06 junho 2013

Não podemos ignorar a desigualdade crescente

A frase escolhida para título deste “post” pertence ao Secretário-geral da OCDE, por ocasião do lançamento, em 2008, do relatório “Growing Unequal? Income Distribution and Poverty in OECD Countries”.

Já então havia evidência da gravidade das desigualdades de rendimento que estavam a resultar de orientações erradas da política económica, sobretudo a partir da década de 80.

Ao mesmo tempo, reconheciam-se as limitações de confiar apenas na fiscalidade e nas medidas de apoio social que estavam a ser postas em prática para combater a pobreza e as desigualdades, ou seja, o equivalente a atacar os sintomas e não a causa da doença.

Passaram mais de 5 anos e entretanto, o que mudou?

A OCDE publicou, em 2011, novo relatório ( “Divided we stand - Why Inequality Keeps Rising”) que dá conta de como as desigualdades continuaram a aumentar, mesmo nos países em que elas eram habitualmente mais reduzidas.

E agora, em Maio de 2013, a OCDE, novamente, volta a tratar o tema trazendo-nos a sua análise do que foi a evolução da pobreza e das desigualdades ao longo do triénio 2007- 2010, portanto já em plena crise.

O título deste recente relatório, só por si, é elucidativo do agravar daqueles problemas: “Crises squeezes income and puts pressure on inequality and poverty”.

Não sendo já novidade para ninguém, constata-se aí que a crise conduziu a uma redução dos rendimentos do trabalho e, em menor grau, do capital, a qual só não foi mais acentuada por efeito da actuação do Estado Social, através dos impostos e das transferências de rendimentos. De facto, sem entrar em linha de conta com tais medidas, a desigualdade gerada pelo mercado na OCDE aumentou, ao longo dos últimos 3 anos, mais do que nos 12 anos precedentes.

É certo que as medidas de estímulo económico adoptadas, correctamente, em contraciclo, permitiram aliviar parte da dor. Mas, sintetiza a OCDE, como persiste e se agrava a crise económica e, sobretudo, a crise de empregos, ao mesmo tempo que aumenta a pressão para a consolidação orçamental, é crescente o risco de serem os mais vulneráveis na sociedade aqueles que mais serão atingidos.

O aprofundar das desigualdades de rendimento é um fenómeno de longo prazo, nem tudo é explicável pela crise. Mas é muito significativo que elas aumentem sobretudo entre os países que maiores quebras de rendimento médio registaram, como sucedeu, nomeadamente, na Irlanda, Espanha e Grécia.

Depois de referir que as políticas de consolidação parecem ter sido concebidas, em geral, de forma a reduzir as desigualdades, o que a OCDE observa no triénio, e no caso português, é uma redução da desigualdade no rendimento disponível . Com efeito, a descida do rendimento do mercado (isto é, antes das transferências sociais), não se terá traduzido num agravamento das desigualdades de rendimento disponível das famílias, em consequência do impacto daquelas transferências.

Esta constatação merece alguns breves comentários:

Portugal tem uma muito desigual repartição de rendimentos, (na União Europeia, só a Letónia e Lituânia têm pior classificação), pelo que, por razões de ordem ética e, também, de racionalidade económica, uma prioridade das políticas públicas deveria ser combatê-la. A tomada de posição do Grupo Economia e Sociedade (GES), tornada pública em Fevereiro de 2013 e que está disponível neste blog, é bem esclarecedora da urgência em superar preconceitos, reavaliar prioridades e orientações políticas.

O referido não agravamento das desigualdades no rendimento disponível das famílias, no trénio em análise, pode, neste contexto, ser interpretado com algum optimismo?

Infelizmente não, pois o que sabemos sobre a evolução das desigualdades em Portugal, em especial sobre os últimos anos, não é animador.

Como se lê em texto do GES, a publicar, é certo que “Ao contrário do que aconteceu nalguns países industrializados, as desigualdades de rendimento dos portugueses reduziram-se entre 1993 e 2009, voltaram a subir em 2010, já em plena crise económica e financeira”. E, certamente, depois de 2010, a sucessiva compressão dos rendimentos, reformas no mercado laboral e a redução dos apoios sociais só terão agravado as desigualdades!

Também, segundo a mesma fonte, a taxa de pobreza em Portugal recuou até 2009, mas as medidas de austeridade fizeram retroceder a linha de pobreza, ou seja, desce o valor do rendimento que leva a classificar alguém como pobre...

Se reduzir as desigualdades e combater a pobreza fosse um objectivo assumido das políticas públicas, não se contentariam os decisores com medidas meramente paliativas de efeitos adversos do funcionamento dos mercados... e estaríamos em 2013 a analisar dados estatisticos completos e actualizados que espelhariam todo o impacto negativo das chamadas medidas de ajustamento.

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