11 junho 2018

Transição energética e cuidado pela nossa casa comum

A civilização requer energia, mas o uso da energia não deve destruir a civilização.
 
Esta foi uma afirmação clara e lapidar do papa Francisco no discurso que pronunciou, no passado dia 9 Junho, na presença dos dirigentes das principais empresas multinacionais do sector do petróleo e do gás natural, reunidas no Vaticano para um simpósio convocado pela Pontifícia Academia das Ciências e outras entidades, o qual teve como tema Transição energética e cuidado pela nossa casa comum.
 
Nesta sua alocução, Francisco reiterou o pensamento de que a tecnologia baseada em combustíveis fósseis, altamente poluentes - especialmente o carvão, mas também o petróleo e, em menor escala, o gás - deve ser substituída gradualmente em favor das energias renováveis. Uma tal preocupação tem de ser compaginada com a preocupação de garantir o acesso equitativo de todos à energia, desafio este tanto maior quanto sabemos que, no mundo, cerca de mil milhões de pessoas ainda não dispõem de electricidade.

A ocasião serviu para lembrar o alcance do Acordo de Paris sobre o clima e para denunciar que o mesmo não está a ser cumprido com a exigência e a celeridade requeridas, apelando aos líderes políticos nacionais e mundiais bem como aos CEO’s das empresas do sector petrolífero a que não baixem a guarda.

A “sede de energia”, disse, não pode ser satisfeita à custa de maior poluição e de desequilíbrios acentuados nos ecossistemas. A necessidade de fornecimento de quantidades crescentes de energia para o funcionamento das máquinas não pode ser satisfeita com o preço de poluir o ar que respiramos.
 
Francisco afirmou também que, para saciar essa 'sede', não está certo aumentar a sede física de outras pessoas por água, a sua pobreza ou a sua exclusão social. E ainda: 
- A necessidade de expandir espaços para as actividades humanas não pode ser satisfeita de maneira a comprometer seriamente a nossa própria existência ou de outras espécies vivas na Terra.
- (…) Importa reconhecer que não existe uma energia infinita e bem assim que não devem ser subestimados os efeitos negativos de eventual exploração de recursos potencialmente poluentes.
- (…) A forma como enfrentaremos esse desafio irá determinar a qualidade de vida e se os conflitos em diferentes áreas do planeta encontrarão uma solução mais fácil ou se serão alimentados com novo combustível para destruir a estabilidade social e vidas humanas.
 
Não podemos ignorar que estamos perante um enorme desafio, de proporções epocais e que o mesmo afecta todos os povos e regiões do mundo, designadamente os mais pobres. Por isso, neste discurso, o Papa apela a um compromisso com a definição de uma estratégia global de longo prazo com vista a  um desenvolvimento integral sustentável. Um tal compromisso requer, nas palavras de Francisco, uma nova forma de liderança, e que esses líderes devem ter uma percepção clara e profunda de que a Terra é um sistema único e que a humanidade, da mesma forma, é um todo único.
 
Na ocasião, o Papa Francisco lançou aos presentes a proposta de que se constituam como o núcleo de um grupo de líderes que visualize a transição energética global de uma forma que leve em consideração todos os povos da Terra, bem como as gerações futuras e todas as espécies e ecossistemas.
 
Toda esta reflexão é de particular relevância e actualidade no nosso País, mormente quando está em vésperas de ser lançado um projecto de prospecção de petróleo no mar ao largo da costa sul o qual suscita justificadas preocupações e críticas. Os cidadãos e cidadãs têm uma palavra a dizer e os governantes devem ter a sageza de a saber promover e escutar.

O discurso na íntegra, em inglês, pode ler-se aqui.

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