10 outubro 2017

O “comportamento” do prémio Nobel da Economia

 
Foi ontem (09-10-17) conhecido o nome do vencedor do Prémio Nobel da Economia para 2017. Trata-se de Richard Thaler, prestigioso professor de economia da “Chicago Booth School of Business”. Ainda ontem e durante o dia de hoje os media foram abundantes na publicação de comentários sobre o conteúdo dos seus trabalhos e sobre a personalidade do vencedor.
Infelizmente, os comentários raramente são capazes de sublinhar em que consiste a sua verdadeira contribuição para o avanço da ciência económica e, mais importante do que isso, para a demonstração de que a economia só se torna verdadeira ciência, na medida em que se aproximar da vida real das pessoas, nomeadamente, através da endogeneização do comportamento dessas pessoas nas explicações sobre o funcionamento da economia.
Tem-se vindo a sublinhar que a mais importante contribuição de Thaler, na sua economia dos comportamentos ou economia comportamental, tem sido a relevância que atribui às “decisões irracionais”. Ora, como seres racionais que somos não podemos deixar de nos interrogarmos como é que um professor brilhante, capaz de ganhar um prémio Nobel quer fazer de nós seres irracionais. Há qualquer coisa que não bate certo!
Vamos lá procurar saber onde é que está a marosca, porque a há. De fato as decisões que são apelidadas de irracionais, são perfeitamente racionais. Vejamos porquê.
Não é a primeira vez que aqui se sublinha a irracionalidade da chamada economia racional. Ao pretender fazer da economia uma ciência semelhante às ciências exatas, que têm como pressuposto que as mesmas causas produzem, sempre, os mesmos efeitos, um conjunto vasto de economistas (ditos liberais) criou uma maquete através da qual pretendiam e pretendem ver representado o funcionamento da economia. Segundo essa maquete, na economia existem, como agentes, produtores e consumidores, que têm comportamentos tipificados: os consumidores ao consumirem fazem-no maximizando as  suas utilidades; os produtores só encontram razão para produzirem se por essa via maximizarem os seus lucros. Os consumidores relacionam-se com os produtores, através do mercado e no comportamento do mercado não são admissíveis quaisquer outros agentes que não sejam os consumidores e produtores. Do Estado não deve existir qualquer sinal, porque se existir ele apenas pode ter como consequência a diminuição da satisfação dos agentes.
Ao maximizarem as suas utilidades e os seus lucros, consumidores e produtores, adotam comportamentos racionais. Quem assim não fizer não é um ser racional, não é um homo economicus.
É verdade que a maquete simula bem o comportamento dos agentes em determinadas, raras, situações. Mas é muito mais verdade que a maioria dos agentes se encontra, em muitas circunstâncias, perante situações em que a sua motivação não é, ou não é só, a utilidade e o lucro. Isto é, não se comportam como desejaria a maquete. São seres irracionais!
É aqui que Thaler vem colocar a verdadeira questão. Quem é que deve ser considerado como irracional? Quem não se comporta segundo as regras da maquete, que foram consideradas como sendo racionais, ou quem segue modelos de decisão que, embora possam ter em conta as regras do mercado as pondera com outras considerações que têm em conta as emoções, o cumprimento de regras de justiça, as intuições, o conhecimento adquirido através de experiências e decisões do passado, etc.
Naturalmente que tem que ser considerado possuir comportamentos irracionais, quem abandona os ditames da sua consciência e da sua história para dizer que nos devemos comportar segundo as regras da maquete. A racionalidade está na valorização do comportamento humano como ser inteligente, emocional, dotado de memória e que vive num mundo em que os outros seres humanos fazem parte das suas relações, que podem ser umas vezes de caráter competitivo, outras vezes de caráter cooperativo ou solidário.
É racional quem é dito irracional; é irracional quem antes subiu aos altares de uma pretensa racionalidade.
Por isso são tão importantes os contributos com que Richard Thaler nos tem beneficiado.
Ao tomar conhecimento da atribuição do prémio Nobel, perguntou-lhe um jornalista: e o Sr. o que vai fazer com os cerca de um milhão de euros que agora lhe foram atribuídos? A sua resposta foi de mestre e saiu de rajada: naturalmente, vou tomar decisões irracionais!
São irracionais, porque a maioria das suas decisões vão, certamente, contrariar as decisões racionais da maquete.

 

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