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27 junho 2022

As sanções contra a Federação Russa, as relações com a China e a proeminência desta última

 

Várias notícias têm vindo a dar conta de um negócio paralelo que a Rússia está a desenvolver, mais do que compensando, aparentemente, a factura das sanções impostas pelo ocidente. Assim, a Federação Russa (FR) está a vender ainda mais crude e gás à China e à Índia, esta refina o crude e, livres de sanções, reexportam para o Ocidente o petróleo e o gás aos preços que muito bem entendem. O efeito das sanções impostas à FR pela invasão da Ucrânia estarão assim a ser contrabalançadas com vantagem por esta negociata paralela. E se é um facto que a FR acaba de entrar em default, isso deve-se essencialmente à trajectória descendente que a economia russa já vinha a sofrer e que, segundo alguns autores, a está a colocar numa posição crescente de dependência face à China.

 

Num artigo recente, Albrecht Rothacher, do European University Institute, mostra como aquela dependência se vem desenvolvendo, com a FR a exportar essencialmente matérias-primas e recursos naturais, além de material de guerra desactualizado, enquanto a China abastece cada vez mais a FR de produtos tecnologicamente sofisticados, sobretudo TIC. Mas há mais. A quase totalidade das infraestruturas de fornecimento de gás e petróleo que atravessam o Cazaquistão, o Turquemenistão e o Uzbequistão são financiadas pela China, do mesmo modo que o grosso dos investimentos feitos na Sibéria, através de cujos pipelines – já existentes e planeados – a China recebe 7% do gás natural que consome. De tal modo que o Fundo da Nova Rota da Seda e a principal companhia petrolífera chinesa são já accionistas dos pipelines existentes e dos que já foi acordado estabelecer na península de Yamal… Os oligarcas russos investem no estrangeiro, mas a China soube bem “cobrir-lhes a retirada”, a tal ponto que sendo a FR o segundo maior exportador de energia à China, apenas representa 2,4% do total das importações chinesas. [1]

 

O crescimento florescente da economia chinesa presta-se, aliás, a reflexões curiosas. Considerando o problema da crise alimentar, da inflação e do efeito conjugado de ambas e da pandemia sobre o agravamento da crise económica dos “países do Sul”, Branko Milanovic diz que quem poderia ajudar, com vantagem, seria a China… Graças a uma série de anos de excedentes comerciais com os EUA, o governo chinês possui mais de um trilião de dólares em títulos do Tesouro americano, cujo retorno tem sido mínimo. Investir toda esta liquidez internamente geraria uma inflação incontrolável, a capacidade de absorção e de remuneração do investimento na presente fase da Rota da Seda são relativamente menos interessantes e a FR continuará, em princípio, a assegurar a defesa de grande parte dos troços da Rota.

Então, reflecte Milanovic[2], em vez de ter todo este montante imobilizado, não seria preferível para a China usar uma percentagem do mesmo para conceder empréstimos não condicionados aos países mais pobres em dificuldades? Poderia conceder-lhes empréstimos a médio prazo e com taxas de juro relativamente mais baixas do que as implícitas nos empréstimos condicionados do FMI ou do Banco Mundial… A vantagem económica para os “países do Sul” em dificuldade está à vista. Mas o ganho político para a China não seria de modo algum desinteressante…



[1] Rothacher, A. (2022). Russia’s quasi-colonial dependence on China. The Loop, ECPR’s Political Science Blog, https://theloop.ecpr.eu/russias-quasi-colonial-dependence-on-china/

[2] Milanovic, B. (2022). China to the Rescue? Social Europe, 27 de Junho de 2022, https://socialeurope.eu/china-to-the-rescue.

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