06 dezembro 2015

Desigualdades, Poder e Políticas Públicas



Foram muitas as pessoas que tiveram o privilégio de assistir, na Gulbenkian, à Conferência de Joseph Stiglitz que, mais uma vez salientou um dos aspectos mais negativos que afectam as economias mundiais, ou seja, o da crescente desigualdade de rendimentos, de riqueza e de oportunidades.

O exemplo da extrema desigualdade que existe nos EUA serviu para ilustrar o impacto de erradas escolhas de política, em particular desde a década de 1980, quando ganhou terreno a ideia de que bastaria ocorrer crescimento económico para que todos dele beneficiassem.

Assim se justificou a entrega, sem reservas, às forças do mercado, as quais, aproveitando a globalização desregulada, conduziram a tais níveis de desigualdade que não permitem a ninguém ficar indiferente.

O que está em causa, segundo Stiglitz, é o impacto das políticas adoptadas a nível macro económico sobre o poder do mercado e o poder de negociação dos diferentes grupos sociais.

A identificação dos principais mecanismos geradores de desigualdade é um passo necessário para servir de base a uma agenda abrangente, em vez de medidas pontuais, que produza alterações nas leis de trabalho, nas políticas orçamentais e na política monetária.

Infelizmente, foi necessária a evidência empírica para que o erro de ideias simplistas sobre as desigualdades fosse reconhecido por largos sectores da sociedade e economistas conceituados estão a aprofundar a análise neste domínio, dando relevo às sinergias que podem ser ganhas pela adopção de medidas convenientemente articuladas.

Por exemplo, Robert B. Reich, que, em tempos, considerava a crescente desigualdade um problema técnico, explicável pelas alterações tecnológicas exigindo elevadas qualificações, mas com solução tecnocrática através da expansão do sistema de ensino convencional e da requalificação, alterou o seu ponto de vista ao admitir, em livro recente, com o título “ Saving Capitalism: for the Many, Not the Few”, a responsabilidade que cabe às decisões políticas.

Segundo Reich, citado por Paul Krugman em” Challenging the Oligarchy”, artigo publicado em The New York Review of Books, há boas razões para acreditar que os elevados lucros de certas empresas financeiras, reflectem o abuso de informação privilegiada , e tal só foi possível porque foi tomada a decisão política de não o regular eficazmente.

De facto, a questão central é o poder das grandes empresas para influenciarem as decisões políticas a seu favor, daí resultando a concentração dos rendimentos num pequeno número, numa espiral imparável de desigualdades.

Uma questão talvez menos estudada é a inter-relação que existe entre a concentração do rendimento e as instituições do mercado de trabalho, pelo que é interessante lêr o estudo de duas economistas do FMI, Florence Jaumotte e Carolina Osorio Buitron, publicado sob o título “Union Power and Inequality” em Economist’s View, a 22 de Outubro 2015.

As autoras basearam-se em dados de 20 economias desenvolvidas (Portugal incluído) e concluíram que existe uma forte relação de causalidade entre a menor densidade sindical (proporção de trabalhadores sindicalizados) e a parcela de rendimento apropriada pelos 10% mais ricos, sendo certo que o declínio da densidade sindical explica cerca de 40% do aumento médio dos rendimentos apropriados pelos 10% do topo. Assim, ao contrário do parecer mais comum, de que alterações nas instituições no mercado de trabalho afectam os rendimentos baixos ou médios, mas não afectam os rendimentos do topo, comprova-se como estes últimos reforçam a sua posição quando a sindicalização enfraquece.

Como conclui este estudo, só numa base país-a-país se pode decidir sobre reformas das instituições do mercado de trabalho, tendo em atenção a forma como funcionam e possíveis impactos sobre outros objectivos políticos, tais como a competitividade, o crescimento e o emprego. ”Enfrentar as desigualdades crescentes, exigirá provavelmente uma abordagem multi-direccionada, incluindo a reforma tributária e políticas para reduzir excessos associados á desregulação do sector financeiro”.

Sem querer dar como certo o resultado, parece-nos que estão a ser dados passos para que na agenda de futuras reformas estruturais, se inclua também o objectivo de combater o desequilíbrio de poder que tem alimentado as crescentes desigualdades.  

Sem comentários:

Enviar um comentário

Os comentários estão sujeitos a moderação.