11 fevereiro 2019

Os economistas e a previsão das crises


Conseguem ou não os economistas prever as crises? E deverão ser avaliados por essa sua (in)capacidade?

Esta questão, que volta a colocar-se dez anos depois do início da crise de 2008 está, quanto a nós, mal colocada. Da mesma maneira que dificilmente se poderá chamar ciência à Astrologia, também não serão os dotes divinatórios que poderão conferir natureza científica à Economia. O método de investigação científica, baseado na observação e no estabelecimento e discussão de hipóteses, permite delinear conjecturas diversas cuja probabilidade de verificação depende do conhecimento e competência do investigador, da sua capacidade de carrear a multiplicidade de potenciais variáveis explicativas, de testar a falsificabilidade das teorias em que se baseia, de avançar por tentativa e erro… (Nunes 2015)[1]. Estas, sim, são as capacidades e competências a esperar de um economista, às quais deverão associar-se o respeito absoluto pela Ética, a responsabilidade social que assume pelas opiniões que emita e pelas decisões em que eventualmente participe.

Vem isto a respeito do importante artigo de Nouriel Roubini, de título A Mixed Economic Bag in 2019, acessível através do site Project Syndicate[2]. Um dos aspectos que primeiro se destaca da sua leitura é a ausência de qualquer afirmação categórica relativa à ocorrência, ou não, de uma nova crise com início em 2019, embora considere ser baixa a probabilidade de ocorrência de uma crise mundial. Em vez disso, assistimos a um exercício muito completo de discussão de hipóteses com base numa multiplicidade de factores potencialmente explicativos, criteriosamente escrutinados. Conduzindo a cenários contrastáveis e bem fundamentados, a análise de Roubini tem a capacidade de relacionar determinantes cuja ocorrência é, ou pode ser, referida à escala global. Vejamos alguns aspectos.

Na economia americana, o papel recente do Federal Reserve Bank (Fed) tem sido decisivo no aliviar de alguma tensão nas condições financeiras, mantendo-se o desemprego baixo e controlado. Será isto sustentável? Se o conflito comercial sino-americano se resolver a favor das exportações chinesas e, através delas, conduzir a uma desvalorização salarial ainda maior na economia americana, será de prever uma quebra significativa do mercado interno norte-americano. Mas se o desfecho for o contrário, permitindo uma revalorização salarial mesmo que mínima, o Fed não deixará de intervir para antecipar um eventual aumento da inflação. Ao mesmo tempo, as consequências de um ou outro cenário para o agravamento da desaceleração da economia chinesa serão totalmente distintas. Os impactos no crescimento global far-se-ão sentir também, em qualquer dos casos. Para já não referir as consequências da disrupção sustentada, a nível político e administrativo, da governance norte-americana.

A União Europeia (EU), por sua vez, absorverá aqueles impactos globais com mais ou menos intensidade conforme conseguir resolver as suas profundas contradições internas e, desde logo, as de natureza política em Estados Membros como a França, a Itália e a Alemanha, bem como os seus efeitos nas eleições para o Parlamento Europeu. Um Brexit desgovernado minará ainda mais a confiança externa na EU; e se Trump decidir estender a guerra comercial também à Alemanha, não será só este país mas toda a Europa que sofrerá as consequências. 

E o que poderá advir ao nível dos preços e (des)valorização dos stocks de petróleo, em consequência da sobreprodução, da falta de acordo entre os principais produtores, da crise na Venezuela? E como sofrerão as economias emergentes as consequências de toda esta instabilidade? Será que a crise global na banca e sistema financeiro permitirão que venha a verificar-se um nível mínimo de articulação após a fase de saneamento inevitável? Todas estas questões são sopesadas por Roubini, que conclui:


There may be enough positive factors to make this a relatively decent, if mediocre, year for the global economy. But if some of the negative scenarios outlined above materialize, the synchronized slowdown of 2019 could lead to a global growth stall and sharp market downturn in 2020. 




[1] Nunes, A. (2015). Ciência e Objectividade. Filosofia da Ciência – Crítica, 22 de Novembro de 2015, https://criticanarede.com/anunescienciaeobjetividade.html .

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