Estamos a
viver um tempo de desesperança. Todos se interrogam: para onde é que isto nos leva? As respostas não se encontram e já
se começam a desejar soluções extremas, que poderão pôr em causa o
funcionamento democrático da sociedade, embora também se diga que elas
serviriam para repor o perdido funcionamento democrático. Somos levados, por
isso, a constatar que, na sequência das medidas de política que têm vindo a ser
tomadas pelo Governo, desde a chegada da troika, a coesão económica e social entre os portugueses tem vindo
a ser corroída de forma inexorável.
O Orçamento
de Estado (OE) sempre tem constituído um instrumento importante de explicitação
das opções de política económica do Governo, enquadrador e orientador das decisões
dos outros agentes económicos. O OE era e deveria continuar a ser tomado como um fator de mobilização e
de promoção do crescimento e do desenvolvimento.
Assistimos,
hoje, à completa inversão das expetativas de todos os que de modo direto, ou
indireto cruzam as suas decisões com as do Governo. Em lugar de transmitir
energia positiva às decisões dos agentes económicos, o OE transformou-se num
seu travão, que provoca toda a espécie de derrapagens e não fornece qualquer orientação quanto ao futuro. Não há
um quadro previsível de estabilidade de política económica e a atitude mais
corrente é a de todos se perguntarem, "o que é que poderá, ainda, vir aí".
As razões
deste desnorte são conhecidas. Crê-se que a mãe de todos os nossos males é o deficit das contas públicas, ignorando
que este é uma consequência do comportamento de muitas forças da economia, que
não apenas o do Governo. Para além disso, omite-se, voluntariamente, que se o deficit, numa perspetiva de curto prazo,
pode ser condicionado negativamente pelo crescimento das despesas, ele pode e
deve, também, ser reduzido, e com maior sustentabilidade, através do aumento das
receitas.
Com a sua política
económica, o Governo surge como um monstro que suga todas as energias da
economia e da sociedade. Acontece que essas medidas de política,
sendo opção e convicção do Governo são, também, o resultado de orientações de
poderes vindos do exterior. Contrariamente ao que se poderia pensar, as opções
tomadas não o são a contragosto, são antes a consequência de uma convicção
segundo a qual, para dar um futuro ao país, há que começar por destruir o Estado Social e, por essa via, o
próprio Estado, com a configuração que adquiriu após o fim da 2ª Guerra Mundial
e de que nos orgulhamos.
O regime de
protetorado a que temos vindo a estar sujeitos em vez de ser repelido,
torna-se, pelo contrário, desejado. Não surpreende, assim, que o monstro em vez
de ser repelido seja, antes, acarinhado e ouvem-se, até, expressões do tipo
“meu querido monstro”.
Vale a pena
recordar que há pouco mais de uma semana o presidente da Comissão Europeia não
teve pejo em afirmar que “haveria caldo
entornado em Portugal, caso se verificasse instabilidade e falta de
responsabilidade de todos os órgãos de soberania”. Referia-se, com isso, ao comportamento do Tribunal Constitucional. Até onde poderá ir a ameaça?
Esquecem-se,
no entanto, os que se deliciam com tais afetividades com as forças do protetorado
que, não há muitas décadas, atitudes semelhantes foram classificadas de
“colaboracionistas” com as forças invasoras, com os resultados que se conhecem.
Também hoje começa a tornar-se oportuno afirmar “Resistência precisa-se”.
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