07 fevereiro 2022

“Estado da Educação 2020 – Edição 2021” –análise e recomendações particularmente ricas

 O Conselho Nacional de Educação (CNE) divulgou há poucos dias o relatório anual sobre o Estado da Educação, respeitante ao ano 2020

O relatório segue em parte uma estrutura idêntica aos relatórios anteriores, procedendo a uma análise cuidada de indicadores relativos a cada nível de ensino e recursos humanos, físicos e financeiros, quer em termos absolutos quer relativamente à Estratégia Europeia (EE) e aos Objectivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). Por outro lado, inclui como habitualmente a análise aprofundada e os contributos específicos dos especialistas convidados. No entanto, e como seria de esperar, dedica uma parte substancial do seu conteúdo à consideração detalhada dos efeitos da pandemia  e este aspecto merece destaque pela sua relevância e carácter inovador.

Assim, a análise dos impactos da pandemia sobre o sistema educativo é integrada por três tipos de componentes:

- os estudos realizados pelo CNE;

- um conjunto importante de testemunhos de pais, alunos, professores, psicólogos e outros agentes dos sistema educativo sobre as suas vivências da pandemia;

- o reforço e complemento das Reflexões dos especialistas com um enfoque especialmente dirigido à pandemia, lições que a mesma tornou possíveis, as formas de adaptação postas em prática e, muito especialmente, uma reflexão sobre as previsíveis consequências futuras do COVID-19.


Daqui resultou, em nossa opinião, um conteúdo de grande riqueza analítica e muito marcado pela abordagem, aqui inovadora, da análise holística do processo e dos agentes educativos, em que as dimensões emocional, mental, psicológica e motivacional, bem como os efeitos da pandemia sobre as mesmas, não se viram secundarizadas, antes pelo contrário, face aos indicadores de aprendizagem em sentido estrito. 

É claro que é feito um balanço, do ano e da década, relativamente aos ganhos em aprendizagem e seu confronto com as EE e os ODS. Ficamos a saber, designadamente, que no que respeita à frequência do pré-escolar, à idade de início do ensino básico e respectiva frequência e ao objectivo de redução do abandono escolar, as metas daquelas Estratégias e Objectivos foram superadas, ficando a 4 décimas dos 40% da população entre os 30 e os 34 anos com o ensino superior que se tem como objectivo e que é na formação da população adulta que mais aquém ficámos do cumprimento dos objectivos.  

No entanto, é na análise qualitativa de âmbito sociológico que o relatório contribui com mais valor acrescentado. Quando conclui que as diferenças socio-económicas se aprofundaram, ou pelo menos “se tornaram mais visíveis”. Dispor ou não de bons equipamentos e recursos de estudo em casa, a qualidade desta e as possibilidades de estudo que permite, a existência ou não de pais com competências e disponibilidade para dar apoio de rectaguarda mas também motivacional e psicológico, fazem toda a diferença. Quando ao salientar a relevância da “brecha digital” no reforço da desigualdade entre alunos… o acesso diferenciado a dispositivos digitais, as diferenças de conectividade e robustez da rede, por razões económicas ou em função do território, e na criação e reforço de nichos territoriais a que haverá que dar toda a prioridade. Quando destaca as consequências, a curto mas também a médio e longo prazos, da perda de oportunidades de socialização, aspecto mais crítico segundo directores das escolas e professores, da tendência para o isolamento e do sedentarismo de crianças e jovens e as inevitáveis repercussões de tudo isto na saúde física e mental de umas e outros. E, ainda, quando recomenda vivamente a necessidade de serem postos em prática apoios sociais compensatórios, medidas de detecção precoce e de intervenção diferenciada na dificuldade também socio-económica, de uma pedagogia motivacional que valorize o saber-fazer …

Reconhecendo embora a dificuldade em mudar a “cultura de escola”, estabelece-se como imprescindível 

“O reconhecimento da necessidade de bem-estar físico e emocional de alunos, professores e técnicos – o que implicará a contratação de psicólogos e técnicos de serviço social com tempo suficiente para o desempenho preventivo e não apenas remediativo, a acentuação destas componentes na formação de todos os professores e uma maior escuta e participação de todos, em especial dos alunos.”

As recomendações estão feitas. Que as mesmas não caiam em saco roto!


Margarida Chagas Lopes

Graça Leão Fernandes





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