29 janeiro 2012

Já cá tínhamos confusão que chegasse. Não era precisa mais esta!


No fim-de-semana de 21 de Janeiro, um dos cronistas habituais de fim-de-semana publicou no jornal Expresso um texto intitulado ”E os patrões, Álvaro?”

O articulista escreve, um pouco depois do meio da primeira coluna do texto, o seguinte: “A baixa produtividade é, de facto, um problema laboral”. No início da segunda coluna continua escrevendo: “Mas a falta de competitividade, Álvaro, já não tem a ver com os trabalhadores, mas sim com a gestão, com os patrões e os seus executores”.

Ambas as afirmações são falsas, embora muitos dos comentadores dos media repitam afirmações equivalentes. Não viria daí nenhum mal ao mundo, se não fossem as ilações, também erradas que, a partir delas fazem, induzindo em erro os leitores menos precavidos. Por ex., o de que para aumentar a produtividade se tem que diminuir os privilégios dos trabalhadores; ou o de que se a competitividade aumentou isso se deveu ao que por ela fizeram os representantes do capital.

Vejamos, então, onde está o erro. Ao nível da empresa (porque, também, se pode falar delas a propósito da economia como um todo), a produtividade e a competitividade têm comportamentos equivalentes: quando uma sobe, ou desce, a outra tende a seguir no mesmo sentido. Por outro lado, os fatores que influenciam uma num determinado sentido, influenciam a outra no mesmo sentido.

Como sabemos, as empresas produzem bens e serviços, destinados a ser transacionados. Para obter esses bens e serviços reúnem matérias-primas, outros bens e serviços, tecnologia, mão-de-obra, etc. Reunidos todos estes ingredientes, os empresários ou os órgãos de gestão das empresas, determinam qual a melhor forma de os combinar, de modo a obter os produtos ou serviços finais.

Compreende-se, sem dificuldade, que com o mesmo conjunto de ingredientes um empresário pode obter produtos ou serviços que sejam mais facilmente apetecíveis pelos compradores do que os que são obtidos por outro empresário. O mesmo acontece na cozinha quando os experts procuram confecionar, por ex., um bolo.

O que é que pode explicar esta diferença de resultados, quando os ingredientes são os mesmos? Naturalmente que é a capacidade que possuem os empresários, ou os gestores para saber realizar a melhor combinação dos ingredientes ou, dito de outro modo, para escolher a melhor ou pior organização da produção (na cozinha dir-se-ia, de quem tem a melhor receita).

E agora vamos à produtividade. O trabalho é, como vimos acima, um dos ingredientes (fatores de produção). Dividindo o volume de produção pelo trabalho utilizado obtemos um certo valor, a que se chama produtividade.

O comportamento da produtividade depende dos comportamentos do numerador e do denominador. Pode-se manter o seu valor aumentando, simultaneamente, o numerador e o denominador. É possível aumentar a produtividade, fazendo crescer o numerador e mantendo constante o denominador e inversamente. O mesmo resultado se obtém mantendo constante o numerador e diminuindo o denominador. A diminuição da produtividade é obtida por comportamentos em sentido contrário.

Uma das variantes do aumento da produtividade acontece quando por unidade de trabalho se obtém um maior volume de produção. Porque é que isto acontece? Acontece porque a empresa foi capaz de adotar tecnologias e capacidade de organização através das quais com o mesmo volume de trabalho obtém um maior volume de produção.

Compreende-se, assim, que o comportamento da produtividade, se tem a ver com o comportamento dos trabalhadores, têm tanto ou mais a ver com o comportamento da organização produtiva que deles não depende.

A explicação ainda poderia ser levada mais longe se nos interrogássemos como é que se mede o trabalho utilizado: pelo número de trabalhadores?; pelo número de dias de trabalho?; pelo número das horas de trabalho?; pelos salários pagos?; pelos salários pagos, uma vez ponderados pela qualificação dos trabalhadores?, etc.

Por aqui se vê que o comportamento da produtividade é algo de muito complexo e que não é possível dizer que a sua evolução tem, apenas, a ver com os trabalhadores.

E agora a competitividade. Diz-se que uma empresa é mais competitiva que outra se, com os produtos ou serviços fornecidos, ela é capaz de dar maior satisfação aos compradores. Só que os compradores podem ficar mais satisfeitos por múltiplas razões: porque para os mesmos produtos e serviços a empresa é capaz de os oferecer preços mais baixos; porque, embora o preço seja o mesmo a qualidade do produto ou serviço é melhor; porque o fornecedor consegue satisfazer uma determinada necessidade com um produto que não é exatamente igual, que até pode ter preço mais elevado, mas dá muito maior satisfação ao consumidor, etc.

O grau de satisfação do comprador pode, assim, ter origem em múltiplas razões relacionadas com o comportamento dos fatores de produção, incluindo o do fator trabalho.

É, por isso, tudo, menos correto, dizer que a produtividade depende dos trabalhadores e a competitividade dos “patrões”. Quando a colocação dos bens e serviços está assegurada, o que faz aumentar ou diminuir a produtividade, tem idênticas consequências sobre o comportamento da competitividade.

É, por isso, que a empresa não pode ser olhada como um palco de confrontações entre patrões e trabalhadores, mas o deve ser, antes, como uma comunidade de vida e de poder, de modo a compatibilizar interesses que permitam obter os maiores níveis de produtividade e o maior grau de competitividade.

Esta é a razão pela qual a Doutrina Social da Igreja, no seio da empresa, não atribui ao capital, privilégios superiores aos do trabalho. A empresa e os processos que nela se desenvolvem existem, em primeiro lugar, para dignificar o trabalho e a pessoa humana, que é cada trabalhador, e não para realizar a sua escravização em proveito dos interesses ou da “dignificação” do dinheiro.

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