O fogo, desde
há alguns meses, alastrava a grande velocidade destruindo florestas e
habitações como, antes, nunca tinha sido visto. De repente, como que tirando o
coelho da cartola, o Sr. Governador, usando um novo produto, criado
recentemente, a nível da União Europeia, no âmbito da União Bancária, ainda antes
não utilizado e designado por “mecanismo único de resolução bancária”, fez como
que uma descarga do novo produto sobre o fogo que foi de efeito imediato,
parecendo extinguir as chamas que até aí tudo devoravam. Estou, naturalmente, a
referir-me ao fogo do BES.
Mas . . .
Mas sabe-se
pouco acerca dos riscos de reacendimento e dos efeitos do produto lançado sobre
a capacidade de regeneração da floresta. Vejamos!
Para o ataque
ao fogo estavam disponíveis, no essencial, duas estratégias: a “recapitalização”
através da utilização de fundos públicos e a “resolução bancária”, com a
mobilização de fundos privados.
A primeira
equivaleria a uma nacionalização do banco, uma vez que para garantir a boa
utilização dos fundos públicos o Estado teria que assumir a gestão do banco ou
nela se fazer representar. É conhecida a aversão que a deriva liberal tem em
relação ao controlo dos poderes públicos sobre as atividades financeiras
privadas. Daí que não espante que a opção escolhida tenha sido a da outra
alternativa.
O mecanismo
de resolução bancária, foi criado no início do ano em curso, na sequência de
intensos debates e negociações, no Parlamento Europeu (onde teve um papel
relevante o trabalho da deputada Elisa Ferreira), no Conselho Europeu, a nível
interno de alguns países (em geral com a oposição das autoridades alemãs). Nunca
antes tinha sido utilizado, nem em Portugal, nem em qualquer outro país e os
seus mecanismos operacionais ainda se não encontravam perfeitamente oleados
para poder ser mobilizados.
Este
mecanismo foi criado como forma de arredar toda a intervenção pública sobre a
atividade bancária, mesmo quando esteja em causa a insolvência da instituição e
os riscos sistémicos por ela gerados. Mais uma vez, o tal horror!
Assim, como
instrumento do mecanismo foi criado um fundo de financiamento (Fundo de
Resolução), dotado através de contribuições do sistema bancário. O mecanismo de
resolução, num fogo como o do BES, vai servir para recapitalizar a instituição
insolvente (ou parte dela) e torna-la solvável. Como os meios do Fundo de
Resolução são privados, os outros bancos, são eles que vão proceder à supervisão
da recuperação do banco intervencionado, evitando que o Estado se envolva no
assunto.
E foi este o
coelho que o Sr. Governador tirou da cartola? Não exatamente! Com efeito, o
referido Fundo, criado há pouco tempo, ainda não tinha dinheiro suficiente para
poder proceder a uma recapitalização de 4 900 milhões de euros. Só lá
estavam 400 milhões. Pode até perguntar-se se, ao ritmo a que são feitas as contribuições
bancárias, alguma vez o Fundo virá a ter os montantes adequados a que se possam
realizar, de forma eficaz, as intervenções que se revelem necessárias?
Consequência?
Como Fundo não tinha o dinheiro suficiente mobilizou-se o dinheiro daquele que
se queria ver arredado do negócio, o Estado. O dinheiro mobilizado foi no
montante de 4 400 milhões de euros que o Estado detinha como fundo de
capitalização bancária, no valor de 12 000 milhões de euros e que constituía uma parte do empréstimo da troica.
Por esses 12 000
milhões de euros e enquanto não forem amortizados o Estado paga juros.
Naturalmente que o Fundo de Resolução deverá pagar ao Estado uma taxa de juro
mais elevada do que a que é paga à troica. Já assim aconteceu com outros bancos
anteriormente intervencionados. O problema maior não é esse, mas sim o das garantias do
capital emprestado ao Fundo de Resolução. Ao que se sabe, não são nenhumas.
Pode argumentar-se
que a verdadeira garantia será o sucesso do Novo Banco e o dinheiro obtido com
a sua ulterior privatização. Pois . . . E se a coisa corre mal? E se o dinheiro
da privatização não chegar para pagar ao Estado os 4 400 milhões que foram
emprestados?
Entra o Zé a
pagar os desmandos dos banqueiros, apesar das profissões de fé de que o
dinheiro dos contribuintes estava a salvo.
Aqui
chegados, vale a pena perguntar: porque é que a solução da resolução é melhor
do que a da nacionalização? A resposta é simples: ideologia!
Pouco faltará para que se comece a gritar: privatize-se o
Estado!
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