Páginas do Blogue

06 abril 2016

“Conhecimento para todos”

Sob este título, o portal do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES) dá-nos conta de uma importante iniciativa (ver aqui): a da obrigatoriedade de público acesso aos resultados de projectos de investigação – publicações e dados científicos – que tenham tido origem em financiamento público. Pode ler-se no corpo da notícia:

A criação de condições e mecanismos efetivos de acesso e de partilha do conhecimento democratiza-o e contribui para a igualdade na formação e a capacitação científica, possibilitando a transferência de conhecimento e estimulando a apropriação social da ciência.

Esta decisão soma-se a outras iniciativas que o MCTES tem tomado nesta legislatura e que expressam a preocupação de promover um amplo acesso ao conhecimento, melhorar as condições da sua regulação por parte das instituições públicas e garantir, ao longo da legislatura, condições de previsibilidade e de sustentabilidade do funcionamento do sistema de ciência tecnologia e ensino superior. Estes objectivos norteiam a Política Nacional de Ciência Aberta cujos princípios orientadores nos foram dados a conhecer já em Fevereiro passado. No preâmbulo do documento em que tais princípios se expressam (ver aqui), vem escrito:

 O acesso à ciência e ao conhecimento é indispensável a uma sociedade mais informada e mais consciente do Mundo que habita, contribuindo para a tornar mais humana, mais justa e mais democrática e onde o bem-estar seja partilhado por todos.

Constitui esta uma visão diametralmente oposta à que impregnava a concepção de processo científico e de produção de conhecimento detida pelo anterior Governo e que deu lugar às desastrosas consequências que bem conhecemos: retrocesso de anos em vários domínios, bem retratado por indicadores indesmentíveis; reforço das restrições orçamentais às condições de produção e apropriação do conhecimento e da ciência, contribuindo para reforçar a sua elitização; subalternização das áreas do conhecimento e domínios científicos - como as ciências sociais e humanas - cujos resultados de investigação se prestam pouco à parceria com o grande negócio internacional; em suma, anulação das potencialidades da ciência e do conhecimento para exercerem o seu papel como factores de desenvolvimento económico sustentado e inclusivo.

Consiga esta nova forma de abordagem rodear-se das condições políticas e inter institucionais que garantam uma implementação efectiva destes princípios e medidas e estaremos, então, em presença de um novo paradigma em que o conhecimento estará, assim, ao serviço do desenvolvimento económico e social. Mas não tenhamos ilusões, os escolhos a enfrentar são grandes e desafiam a capacidade de decisão do MCTES enquanto responsável e regulador do processo de conhecimento: a transferência do conhecimento e a apropriação social da ciência, referidas na primeira transcrição, dependem muito de decisões a tomar por outros centros de decisão, como os Ministério da Educação (desenvolvimento e qualidade das aprendizagens) e Ministério do Planeamento e Infraestrururas (financiamento das políticas de inovação, por exemplo).

Conseguirá a habitual visão compartimentada das diferentes tutelas vir a dar lugar às indispensáveis concepção global e intervenção articulada e consistente?



Sem comentários:

Enviar um comentário

Os comentários estão sujeitos a moderação.