Páginas do Blogue

18 novembro 2021

Saúde: como estávamos antes da pandemia?

Antes de mais, convirá dizer que nos interessa analisar mais directamente o Serviço Nacional de Saúde (SNS), entendido enquanto instrumento fundamental de promoção do acesso à Saúde para toda a população. Ou que assim deveria ser, numa sociedade democrática, já que a componente privada, ou público-privada, do sector da Saúde apenas se torna acessível a quem pode pagar.

Uma das formas que temos de ensaiar um diagnóstico da Saúde em Portugal antes dos impactos da pandemia procede à sua comparação com os Objectivos do Desenvolvimento Sustentável – Agenda 2030. Mas como sucede com outros daqueles Objectivos, e ao contrário da Educação, não existem para a Saúde metas quantificadas relativas à Agenda 2030. Para muitos indicadores nem sequer existem médias calculadas para a EU, dada a falta de harmonização de critérios. Por isso, teremos em muitos casos de comparar a situação em Portugal com a de outros EEMM com os quais nos comparamos frequentemente.

Uma breve análise dos principais indicadores de evolução temporal do SNS é, só por si, elucidativa.

A primeira constatação é a do diferente andamento da execução orçamental global em Saúde, per capita, que cresce sempre desde 2015 e da evolução, também per capita, da execução orçamental no SNS, que decresce a partir de 2018, como pode ver-se na Figura 1:

Figura 1. Evolução das Despesas Públicas em Saúde (per capita)



                                            Fonte: PORDATA.

Aparentemente, o SNS começou então a ver diminuir o seu peso per capita no global do financiamento público ao sector da Saúde.  Porque terá isto sucedido, é uma questão que é fundamental esclarecer.

Também importa analisar o comportamento dos Recursos Humanos no sector da Saúde, em geral e no SNS. Tanto no sector da Saúde como um todo como no SNS, o número de médicos tem vindo a aumentar desde 2015. No entanto, aquele aumento no SNS tem sido muito mais atenuado do que no total do sector. É um facto bem conhecido do senso comum e que a análise numérica ajuda a confirmar (Figura 2):

Figura 2: Evolução do Número de Médicos por 100,000 habitantes – Global e SNS

                                                      Fonte: PORDATA            

 Se considerarmos outros indicadores de oferta dos cuidados de Saúde, como o relativo à evolução do número de hospitais gerais no SNS, constataremos uma situação ainda mais dramática (Figura 3):

Figura 3: Evolução do Número de Estabelecimentos – Hospitais Gerais – no SNS

                                            Fonte: PORDATA

Ou seja, esta breve análise, pese embora a sua simplicidade, mostra-nos de forma bem evidente que, ainda antes da pandemia do COVID-19, se vinha já a assistir a um significativo desinvestimento no SNS por parte do Estado. Desinvestimento que, por certo, estaria entre os principais factores desmotivadores de médicos e outro pessoal de Saúde para exercerem no SNS.

Estes factos não serão alheios ao desnível significativo em que o País se encontra face à média da EU quanto ao Objectivo “Anos de Vida Saudável à Nascença”, ou seja, a idade até à qual as pessoas esperam viver sem incapacidade física e que era de 59,2 anos em Portugal face 64,6 anos na média da EU, em 2019.

Também do ponto de vista dos outros Objectivos da Agenda 2030, com excepção da prevalência do tabagismo, nos encontramos em geral em situação bastante pior relativamente a outros dois países com os quais é habitual compararmo-nos, a Espanha e a Grécia:

Figuras 4 e 5: Posição de Portugal, Espanha e Grécia relativamente a alguns dos Objectivos da Agenda 2030:

 

                            Fonte: PORDATA

As Figuras 4 e 5 mostram-nos o caminho que teríamos ainda a percorrer, do ponto de vista da Agenda 2030, quando nos comparamos com a Espanha e com a Grécia, especialmente no que tem a ver com a percepção que a população tem de um estado de saúde de boa ou muito boa qualidade e da “Taxa de Mortalidade Padronizada Evitável”. Este último indicador, ilustrado na Figura 5, é descrito como “o número de mortes evitáveis, por prevenção e tratamento da doença, de pessoas com 75 e mais anos, por 100 mil residentes”.

Como temos referido, tratam estes indicadores de uma breve descrição do sector da Saúde, em Portugal, antes dos impactos da COVID-19.

Que exigências, desafios e novas dificuldades se colocarão entretanto? Sendo ainda relativamente cedo para se saber, o follow up da situação tornar-se-á fundamental.


Margarida Chagas Lopes

Graça Leão Fernandes



Sem comentários:

Enviar um comentário

Os comentários estão sujeitos a moderação.