Numa manifestação de grande preocupação – não
fosse acontecer que as medidas restritivas adoptadas no passado caíssem no
final de 2015 – depressa o Governo aprovou legislação para as manter no próximo
ano.
Assim, mais uma vez se insiste na ideia da
austeridade como único caminho para sair da crise, numa obstinação cega perante
o que, na verdade, têm sido as consequências dramáticas da sua aplicação.
Apesar dos quatro anos já vividos continua a
ser usado o argumento da excepção para não respeitar direitos fundamentais e
difunde-se a ideia falsa de que se fosse posta em causa a austeridade os
resultados seriam catastróficos e teriam sido em vão os sacrifícios feitos.
É particularmente grave que se procure
alimentar a confusão, na opinião pública, entre uma desejável condução prudente
das políticas públicas com a sistemática desvalorização daquilo que mais se
espera de uma governação responsável, ou seja, a promoção do bem estar e da
coesão social, assim como a
sustentabilidade do desenvolvimento futuro.
Repetidamente tem sido chamada a atenção para indicadores
preocupantes que apontam para que o impacto a longo prazo da austeridade pode
vir a revelar-se muito maior do que alguns querem fazer crer: uma população
activa a ser erodida pela emigração, o desinvestimento na educação e na saúde,
o desemprego persistente a nível elevado com grande peso do desemprego de longo
prazo e do desemprego jovem, um sector empresarial público entregue a privados
sem as cautelas devidas, um sector empresarial privado em crise, altamente
endividado.
Uma sementeira como esta não pode vir a dar
bons frutos, a não ser na imaginação de alguns, mas continua a ser defendida
por não se querer reconhecer o erro cometido.
Como ignorar os avisos que têm sido feitos
por cientistas sociais – economistas mas não só – de que é urgente inflectir as
políticas de modo a não hipotecar irremediavelmente o futuro? Ou a deriva para
extremismos perigosos que por toda a Europa ganham força? Ou o facto de que
mesmo países que pareciam ter recuperado
da crise não alcançaram o crescimento que tinha sido projectado e estão ainda
mais pobres do que no início da crise?
Um estudo recente de Summers e Antonio Fatás[1] referido por Paul Krugman
em “Austerity’s Grim Legacy”, na sua coluna de 6 de Novembro de 2015 no The New
York Times on-line, vem reforçar a conclusão de que existe uma correlação forte
entre a intensidade da austeridade numa economia em depressão reduz a
capacidade de crescimento a longo prazo. E, para além dos postos de trabalho e
do produto perdido nos primeiros anos de aplicação das políticas de austeridade,
está-se a trilhar um caminho de auto destruição, mesmo em termos puramente
orçamentais, pois as economias feridas verão reduzidas as suas receitas fiscais
futuras ao ponto de se depararem, a prazo, com uma dívida muito mais elevada do
que aquela que teriam de incorrer se não tivessem feito os cortes iniciais.
.
Se outras motivações não existissem,
poderíamos hoje admitir que, perante todas estas evidências, os responsáveis
estariam dispostos a uma reapreciação das políticas austeritárias. Infelizmente
não é esta a situação entre nós.
Resta esperar que o desejo de mudança
expresso democraticamente pela maioria possa vir a encontrar uma via de
concretização internamente e no seio da União Europeia.
[1] The permanent effects of fiscal
consolidations – Antonio Fatás e L.H. Summers publicado na Revista Social
Science Research Network
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