Não sou médico,
psiquiatra ou psicólogo, o que não me impede de querer acompanhar, interpretar
e qualificar o comportamento do surpreendente novo ator da cena política
internacional, que ocupa a Presidência dos Estados Unidos. Os acontecimentos
desta semana no Irão não nos permitem que possamos estar distraídos.
A necessidade de,
permanentemente, fazermos os caminhos da Paz, da concórdia e da solidariedade
não cessa de nos ser recordada pelas mais credíveis instâncias internacionais,
nomeadamente pelo Papa Francisco e pelo Secretário Geral da Nações Unidas.
Perante estes alertas, o Presidente dos Estados Unidos, com a necessidade que revela
de, permanentemente, estar presente nas grandes agências noticiosas, toma uma
atitude de desafio e surge como que querendo, voluntariamente contrariar os
consensos laboriosamente alcançados pela comunidade internacional.
Pode atribuir-se
a este comportamento alguma racionalidade? Contrariamente ao que sistematicamente
se tem vindo a dizer, eu creio que sim.
Não me parece
que possa ser suportadas a grande maioria das interpretações que temos visto
procurar explicar esse comportamento, em termos de “show off”, de comportamento
errático, de irresponsabilidade, de violação de todas as regras da convivência
internacional, de loucura, etc. Estes juízos têm como referência os normais
comportamentos no seio de uma sociedade civilizada, que necessita de gerir
interdependências. Trump está noutra galáxia.
Sendo verdade
que sempre haverá alguma razoabilidade nas apreciações antes referidas, não me
parece que elas sejam capazes de nos tirar a nossa sede de compreensão. O que
pode, então, ser acrescentado?
Entendo que há
que começar por não esquecer o percurso da vida deste personagem antes de
chegar à presidência dos EUA. Trump, depois de ter tido a responsabilidade de vários
negócios ruinosos, virou a página e tornou-se num construtor e promotor de
imobiliário, de sucesso, primeiro nos EUA e, depois, noutras partes do mundo.
Convém recordar
que o conseguiu apesar, ou talvez por causa, da sua ignorância acerca do
funcionamento do mundo complexo construído na sequência da II Grande Guerra, do
seu desprezo, ou ignorância, por uma ética em que estejam presentes os valores da Justiça e da
Paz. A única coisa que lhe importa é o seu ego. Para isso, adopta como
estratégia tudo fazer para que, a todo o momento e em qualquer lugar do mundo, poder reivindicar-se do exclusivo da “iniciativa”, ainda que para isso
seja necessário passar por cima, de todos e todas, de compromissos assumidos na
condução da vida económica e das políticas internacionais, etc.
É difícil encontrar
ente mais desprezível no mundo da convivência internacional, por muito que o buscássemos. Tudo faz de modo a
que os interlocutores se transformem em seus subordinados. Não encontraríamos
melhor representante do que mais insano se pratica no mundo dos negócios. E o
que é certo é que este comportamento encontra acolhimento em muitos dos seus
concidadãos, nomeadamente oriundos da classe média. Por isso, foram eles,
sobretudo, os maiores responsáveis da sua eleição.
Além disso, o
seu aparecimento em público é, e sempre uma demonstração da falta de cultura, da
ausência de valores, da incapacidade de articular três frases seguidas, de usar
uma linguagem que ultrapasse simples lugares comuns. Frequentemente, o seu
vocabulário parece reduzir-se a uma percentagem muito reduzida do léxico
possuído pelo resto dos seus concidadãos.
E, contudo, a
comunidade internacional parece olhar com indiferença para todas as suas diatribes. E porquê? Não será estranha a esta indiferença a circunstância dos
EUA continuarem a ser a maior potência económica, política e militar, embora se
reconheça que a maturidade das instituições da Nação americana estará em
condições de neutralizar as medidas e declarações que possam pôr em causa a paz
mundial.
Habituados que
estávamos a olhar para os dois grandes partidos institucionais dos EUA, como
garantes da estabilidade mundial, interrogo-me, hoje, como é que o partido
republicano pode acolher no seu seio um tal personagem? Certamente, porque
ainda não foi capaz de descalçar esta incómoda bota.
Para melhor
justificar o que acima vem dito recordemos alguns episódios do seu percurso
desde que chegou a Presidente dos EUA.
Mesmo antes,
ainda em campanha eleitoral, deixou marcas a sua afirmação de que só ele iria ser
capaz de tornar, de novo, a América um país “Grande e Respeitado”. O que é que
naquela cabeça isto significa? Significa, que na América, ele fala e todos os
restantes ficam calados ou comportam-se como cães de trela. Não quer dizer que se comportem imediatamente como
Trump desejaria, mas também é verdade que não ousam contrariá-lo abertamente.
Recordem-se as
suas iniciativas de puxão de orelhas relacionadas com o financiamento da Nato, as
altercações com Macron por ocasião de uma sua deslocação à Europa, qual imperador
deslocando-se aos territórios administrados por seus delegados, etc. Mas há mais: as
suas declarações acerca do futuro da União Europeia; as suas ameaças de
destruição da Coreia do Norte para pouco tempo depois declarar que o seu
ditador é, afinal bom rapaz e poderá com ele construir uma sólida amizade; o
seu atentado contra o general Soleimani, para no dia seguinte proclamar que,
afinal é possível construir com o Irão uma boa convivência.
Muitos outros casos
poderiam ser referidos, mas estes são suficientes para mostrar que a cabeça de
Trump não tem outra ambição que não seja a de mostrar que, tanto na cena nacional,
como na cena internacional, ele não tem que assumir compromissos com ninguém,
porque só ele pode ser iluminado como o grande maestro do concerto das nações.
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