O Acordo de Parceria Transatlântica de
Comércio e Investimento (TTIP) que a Comissão Europeia está a negociar com os
EUA, se vier a ser concluído, terá um impacto importante nos países
signatários.
O secretismo com que decorrem as negociações
é um obstáculo ao acompanhamento do processo e tem suscitado críticas de várias
entidades, nomeadamente de organizações não governamentais nos países
envolvidos deste lado do Atlântico.
No entanto, com base no que chega ao conhecimento público, continuam
a ser justificadas as perspectivas de enfraquecimento das regulações nacionais em
múltiplos domínios, ao mesmo tempo que sofrem contestação as estimativas da
Comissão acerca do impacto sobre o crescimento que pode decorrer de uma maior
liberdade de acesso a mercados externos.
Os vários estudos que têm sido feitos para
estimar os ganhos potenciais deste tipo de Acordos, usando para tal modelos económicos
sofisticados, dão diferentes resultados: por exemplo, a Parceria Trans-Pacífico,
que pretende facilitar o comércio entre a América, o Japão e outros 10 países,
tanto pode ter um impacto sobre o
crescimento do PIB, até 2025, de 285 mil milhões de dólares, enriquecendo a América
em 77 mil milhões, como pode ter um impacto insignificante ou mesmo nulo,
levando os autores a por em causa se vale mesmo a pena aquela Parceria(1).
A propósito da mesma Parceria, segundo Paul
Krugman(2), não é exactamente o comércio o foco que se pretende, mas sim a
aposta no reforço dos direitos de propriedade intelectual, como as patentes de
medicamentos e “copyrigts” de filmes, ao mesmo tempo que se visa alterar o
sistema como as empresas e os governos resolvem os litígios.
Quem beneficia com tais políticas não é
questão menor, antes pelo contrário.
Um estudo promovido pelo governo inglês, acerca
do impacto da maior protecção dos direitos de propriedade intelectual, admite
que o aumento de custo para os consumidores exceda o que seria necessário para
encorajar a inovação e pode abrandar o ritmo da transferência de tecnologia para os países em
desenvolvimento. Particularmente nocivo, segundo os autores deste estudo, pode ser o impacto da maior
protecção de patentes sobre o custo dos medicamentos.
Quanto ao processo de resolução de conflitos
que é proposto igualmente na Parceria Transatlântica, segundo o qual as
empresas multinacionais podem processar
os governos por alegados prejuízos decorrentes de regulações nacionais, sendo
os casos julgados em tribunais específicos, fora da jurisdição nacional, tarda uma tomada de posição firme, rejeitando as disposições
relacionadas com esta ideia.
De facto, existem já sinais de como este tipo
de cláusula pode ser usado para influenciar a posição de governos perante
grandes empresas, mesmo tratando-se do governo dos EUA, onde uma importante lei
de aplicação ao sistema financeiro (conhecida como Lei Volcker) foi aprovada,
mas é repetidamente contestada com argumentos vários, incluindo o de que viola
o Acordo de Comércio Livre da América do Norte.
Sabemos que o Parlamento Europeu prepara um
conjunto de recomendações a dirigir, muito em breve, à Comissão Europeia acerca
da Parceria Transatlântica, onde se incluem “reformas e melhorias” do mecanismo
de resolução de conflitos. Até que ponto são suficientes e em que medida serão
aceites?
Para além desta questâo muitas outras, também
fulcrais, serão objecto de recomendações por parte de Parlamento Europeu, como
constam da lista seguinte:
- "uma
lista exaustiva dos produtos agrícolas e industriais sensíveis;
- o
respeito pelos padrões ambientais, de saúde e de proteção social da UE;
- a
proteção das indicações geográficas europeias;
- a eliminação de quaisquer restrições
existentes à exportação de energia entre os dois parceiros comerciais;
- a proteção dos dados pessoais dos europeus,
assegurando que o acervo da UE neste domínio não fica comprometido com a
liberalização dos fluxos de dados, especialmente na área do comércio
eletrónico;
- a remoção das atuais restrições
norte-americanas aos serviços de transportes marítimos e de transportes aéreos
que são propriedade das empresas europeias, como no que diz respeito à
propriedade estrangeira de companhias aéreas;
- a exclusão de serviços públicos do TTIP,
nomeadamente água, saúde, sistemas de segurança social e educação;
- a pressão para que os Estados Unidos
ratifiquem e apliquem as oito convenções fundamentais da Organização
Internacional do Trabalho (até ao momento apenas ratificou duas);
- o aumento da
transparência, garantindo a publicação de mais documentos e o acesso a mais
informação sobre as negociações".
Tendo presente a diversidade de posições
defendidas pelas grupos representados no PE, bem como a falta de
democraticidade com que todo este
processo é conduzido, à margem dos Parlamentos nacionais, não se pode excluir a
possibilidade de um texto final que se revele contrário aos nossos interesses.
(1) - “Free exchange. A weighting game. Pacific trade talks expose the
limits of economic modeling”, publicado em The Economist em 30 de Maio de 2015.
(2) – Paul Krugman, “Trade and Trust”, publicado em The New York Times
em 22 de Maio 2015
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