31 maio 2014

Para onde vai a Negociação Colectiva do Trabalho?

A Delegação de Lisboa do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra realizou uma conferência sobre “A Transformação das Relações Laborais em Portugal e o “Memorando de Entendimento”, entre os dias 21 e 23 de Maio. Esta conferência constituiu um momento privilegiado para conhecer e reflectir sobre as tendências actuais em matéria laboral no nosso país.
De facto, as mudanças que se estão a fazer sentir são muito significativas, têm tido lugar num período de tempo muito pequeno e estão a ser levadas a efeito, em grande parte, de forma unilateral e autoritária. Daí a pergunta sobre se não estaremos em face de uma nova configuração destas Relações, em particular no que se refere à Negociação Colectiva de Trabalho, apontando para a erosão e desvalorização das mesmas.
 
Recorrendo à Comunicação apresentada pela Professora Maria da Paz Campos Lima, “A erosão do sistema de relações laborais em Portugal no período de intervenção da Troika: instituições, processos e estratégias de actores”, verifica-se que as reformas da Troika, em Portugal, Grécia e Irlanda traduziram-se nas seguintes mudanças:
 
·       Diminuição da cobertura das convenções colectivas
·       Diminuição da extensão das convenções colectivas
·       Reforma do sistema de negociação colectiva na perspectiva da descentralização
·       Extensão da possibilidade de derrogação de matérias em relação às convenções de nível menos elevado
·       Remoção ou limitação do “princípio mais favorável"
·       Possibilidade de negociação de estruturas representativas ao nível da empresa (não sindicais) sem mandato sindical
·       Redução do período de validade e de sobrevigência das convenções colectivas 
·       Redução em geral do poder sindical na fixação dos salários e incremento da flexibilidade salarial descendente
 Em resultado destas alterações, podemos assistir, entre 2011 e 2013, a uma redução sem precedentes em Portugal no número de convenções e no volume de trabalhadores abrangidos. Assim, no período em análise, o total das convenções teria descido de 170 para 94 (295 em 2008) e o número de portarias de extensão de 17 para 9 (137 em 2008). Por sua vez, o volume de trabalhadores abrangidos reduziu-se de 1 236 919 para 242 223 (1 894 788 em 2008).
Se tivermos presente, entre outras, as disposições tomadas quanto ao congelamento unilateral do salário mínimo, entre 2012 e 2014, os cortes unilaterais dos salários e dos subsídios de férias e de natal no sector público e as reduções das férias e feriados e da compensação das horas extraordinárias no sector privado, podemo-nos perguntar sobre o que resta afinal para negociar.
Acresce que estão em actualmente em curso, segundo a comunicação que estamos a seguir, novos desenvolvimentos, nomeadamente os relativos à recusa da publicação de convenções que reduziam os horários de trabalho na administração local de 40 para 35 horas e a proposta que visa reduzir a validade de cinco para dois anos das cláusulas que determinam que a convenção só caduca quando for substituída por outra e reduzir de 18 para 6 meses a sua sobrevigência das convenções colectivas, bem como a suspensão das convenções colectivas nas empresas em crise por acordo entre a comissão sindical ou inter-sindical.
É caso para nos interrogarmos sobre o desmantelamento que está a ser efectuado no nosso sistema de relações laborais, sem que se tenha assistido a uma verdadeira discussão, negociação e tomada de compromissos pelos actores relevantes, o que lança as maiores suspeitas sobre o modelo que se pretende edificar.  

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