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03 novembro 2021

Educação: efeitos da COVID e a Agenda 2030

 Como é habitual neste tipo de análises, há pelo menos duas perspectivas em presença, a do copo meio cheio e a sua simétrica.

Tomem-se como referência os indicadores da Agenda 2030 para a Educação, ou, mais rigorosamente, os Objectivos do Desenvolvimento Sustentável estabelecidos pela ONU com referência àquela data. Com base neles e para a informação entretanto disponível, é positivo constatar-se que parece que em quase nenhum dos casos a pandemia terá contribuído para retrocessos: não se agravou, antes pelo contrário, o abandono precoce de educação e formação, aumentou a percentagem da população entre os 30 e os 34 anos com o ensino superior completo, qualquer destes indicadores revelando um melhor desempenho para o sexo feminino. Também aumentou a proporção das crianças entre os 3 e os 6 anos a frequentar a escolaridade. Mas a percentagem de adultos em educação e formação, indicador em que nos situamos muitíssimo aquém daqueles Objectivos, piorou. E este aspecto é de fundamental importância. Entretanto, pouco se pode dizer sobre os efeitos da pandemia no insucesso dos adolescentes de 15 anos na leitura, matemática e ciências, dado não haver dados do PISA para todos os anos. E o mesmo sucede relativamente às competências digitais da população, se bem que o indicador relativo à percentagem de utilizadores da internet, uma possível proxy, também tenha aumentado.

Duas notas se tornam necessárias: a primeira delas é que a informação quantitativa disponível só vai até 2020. Para se inferir dos possíveis efeitos da COVID – 19 é, portanto, indispensável continuar a seguir a informação estatística à medida que fique disponível. A outra nota pode colocar-se sob a forma de questão:

 

- Será que os decisores políticos estarão a dar a devida importância à educação e formação da população adulta? Que temos ouvido nós a este respeito? Praticamente nada, ao contrário do que sucedeu, designadamente, com a educação de infância.


Este aspecto deveria constituir uma das principais prioridades da educação em Portugal, por várias razões. Em primeiro lugar porque, como bem sabemos, o nosso País arrancou tarde para a escolarização da população e para a promoção do seu acesso a níveis mais elevados de estudos. Por isso, as gerações mais antigas exibem níveis de escolaridade muitíssimo inferiores aos dos grupos etários correspondentes na grande maioria dos outros países europeus. Por outro lado, daquele aspecto decorre que o desnível educacional entre gerações é bastante amplo entre nós, o que dá lugar a problemas graves como o da falta de coesão intergeracional. Pouca qualificação e idade elevada constituem, por sua vez, um binómio explosivo do ponto de vista da aquisição das competências cada vez mais exigidas pelo mercado de trabalho, como as digitais, mas não só. E, assim, é a exclusão do trabalho, a escassez de rendimentos e, muito provavelmente, a pobreza, o destino que espera boa parte desta população.

 

Talvez seja de interesse mostrar de forma gráfica a situação do País relativamente aos objectivos da Agenda 2030, de modo a tornar mais evidente o caminho que falta percorrer:


        Figura 1: Os Objectivos da Agenda 2030 e a situação de Portugal(*)


                           Fonte: PORDATA

                                (*) Os dados para Portugal são relativos a 2020 para todos os indicadores, à                                                                                         excepção dos correspondentes às competências do PISA  e Digitais.


Importaria finalizar com dois sublinhados. Relativamente às competências em literacia, numeracia e cultura científica (PISA), o gráfico parece mostrar uma situação vantajosa para Portugal, parecendo já ter atingido o objectivo... mas atenção: aqui, tal como no abandono precoce de educação e formação,  pretende-se que diminua e não que aumente o valor do indicador, i.e., a percentagem de população de 15 anos que não atinge aquelas competências nos níveis mínimos se torne o menor possível.  O segundo aspecto digno de menção é o dos indicadores que revelam os maiores desvios de Portugal face àqueles objectivos: o das competências digitais básicas e, muito especialmente, o relativo à educação e formação da população adulta, já atrás referido. Os números são eloquentes.

 

Para quando a prioridade a esta questão?

 

5 comentários:

  1. Importante chamada de atenção para as potenciais consequências da desatenção à educação de adultos numa sociedade demograficamente envelhecida e envelhecendo: perda de coesão intergeracional, desfasamento digital dos mais idosos e consequente desadaptação do mercado de trabalho que por sua vez arrasta perda de rendimento.

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  2. Respostas
    1. Ainda ao José Osório...
      Evidentemente que estas consequências estão e irão contribuir para um agravamento ainda maior da desigualdade social no nosso país, aspecto central na regulação de uma sociedade democrática...

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  3. Há muitos anos lembrei "baixa literacia: o trabalho também é culpado" e que isso se devia a organização e processos de trabalho pouco desafiantes de competências. O comportamento de grande parte das empresas (não sei qual a percentagem) parece ter sido pouco favorável a acções de formação contínua, mas o desperdício de competências,nomeadamente digitais, é um travão a uma reindustrialização inovadora e "acrescentadora" de valor.

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  4. Muito obrigada por ler e comentar, Cláudio Teixeira. Desta vez não fui ver as estatísticas da formação profissional mas, como diz, a componente formação contínua na formação de adultos é crucial. É um bom desafio para voltar a actualizar essa informação. Por outro lado, temos a questão crucial da formação dos gestores que aqui se prende também...

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