14 setembro 2012

A Constituição em tempos de crise

Em situação de grave crise como a que estamos a atravessar, corre-se o risco de ver desfigurada a tradução dos principios constitucionais em políticas concretas, quando não mesmo o de ser usado o argumento do “estado de excepção” para tudo pretender legitimar.

Nada mais errado e potencialmente destrutivo de uma desejável - mas tão ameaçada - coesão social.

Por isso se lê com agrado, no Acordão nº 353/2012 do Tribunal Constitucional sobre a Lei do Orçamento para 2012, suscitado por iniciativa de alguns deputados, que, apesar da Constituição não poder ficar alheia à realidade económica e financeira, sobretudo em situação de graves dificuldades, “ela possui uma específica autonomia normativa que impede que os objectivos económicos ou financeiros prevaleçam, sem qualquer limite, sobre os parâmetros como o da igualdade que a Constituição defende e deve fazer cumprir”.

Ainda bem que podemos contar com um Tribunal que vela pelo cumprimento da Constituição, mas melhor ainda seria que todos a tivessem bem presente nas respectivas esferas de competência.

Não sucede sempre assim, como se tem constatado.

É especialmente preocupante que o discurso da inevitabilidade de certas opções de politica económica, como o da austeridade a todo o custo, muito esteja a contribui para paralizar a opinião publica, tem eficácia muito duvidosa ou mesmo nula para fazer face aos reais problemas que enfrentamos e, no caso concreto que referimos, nem sequer respeita princípios constitucionais.

Aqueles princípios estão presentes quando, por exemplo, as politicas públicas fomentam o pleno emprego, visam a justa repartição do rendimentos, estabelecem deveres de prestação de serviços de interesse geral com qualidade e acessiveis a todos, e a todos asseguram um rendimento mínimo.

Mas em tempo de crise, quando são maiores as dificuldades de governação e se altera o peso relativo das forças sociais, uma redobrada atenção se impõe, tanto mais que o Direito Constitucional é um Direito de principios, não de regras. E estas constroem-se pelo diálogo nas instituições democráticas, atentas à voz dos seus representados.

É por isso, mais do que em tempos “normais”, indispensável a mobilização social para uma intervenção esclarecida, mas muito firme, de modo que as políticas públicas sejam avaliadas não só quanto à sua legalidade mas também tendo em linha de conta os impactos de diferentes alternativas na economia e na sociedade.

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