas) para todos os intervenientes.

- O acordo de concertação social é uma plataforma de compromisso trilateral em que qualquer das partes deve considerar que obteve vantagens, embora tendo assumido determinadas vinculações das quais resultam eventuais perdas.
Em síntese: A concertação social deve ser expressão e instrumento de diálogo e cooperação que oriente a actividade económica, sobretudo nas relações entre capital e trabalho. Implica, portanto, algum grau de equilíbrio entre interesses divergentes, com ênfase dominante nas relações entre patronato e sindicatos (parceiros sociais) e no enquadramento político que, por parte do Estado, assegure os acordos conseguidos e os objectivos pretendidos para a sociedade, especialmente na dimensão económica e na convivência social.

5. O trabalho e a concertação social no pensamento social da Igreja

O diálogo e a procura de equilíbrio entre capital e trabalho e da paz social daí resultante são aspectos especialmente valorizados pela Doutrina Social da Igreja (DSI). Vejam-se, por exemplo, os números 288 e 306 do Compêndio da Doutrina Social da Igreja:
- O trabalho é um bem de todos, que deve estar disponível para todos aqueles que são capazes de trabalhar. O “pleno emprego” é, portanto, um objectivo obrigatório para todo o ordenamento económico orientado para a justiça e para o bem comum.
Uma sociedade em que o direito ao trabalho seja atenuado ou sistematicamente negado e na qual as medidas de política económica não consintam aos trabalhadores níveis satisfatórios de emprego “não pode conseguir nem a sua legitimação ética nem a paz social” (Centesimus Annus, nº 43). (Compêndio, nº 288)
- As relações no interior do mundo do trabalho devem ser caracterizadas pela colaboração: o ódio e a luta para eliminar o outro constituem métodos de todo inaceitáveis, mesmo porque, em todo o sistema social, são indispensáveis para o processo de produção tanto o trabalho quanto o capital.  (Compêndio, nº 306)

6. O modelo económico subjacente ao Acordo de 2012

Ao assumir-se como “Compromisso para o Crescimento, a Competitividade e o Emprego”, o recente Acordo de concertação social pretende ser um quadro orientador da economia portuguesa. E, assim sendo, a visão económica que lhe está subjacente também deve ser confrontada, especialmente pelos cristãos (mas não só), com os princípios éticos que, segundo a DSI, devem orientar a economia.

O “Compromisso para o Crescimento, a Competitividade e o Emprego” tem como pressuposto que o crescimento económico resulta de um objectivo intermédio, o aumento da competitividade da economia portuguesa, e que o principal factor desse aumento de competitividade é uma maior flexibilidade e menor segurança para os trabalhadores e consequente menor custo do trabalho.

Por sua vez, subjacente a esta ênfase na redução do custo do trabalho, está a ideia (ou o pressuposto) de que o trabalho deve ser gerido como custo a reduzir o mais possível. Ora, gerir o trabalho só como um custo é o contrário de gerir o trabalho como factor de desenvolvimento. A visão do trabalho como factor de desenvolvimento é uma visão estratégica. A visão do trabalho como custo é (principalmente) uma visão dominada pelo horizonte de curto prazo. Desta visão conjuntural resulta, nomeadamente, a fragilização de vínculos contratuais, e essa fragilização é o oposto de um compromisso estratégico. Está aqui toda a diferença entre gestão conjuntural do emprego e gestão preventiva (e, por isso, estratégica) do emprego, quer ao nível empresarial quer ao nível de políticas públicas de emprego.

A esta luz, não resistem à crítica as orientações consignadas no Acordo relativas à maior facilitação dos despedimentos, ao corte de rendimentos do trabalho e pressão de abaixamento dos níveis salariais, às condições de gestão do tempo de trabalho, facilmente sujeitas a arbitrariedade patronal, pois este conjunto de orientações configura uma desvalorização do trabalho.

Tal desvalorização afasta Portugal da Agenda para o Trabalho Digno promovida pela OIT e que a UE, há anos, declarou apoiar. Além disso, esta orientação dominante no “Compromisso…” é também contrária a princípios éticos da DSI quer sobre a orientação de base da actividade económica quer sobre a dignidade do trabalho.

7. O Acordo de concertação social: os ganhos e as perdas nas reformas laborais

Relendo o actual Acordo á luz dos eixos matriciais acima referidos, somos levados a concluir que o mesmo apresenta falhas graves das quais nos merecem maior reparo as seguintes:
  • Apresentam-se como principais vantagens para os trabalhadores as maiores oportunidades de emprego que resultariam de um projectado crescimento económico associado a maior liberalização das normas laborais. Afirma-se no texto como objectivo do Acordo: garantir que sejam criadas as condições para uma recuperação forte e duradoura do crescimento económico. Trata-se, porém, de uma mera aspiração a que não correspondem metas quantificadas de crescimento do produto e do emprego. Acresce que o actual quadro geral das medidas de austeridade tem comprovados efeitos recessivos.
  • Em contrapartida, as perdas para os trabalhadores são múltiplas e bem concretizadas. É o que sucede em termos de insegurança no emprego e risco de agravamento do desemprego; diminuição dos níveis de remuneração; redução de subsídios em caso de desemprego; maior duração e menor regularidade do respectivo horário individual de trabalho e consequentes repercussões em termos de conciliação com a vida pessoal e familiar dos trabalhadores; descanso semanal e férias.
  • Para as empresas, existirão vantagens, nomeadamente as seguintes: diminuição de custos unitários do trabalho (menor custo de horas extraordinárias e de trabalho em dias feriados); aumento do tempo de trabalho (por via da redução dos períodos de férias, feriados e pontes). Com estas vantagens tem-se em vista promover a produção nacional, a produtividade e a competitividade externa das empresas portuguesas. Todavia, trata-se de um enfoque míope que não atenta nas verdadeiras causas do problema da falta de dinamismo empresarial e da baixa produtividade, como são, por exemplo, entre outras, as actuais dificuldades de acesso ao crédito, a insuficiente formação dos gestores, o excesso de burocracia, os níveis de tributação. 
  • Para o País e para a economia no seu conjunto, os efeitos serão benéficos e as vantagens conseguirão superar as desvantagens? Já anteriormente se referiu que as medidas contempladas neste Acordo, visam aumentar a produtividade da economia nacional, porém é sabido que aquela depende de múltiplos factores e não apenas da produtividade do trabalho. Mesmo em relação a esta última, está provado que ela não está correlacionada apenas com a maior ou menor quantidade de horas de trabalho e respectiva remuneração unitária, mas depende de factores tão importantes como a qualificação e competência dos trabalhadores, as relações humanas na empresa, a eficiência na gestão dos recursos, a capacitação dos gestores e das chefias intermédias, a motivação e participação dos trabalhadores na empresa, a cultura institucional, etc.
8. O Acordo e alguns dos seus conteúdos específicos mais relevantes

O recente Acordo de concertação social veio trazer alterações profundas ao modelo até então vigente.

Com efeito, o Acordo deu manifesto acolhimento às vozes que consideram o mercado de trabalho português como ineficaz, por conceder uma segurança excessiva ao emprego e uma protecção generosa aos desempregados, para além de se caracterizar por custos unitários de trabalho considerados demasiado elevados, face à necessária competição no mercado global. Daí que o Acordo se tenha concentrado em medidas que tornam os despedimentos mais fáceis e baratos, reduzem a protecção no desemprego e diminuem, consideravelmente, os custos unitários do trabalho.

Vale a pena, porém, reflectir um pouco sobre as características que vêm sendo apontadas ao nosso mercado do trabalho e avaliar da “bondade” das medidas agora acordadas. Este exercício é tanto mais útil quanto se sabe que o Acordo foi celebrado em circunstâncias excepcionais, com o País sujeito às regras impostas pelo acordo com a Troika.

Por outro lado, para avaliar o mercado de trabalho, é necessário considerar todas as suas componentes e não centrar a reflexão apenas num ou dois dos seus elementos.

A nossa análise centra-se predominantemente nas questões que têm vindo a ser objecto de maior controvérsia.

No que se refere à segurança do emprego, os estudos da OCDE têm apontado Portugal como um dos países com a mais elevada segurança no emprego, em resultado das regras para o despedimento individual, sendo, porém, os despedimentos colectivos e a regulação das formas temporárias do emprego menos rígidos do que na generalidade dos países europeus. A reforma de 2009 já introduziu uma maior flexibilidade nos processos dos despedimentos individuais, alterando a posição relativa do país em relação aos seus congéneres europeus.

Para além da discussão sobre a constitucionalidade das alterações agora adoptadas, importa perguntar se com elas nos arriscamos a ter o emprego menos seguro da Europa.

Quanto à protecção dos desempregados, tanto a duração do subsídio como a respectiva taxa de substituição, ou seja, a percentagem representada pelo subsídio em relação ao salário, são elevadas, por comparação com os padrões europeus. Contudo, esta comparação é apenas válida em termos teóricos. De facto, nós temos uma taxa de cobertura de desempregados pelo subsídio de desemprego substancialmente inferior à dos restantes países europeus, deixando muita gente desempregada fora do sistema. Para tal contribui o facto dos desempregados à procura do 1º emprego, que atingem números cada vez mais elevados, não estarem cobertos pelo subsídio. Por outro lado, os trabalhadores temporários têm dificuldade em reunirem as condições necessárias para poderem beneficiar da protecção no desemprego. A estas situações acresce a importância que assume o trabalho independente, o trabalho não declarado e a economia informal, situações não cobertas pela protecção no desemprego.

As transformações agora adoptadas vão no sentido de uma forte diminuição do nível e duração do subsídio, aparecendo como contrapartida o projectado alargamento aos trabalhadores independentes e a sua futura atribuição aos empresários em nome individual, o que embora desejável não é suficiente.

A nosso ver, é imprescindível introduzir outros elementos na apreciação deste problema, reconhecendo, por exemplo, que a prestação do subsídio de desemprego é muito baixa, em resultado do nível dos salários e da prática de declaração de salários inferiores aos praticados.

A importância crescente do desemprego de longa duração, em proporção largamente superior à da média europeia, coloca também problemas acrescidos aos desempregados, sobretudo os mais idosos, mas que não atingiram ainda a idade da reforma. Que alternativas encontrar para superar esta situação? Não se pode também esquecer que o risco de pobreza entre os desempregados é muito elevado, colocando os trabalhadores, em particular numa época de crise e de fraca oferta de empregos, em posição de grande vulnerabilidade económica. Não se encontra no Acordo compromisso do governo com adequadas e eficientes políticas activas de emprego para diminuir a situação destes trabalhadores desempregados, como seria necessário e urgente.

A diminuição dos custos de trabalho, em resultado do corte nas férias e feriados e nas novas regras para o pagamento das horas extraordinárias, leva-nos, mais uma vez, a recorrer às comparações internacionais. De acordo com o EUROSTAT, não deixa de ser preocupante verificar que o custo unitário do trabalho, em Portugal, é inferior ao da Irlanda, Espanha e Itália.

Quanto à duração do trabalho no nosso País, com a inclusão das férias e feriados, já é ligeiramente superior à da UE15, ainda que um pouco inferior à da UE27 e, mais particularmente, à dos 12 novos Estados Membros. De salientar que as soluções, que têm vindo a ser praticadas entre nós em matéria de organização do tempo de trabalho, são notoriamente diminutas. No entanto, a forma encontrada para a constituição do banco de horas, que passa a ser possível por mero acordo entre trabalhador e empregador, dispensando a negociação colectiva de trabalho, pode vir a constituir um sério retrocesso social, comprometendo conquistas de direitos fundamentais, que pareciam adquiridos, e prejudicando a desejável conciliação entre a vida profissional e familiar, ao arrepio de uma das bandeiras comunitárias.

No que se refere aos custos unitários do trabalho, a posição relativa de Portugal não deve fazer esquecer que os nossos níveis salariais são significativamente inferires aos europeus, muito especialmente os dos trabalhadores menos qualificados e que o risco de pobreza dos trabalhadores portugueses se encontra entre os mais elevados.

A procura de uma maior flexibilidade no mercado de trabalho, de forma a corresponder às novas exigências da concorrência, está a realizar-se privilegiando a flexibilidade externa (despedimentos) em detrimento da interna (mobilidade e formação), para além de se pretender recorrer à aplicação uniforme, que não tem em conta a diversidade das actividades produtivas, e sem o recurso à negociação colectiva.

Em suma, além de ser extremamente penalizador para o trabalho, que suporta em grande medida os custos com a austeridade, este Acordo levanta a questão de saber qual afinal o incentivo para a mobilização dos trabalhadores com vista à superação da crise. A conquista de condições de trabalho dignas, que parecia ser uma das imagens da União Europeia, fazendo jus ao cumprimento dos direitos fundamentais dos trabalhadores, terá desaparecido totalmente da agenda política europeia e nacional?

É verdade que a legislação e as práticas de trabalho não podem ser imutáveis e indiferentes à evolução das condições económicas, sociais e culturais, mas as transformações necessárias não podem traduzir-se num recuo tão pronunciado, sem que sejam previstas medidas compensatórias e amortecedoras das dificuldades levantadas por estas mudanças, as quais se traduzem na desvalorização do trabalho e colocam sérias preocupações éticas, políticas e de modelo de sociedade.

9. Que perspectivas para o futuro?

A concretização do Acordo de concertação social 2012 e seu impacto na economia e na sociedade vai depender quer da legislação que vier (ou não!) a ser aprovada quer da dinâmica que o mesmo vier a gerar por parte dos parceiros sociais e das relações sociais. O resultado final do mesmo dependerá, assim, destes dinamismos.

A este propósito cabe deixar três observações que deveriam ser tidas em conta pelos líderes políticos, media e dirigentes das organizações da sociedade civil:
  • Os princípios constitucionais não podem ser desrespeitados nas leis laborais a submeter ao Parlamento.
  • É indispensável que sindicatos, comissões de trabalhadores, sociedade civil (e, em particular, as comunidades cristãs), acompanhem a evolução da pobreza e da precariedade, quer dos trabalhadores no activo quer dos desempregados e suas famílias, façam ouvir os seus direitos e reforcem a solidariedade, de modo a prevenir e corrigir essas situações.
  • Merece atenção especial a denúncia atempada dos problemas provocados pelo uso e abuso do grande poder discricionário dado por este Acordo ao patronato, nomeadamente em matéria de despedimentos, de diminuição de férias e fixação de horário de trabalho, lembrando que situações de trabalho, que pressionam os cidadãos trabalhadores para aceitarem condições injustas, apresentadas como “inevitáveis”, não favorecem a democracia nem na empresa nem no contexto mais amplo da sociedade.
Por último, queremos denunciar os riscos de que venha a instalar-se uma cultura de medo e submissão entre os cidadãos e apelamos à responsabilidade  particular que cabe aos gestores cristãos  na viabilização de relações laborais que em tudo salvaguardem a dignidade dos trabalhadores, a condição subjectiva do trabalho humano, a conciliação do trabalho com a vida familiar, o direito universal aos bens e demais orientações do Pensamento social da Igreja.

15 Fevereiro 2012
O Grupo Economia e Sociedade (Comissão Nacional Justiça e Paz)

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