Uma das mais virtuosas iniciativas na estruturação do novo
governo foi a criação do novo Ministério da Coesão Territorial. Resta saber se, tomada a
iniciativa, daí decorrem resultados positivos e sustentáveis.
Para que isso aconteça são múltiplas as condições a
verificar, todas componentes importantes da promoção da “coesão territorial”.
Dentre elas começo por destacar, a necessidade da definição clara do que devem
ser objetivos de curto médio e longo prazo e suas interdependências.
Vem, depois, a tomada de consciência de que o verdadeiro
fundamento de toda e qualquer política territorial é o facto de os territórios terem
características diferenciadas, o que significa que a promoção do
desenvolvimento, de todos e cada um deles, exige por parte dos poderes
públicos, a tomada de medidas de política diferenciadas. Dizer isto não é o
mesmo que dizer que o desenvolvimento dos territórios apenas se faz a partir de
políticas diferenciadas; têm que ser tomadas, pelos diferentes poderes
públicos, medidas de política diferenciadas e medidas de política que o não são.
Nem só umas, nem só outras. Não é, contudo, aqui o local para explicar o que
deve ser o conteúdo de umas e outras.
Uma outra componente muito importante é a consideração de
que cada território é um organismo vivo que, dentro dos limites da unidade
territorial, deve poder desenvolver a sua vocação própria e que, por isso, não devemos
esperar mimetismos no desenvolvimento dos territórios.
Nem sempre é fácil a compreensão do significado destas
componentes por parte de um grande número de decisores políticos, o que se
compreende porque nem sempre terão tido a oportunidade de sobre estas questões
refletir aprofundadamente, como seria exigível, nem tido a lucidez suficiente
para se rodearem dos pareceres técnicos que lhes permitiriam
tomar as decisões políticas adequadas.
Criado o Ministério da Coesão e designada a sua responsável,
a Professora Ana Abrunhosa, vale a pena interrogarmo-nos sobre o que daí
podemos esperar. Creio que temos um bom princípio. A nova ministra tem passado
de reflexão nestas matérias, enquanto professora universitária e,
simultaneamente, reúne um largo conhecimento de intervenção operacional através
do exercício das funções de Presidente da Comissão de Coordenação e
Desenvolvimento da Região Centro (CCDRC).
Vale a pena, no entanto, conhecer com mais pormenor qual é o
seu pensamento sobre estas questões. Oportunamente, o Público na sua edição
de 16 de setembro recorda algumas questões importantes do seu pensamento,
retiradas de um artigo de opinião que no mesmo jornal ela publicou em 9
de setembro.
Entendo que o texto possui reflexões muito relevantes e
outras que só podem resultar de equívocos. De entre as primeiras sublinho:
1. É urgente abandonar a visão redistributiva da
política de coesão;
2. A diminuição das assimetrias regionais envolve
investimento seletivo, qualificador e capaz os recursos endógenos dos
territórios;
3. Há partes do nosso território onde não vai ser
possível recuperar população e atividade económica; contudo, isto não significa
o abandono destes territórios;
4. O princípio da Coesão Territorial na formulação
de políticas públicas tem de ser sinónimo de realçar as características de cada
território;
5. É obrigatório uma ação pública diferenciada com
os territórios, tratar de forma diferente realidades que são estruturalmente distintas;
6. A coesão territorial exige uma melhor Governação
incorporando dimensão territorial nas políticas públicas o que obriga a uma
articulação mais eficiente entre os diferentes níveis da administração . . . e entre
as diferentes políticas sectoriais.
Quanto
aos equívocos, estou em crer que eles decorrem mais de questões de formas do
que de conteúdo. A autora afirma que “há que assumir que não é possível ter a
tónica do crescimento em todos os territórios e assumir também que em porções
importantes do nosso país coesão territorial significa gerir o declínio”. É
verdade que os territórios não têm todos o mesmo destino, mas isso não
significa que os que não seguem o padrão comum devam ser tomados como territórios
em declínio, porque estar em declínio é ficar para trás na fila dos fazem a
mesma prova. Ora, não têm todos que fazer a mesma prova, porque os que são
referidos como territórios em declínio podem ser considerados como territórios
que jogam para um outro campeonato, por ex., criação de áreas de suporte, à paisagem, à floresta, à
natureza, à diversidade biológica e animal, aos recursos naturais, como a água, etc.
Evidentemente
que esta opção terá que ser assumida por toda a sociedade. Ela tem custos, mas
os custos serão mais elevados se continuarmos a injetar fundos em territórios que
têm, hoje, uma vocação diferente da maioria dos outros territórios.
Acima
refere-se, também que é urgente abandonar a visão redistributiva da política de
coesão. Estou de acordo numa perspectiva de longo prazo, mas não o estou em
situações de curto prazo em que a gestão da transição pode exigir que, temporariamente,
continuem a existir políticas de redistribuição.
Finalmente, é referido que “há partes do nosso território
onde não vai ser possível recuperar população e atividade económica”. Também
aqui discordo. A atividade económica deverá continuar a ser promovida, o que
não pode ser promovido é a atividade económica com características idênticas às
da actividade que vinha sendo incentivada anteriormente.
Para terminar, uma palavra
quanto à alimentação da demagogia. Como reação ao texto que Ana Abrunhosa
publicou, um outro autor entendeu reagir com um texto
de contestação. Neste enquadramento, não lhe atribuo qualquer relevância e
entendo que apenas pode ser entendido no âmbito de pura esgrima política.
* Este texto foi também editado no jornal Público,
“on line” em 23-10-19
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