Uma rede internacional de
jornalistas, segundo a imprensa da semana passada, fez revelações sobre as
identidades de milhares de pessoas que em todo o mundo usam os paraísos fiscais
para fugir aos impostos. Num estudo publicado há um ano, estimava-se que o
valor global dos bens financeiros, existentes em cerca de 80 paraísos fiscais, se
situava entre os 21 e os 32 biliões de dólares, ou seja, o equivalente a 15% da
riqueza mundial (Jornal Público do dia 6 de Abril). Estes bens estariam nas
mãos de 0,14% da população mundial, ou seja, 10 milhões de pessoas.
Trata-se de mais uma
informação sobre a dimensão que vêem assumindo as desigualdades de rendimentos
e da riqueza nas nossas sociedades. De facto, os estudos que têm vindo a ser
feitos, a nível mundial e europeu, dão conta de que as desigualdades de rendimentos
têm vindo a aumentar substancialmente, nos últimos anos, nos países
desenvolvidos. Nalguns países, estas desigualdades atingiriam mesmo a amplitude
registada nas primeiras décadas do século XX. Este movimento ter-se-ia
processado sobretudo durante e a partir dos anos 80, contrariando a redução
verificada nas décadas após a II Grande Guerra.
Podemo-nos perguntar sobre o
porquê do interesse por esta problemática, em plena crise económica e financeira,
para além da importância atribuída ao facto dos sacrifícios impostos pela
austeridade não estarem a ser equitativamente distribuídos por todos, contribuindo
assim para um novo ciclo de agravamento das desigualdades.
Gustav Horn e alguns outros académicos defenderam
a tese de que a desigualdade de rendimentos e a forma como este fenómeno foi
enquadrado institucional e politicamente favoreceu a actual crise financeira
mundial. Segundo eles, o aumento das desigualdades e a deterioração do poder de
compra de parcelas importantes da população terá tido efeitos negativos na
estrutura e dimensão da procura interna de cada país, uma vez que se trata de
estratos de população com uma maior propensão ao consumo. Poder-se-á até falar
de uma crise de insuficiência da procura, potenciada pelo agravar das
desigualdades.
Além disso, as respostas
políticas adoptadas para enfrentar a crise interligaram-se de tal modo que
contribuíram para ampliar os respectivos efeitos negativos. Nos Estados Unidos da América, por exemplo, foram adoptados
inúmeros estímulos à concessão de crédito à habitação, o que teve como
consequência que se tivesse verificado um desfasamento brutal entre o volume do
consumo e as possibilidades das famílias para pagarem os empréstimos. Sucede
que um país, como os Estados Unidos, onde o volume do consumo ultrapassa
largamente a produção, teve necessidade de se financiar nos mercados externos. É
aí que surge a Alemanha, onde o aumento das desigualdades e a diminuição dos
benefícios sociais foram acompanhados por uma diminuição do consumo e,
consequentemente, por um fraco crescimento da procura interna. Os bancos
alemães compensaram esta baixa, através de concessão de empréstimos no mercado
internacional, sendo directamente afectados quando a crise rebentou nos Estados
Unidos.O comportamento destes dois países, dada a dimensão das suas economias, teria
então contribuído para o agravamento da crise.
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