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06 fevereiro 2020

Podemos ter prosperidade sem crescimento?


O interesse que sempre suscita o acompanhamento da evolução do PIB, se bem que compreensível (pois esta medida está relacionada, ou condiciona, aspectos fundamentais do bem-estar, como por exemplo, o nível de emprego ou a capacidade de assegurar bens públicos ou serviços de interesse geral) ultrapassa frequentemente o que seria justificado, pois são conhecidas as limitações deste indicador.

Os maiores ritmos de crescimento do PIB de certos países ou regiões são por vezes tomados como exemplo a seguir, sem a devida ponderação dos pontos de partida, das diferentes condições económicas e sociais ou das escolhas políticas em cada caso.

Julgamos assim de saudar que as crescentes preocupações com a degradação do ambiente, bem como as manifestações de revolta pelas desigualdades económicas, estejam a contribuir para animar o debate entre economistas e outros cientistas sociais acerca do valor excessivo que é atribuído à velocidade de crescimento do PIB, em detrimento de indicadores de bem-estar social e do seu impacto sobre as gerações futuras.

O artigo de John Cassidy[1], publicado a 3 de fevereiro na Revista The New Yorker, cujo título, em tradução livre, usamos neste post, parece-nos muito útil pelo panorama abrangente que traça das ideias que têm vindo a ser apresentadas por diferentes autores sobre os limites ao crescimento: um PIB elevado pode ser insustentável, sobretudo quando já se alcançaram valores muito elevados de riqueza.

 A referência de Cassidy ao livro de Dietrich Vollrath, da Universidade de Houston, com o título “ Fully Grown: Why a Stagnant Economy Is a Sign of Success”, sendo um exemplo de como aquela questão é causa de preocupação, serve também para mostrar como o pensamento mainstreem encara as respectivas soluções.

Assim, ao contrário de outros autores que argumentam com a necessidade de políticas específicas para promover menor crescimento em defesa do ambiente ou para reduzir as desigualdades, Vollrath sustenta que, nos EUA, o abrandamento do PIB percapita resulta apenas da redução da população activa e da orientação das escolhas individuais para a procura de serviços, ideia central da ortodoxia económica. Se o mesmo suceder nas outras economias mais avançadas, atingir-se-ia, apesar do crescimento mais lento, um assinalável crescimento global do PIB até ao final do século.

 Mas será este cenário sustentável, como parece ser também a opinião dos proponentes do “crescimento verde”, confiantes na tecnologia e nas forças de mercado para possibilitar um tipo de crescimento mais limpo e menos consumidor de recursos?

A resposta de John Cassidy, encontra-se, em síntese na seguinte frase:
alinhemos ou não com este optimismo sobre a tecnologia, é claro que qualquer estratégia abrangente de decrescimento teria de fazer face aos conflitos de distribuição no mundo desenvolvido e à pobreza no mundo em desenvolvimento”.

Sendo certo que algumas medidas têm vindo a ser estudas e propostas, como por exemplo a partilha de tempos de trabalho, o rendimento básico universal ao nível da subsistência, o emprego público, etc., há que reconhecer que tal implica o recurso a impostos mais elevados, em particular sobre os mais ricos.

A dificuldade de por em prática uma política redistributiva, vencendo a resistência dos que a ela se opõem, é apenas uma parte do problema, como se pode constatar a partir do último parágrafo do texto em análise que transcrevemos:

“Finally, rethinking economic growth may well require loosening the grip on modern life exercised by competitive consumption, which undergirds the incessant demand for expansion. Keynes, a Cambridge aesthete, believed that people whose basic economic needs had been satisfied would naturally gravitate to other, non-economic pursuits, perhaps embracing the arts and nature. A century of experience suggests that this was wishful thinking. As Raworth writes, “Reversing consumerism`s financial  and cultural dominance in public and private life is set to be one of the twenty-first century`s most gripping psycological dramas”.

Estamos assim inelutavelmente no limiar de um exigente processo de transformação de estruturas e comportamentos que, queremos esperar,  conduzirá  a uma distribuição mais justa e respeitadora do ambiente.

O uso mais razoável dos recursos, actualmente desbaratados em satisfazer uma procura artificialmente alimentada por forças de mercado, torna possível a concretização de uma outra politica económica, ao serviço do desenvolvimento sustentável e inclusivo.

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