Ainda sob o efeito da surpresa que, para
muitos, constituiu o resultado do referendo no Reino Unido, multiplicam-se as
opiniões mais ou menos informadas e por vezes divergentes acerca dos seus
possíveis impactos económicos e financeiros a curto e a longo prazo.
Não menos importante é a possibilidade do “Brexit” ser o início de um processo
europeu de desconstrução, facilmente acelerado pelo sentimento de desencanto que
é perceptível em numerosos estratos da população atingida pela crise.
O espectáculo, nada edificante, da luta pelo
poder entre os que defendem o aprofundamento da União Europeia e o bloco de
países que a tal se opõem, adeptos de um conceito de Europa como um conjunto de
estados nação, só pode reforçar a probabilidade de desagregação, a prazo, da
União.
Entretanto, a política económica da zona euro
continua a manifestar incapacidade para enfrentar a crise com soluções
sistémicas, teimando em olhar os problemas país a país e persistindo na
exigência de cumprimento de remédios errados, como as regras do Pacto
Orçamental. É bem sabido que os excedentes orçamentais primários que seriam
necessários para o cumprir são impossíveis de alcançar, mas tal não parece
suficiente para quebrar o tabu do financiamento monetário da dívida…até que a
situação económica e social atinja, em alguns casos, o extremo da degradação.
Não se ignora que as medidas que urge tomar
para equilibrar a zona euro e assegurar a sua viabilidade futura implicam um
grau superior de integração política - o que parece cada vez mais difícil de
promover.
É, em parte, por este motivo que quem as
apresenta se auto limita de tal forma que a probabilidade de serem eficazes é
diminuta.
Um exemplo recente encontra-se na iniciativa
de um grupo de mais de 20 economistas (Resiliency
Authors) que publicou as suas propostas sob o título “Making the Eurozone more resiliente: What is needed now and what can
wait?”[1]).
Desde logo, os autores manifestam a sua
confiança em que,” se tudo correr como previsto, a prosperidade económica será
restaurada, o desemprego diminuirá e os países da periferia recuperam a
competitividade”.
Mas a interrogação que colocam é a de saber
se há capacidade de resiliência face a choques adversos que é provável
ocorrerem nos próximos meses.
Como o aprofundar da integração política é
extremamente difícil com o actual clima político, limitam-se a ”identificar o
que deve ser feito em breve e o que seria bom fazer mas, provavelmente, pode
esperar”.
É assim que, sobre os bancos e o sistema financeiro,
muito embora reconheçam a necessidade de um esquema de seguro de depósitos para
a zona euro e que a responsabilidade pela resolução dos bancos passe dos governos
nacionais para o nível europeu, a sua proposta é limitada a que as regras já
existentes sejam aplicadas.
A mesma timidez contamina a forma como é
abordada a questão das finanças públicas e a reestruturação das dívidas
públicas, muito embora não deixem de referir, como desejáveis, outras medidas,
tais como os euro bonds e esquemas de transferências orçamentais para países
sujeitos a choques adversos.
Num sucinto mas esclarecedor texto, Paul
Krugman[2] considera que os autores
do documento citado fazem demasiadas cedências aos “homens práticos”, enquanto
o que seria necessário, a bem da Europa, era uma boa dose de utopia.
De facto, se queremos que o “Brexit” não seja o início do desmantelar
europeu, mas antes um desafio a que é urgente dar resposta para voltar a
acreditar nos valores da EU, como dispensar o “utopian frenzy” no desenho das reformas necessárias?
[1]
Richard Baldwin, Charlie
Bean, Thorsten Beck, Agnès Bénassy-Quéré, Olivier Blanchard, Peter Bofinger,
Paul De Grauwe, Wouter den Haan, Barry Eichengreen, Lars Feld, Marcel
Fratzscher, Francesco Giavazzi, Pierre-Olivier Gourinchas, Daniel Gros, Patrick
Honohan, Sebnem Kalemli-Ozcan, Tommaso Monacelli, Elias Papaioannou, Paolo
Pesenti, Christopher Pissarides, Guido Tabellini, Beatrice Weder di Mauro,
Guntram Wolf, and Charles Wyplosz.
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