29 julho 2013

Crime vs Erro


No passado dia 25 deste mês, no jornal PÚBLICO, o Prof. Alfredo Bruto da Costa em artigo de opinião, intitulado Governar para gente, apresenta uma crítica demolidora da política seguida pelo governo e pela actual maioria, de que a referência dominante era o ex-ministro das finanças Vítor Gaspar, zeloso cumpridor das imposições decorrentes do “programa para o défice e a dívida”. Este, na sua carta de demissão, reconhece o “incumprimento dos limites originais do programa para o défice e a dívida, em 2012 e 2013…”, afirmando em consequência que “a repetição desses desvios minou a minha credibilidade enquanto ministro das finanças”. Já no ano passado dei a um “post” aqui publicado o título de “O senhor dos desvios”.

Não refiro detalhadamente os vários aspectos em que Bruto da Costa caracteriza negativamente o caminho seguido pelo governo e pela maioria, além da “prática autoritária” tanto do governo como da troika e dos “governos mais influentes da EU”. Apenas quero dar eco a uma expressão certeira, pois ela ajuda a contrariar a perspectiva dominante que, objectivamente, branqueia ou desculpabiliza ou “compreende” os tais desvios.

Diz Bruto da Costa: “Em qualquer dessas interpretações (refere-se aos desvios) o que objectivamente decorre da carta do ex-ministro Vítor Gaspar é que a política seguida e/ou o modo como a mesma foi implementada falharam. O preço humano seria demasiado elevado mesmo no caso de sucesso. Perante o fracasso, poderemos estar, em perspectiva ética, perante um crime social de governação”. E continua: “Outros aprofundarão os eventuais aspectos penais, nacionais ou internacionais, da situação. O que interessa aqui, é i) saber quem deve responder por este crime e de que maneira e ii) identificar as lições do fracasso para o futuro.”

“Crime social de governação”. Não estamos a falar em erros, de exames ou avaliações cujo júri é a troika. Nesta perspectiva – a do erro – é a competência técnica que é a referência, deixando na sombra a responsabilidade política (no fim do seu artigo, Bruto da Costa diz que “as verdadeiras negociações devem ter lugar entre responsáveis políticos…”). Ora, é de perspectiva ética que precisamos. E, sem entrar em judicialismos da política, é de chamar a responder pelo crime social os autores de uma governação cujos objectivos resultam em tanto sofrimento, injustiça social, falta de equidade, desrespeito pela dignidade humana e pelos direitos humanos, emigração da juventude, cumplicidade ou submissão à “filosofia iníqua do poder absoluto do credor…”. Por detrás do credor (ou sob a sua protecção!) estão os que A. Bruto da Costa chama os “aventureiros, especuladores e agiotas do mundo financeiro”, os “mercados” a cujo regresso os mais altos responsáveis políticos consideram desígnio tão nacional que para isso queriam um compromisso que chamaram de “salvação nacional”.

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