Desejo que não se consegue controlar; desejo
de vingança; rancor; fúria; ímpeto de raiva; crueldade; furor; cólera
semelhante à dos animais enfurecidos ou raivosos. Estes são alguns dos
significados que os dicionários atribuem à palavra “sanha”.
Qualquer deles assenta que nem uma luva
no discurso e nas decisões do atual governo sobre as privatizações, e disso
temos como exemplo mais extremado as intervenções públicas que nos tem
oferecido o Secretário de Estado das Infraestruturas, Transportes e
Comunicações. Numa televisão, ainda ontem, afirmou: “vim para o Governo para
alterar completamente a forma como o Estado se relaciona com a economia”.
Privatizar, e privatizar a qualquer
preço, tudo o que permite a tomada de decisões pelo Estado, é a missão que se
atribuem. Sob o discurso da racionalidade e da eficiência, esconde-se uma
grande ignorância, a ignorância de não compreender que na vida em sociedade não
há apenas indivíduos, decisões individuais há, também, vida coletiva que exige
que os indivíduos tomem decisões em conjunto, porque só assim serão capazes de
gerar bem-estar, mais equitativo e mais justo.
Não é, agora, a ocasião para discorrer
sobre o que deve ser privado, ou deve ser público mas, em alternativa, sabemos
que os bens coletivos que agora estão sendo privatizados são um património de
todos, que é inter-temporal, que não deve, nem pode ser alienado por um
qualquer governo sem para isso ter adquirido mandato explícito. Este património
constitui, entre outros valores, o suporte e a garantia de que a maior equidade
e justiça social, na vida, pode continuar a ser obtida, nomeadamente, através
do Estado Social. A sua degradação, funcional e na qualidade dos serviços
prestados, consome e corrói a própria democracia.
O que se está a passar na TAP, e que
muda de patamar com o início, a partir do dia de amanhã, da greve dos pilotos é
um exemplo transparente da sanha privatística que se encontra à solta. O
Governo quer privatizar, porque diz que a empresa necessita, para sobreviver, de
capital fresco, acrescentando que o
Estado não lho pode fornecer, porque não tem dinheiro e mesmo que tivesse os
regulamentos comunitários não lho permitiria disponibilizar. Dizem, pois, que há que
privatizar ainda que em contrapartida se receba uma mão cheia de nada. Como
dizia o Sr. Secretário de Estado, há que introduzir uma nova forma de o
Estado se relacionar com a economia, o que é por si só um valor, mesmo que não
venha a existir qualquer contrapartida financeira.
Por outro lado, a posição dos pilotos tem como justificação
garantir o acesso a uma certa percentagem do capital social da empresa
privatizada. Não se percebe qual é a legitimidade que os pilotos da empresa
podem ter para aceder a essa participação, com exclusão de todos os outros
trabalhadores.
O que é certo é que se ouve, por vezes,
dizer que os pilotos, ou alguns deles, não enjeitariam poder vir a tornar-se donos
da empresa concorrendo para isso à privatização. Todos compreendem que se têm
esse objetivo então o montante que poderão desembolsar será tanto mais reduzido quanto mais
desvalorizada estiver a empresa e for menor o valor que o mercado lhe atribui.
As características da anunciada greve de
10 dias permitem considerar como espectável que aquela desvalorização aconteça.
Isto é, o governo quer a privatização a
qualquer preço; os pilotos querem a privatização ao menor preço.
Objetivamente, um e outros encontram-se mais
aliados do aquilo que a maioria das declarações e dos media nos querem fazer crer.
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