O
retorno à actividade parece estar a fazer-se, em Portugal, sem grandes
inquietações. Em termos sociais assistimos a mais do mesmo: os incêndios, o
descalabro das entidades financeiras, os crimes de corrupção e outros, que, não
tendo ultrapassado as marcas habituais, se
vão enquistando na inércia das reacções. O mundo lá fora é um lugar perigoso,
cada vez mais; mas a guerra comercial entre a China e os Estados Unidos e as
crises na Alemanha e na Itália parecem passar-nos ao lado. As crises dos
refugiados apoquentam-nos bastante, do ponto de vista humanitário, mas não
compreendemos, ou não queremos compreender, a sua fenomenal dimensão política:
afinal, não temos costa no Mediterrâneo…
A
perda da Amazónia veio sobrepor-se “[à]quele engano de alma ledo e cego” dadas as dimensões da catástrofe, os
indecorosos interesses envolvidos e, muito especialmente, a bestialidade e
arrogância das decisões dos mandantes, acima de toda a crítica internacional. Já não é mau que se desperte para o drama
ecológico que representa esta destruição do "pulmão do planeta", no qual há que
destacar a ameaça (deliberada?) à sobrevivência das populações indígenas e dos
pequenos agricultores que aí vivem. Mas também aqui raramente se vai ao fundo das
questões, negligencia-se o papel político da riqueza mineral que inclui, entre
outros, petróleo, gás, minerais radio-activos ou mesmo as potencialidades em
produção de electricidade por via não fóssil. Ignoram-se ou pretendem
ignorar-se, por comodidade de opções, os enormes conflitos de interesses políticos
internacionais que a Amazónia e suas riquezas despertam à escala global. Mesmo
sendo o segundo país europeu a pagar mais cara a electricidade, não aprofundamos a reflexão.
Somos
mais do que dominados pelo local e pelo curto prazo, como tão claramente salienta Manuela Silva nos seus mais recentes posts neste blogue.
E, assim, desinvestimos enquanto cidadãos responsáveis e com o
dever de intervenção cívica.
A
Economia parece igualmente sorrir-nos, ou pelo menos não inquietar. Discutindo
os especialistas sobre as maiores ou menores probabilidades de uma nova crise
internacional, são quase unânimes na conclusão de que, a verificar-se, ela pouco
ou nada afectará a economia portuguesa. Afinal, as contas externas voltaram a
desequilibrar-se mas apenas de forma momentânea, devido à importação de mais
aviões pela TAP. O nível geral de preços – e de juros – continua muito baixo (perigosamente pró-deflação?),
as contas públicas estão equilibradas… Isto por agora.
Mas
talvez valha a pena aprofundar uma ou duas tendências económicas.
Nesta
população cada vez mais envelhecida, com 157 idosos para cada 100 jovens
segundo o Retrato de Portugal (2018, 2019) da PORDATA[1], 52% ainda não possui os
ensinos Secundário ou Superior, valor que compara com 22,5% na média europeia. Destaque-se
o aspecto tantas vezes referido, mas pouco ilustrado, da falta de qualificações
dos empregadores portugueses: cerca de 54,5% detém menos do que o ensino
Secundário completo, enquanto o valor médio correspondente na U.E. é de 16,6%.
Sendo baixa igualmente a qualificação média dos trabalhadores, não admira que a
produtividade média horária em Portugal seja apenas cerca de 2/3 da
correspondente média comunitária.
O
que já surpreende é a que a Formação Bruta de Capital pelo Estado, em
percentagem do PIB, seja a penúltima mais modesta da EU, a seguir à da Grécia.
Aliás, neste domínio a recuperação pós-crise está a fazer-se muito lentamente, de acordo com a base PORDATA:
A Figura mostra-nos ainda que o desinvestimento se tem vindo a fazer tanto nos domínios do investimento público em si como nos gastos com saúde e educação. Contentar-nos-emos, ou estaremos condenados, à eternização daqueles défices de qualificações e de produtividade? Admirará muito que os problemas se venham acentuando nos dois sectores públicos considerados?
E como acautelar o futuro, sabendo também que a poupança privada tem vindo a diminuir drasticamente e que o grau de abertura ao exterior da economia portuguesa se mantém tão elevado?
Na ausência de uma proposta clara a este respeito, vamos desinvestindo, sem dar por isso...
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