Esta afirmação foi, recentemente, assumida pelo Parlamento Europeu para justificar um conjunto de medidas que devem ser tomadas pela Comissão Europeia e pelos Estados membros, com base em evidência recolhida junto de variados documentos provenientes de fontes insuspeitas, como sejam a OCDE ou o FMI, as quais, por seu turno, aproveitam de estudos realizados a nível académico que vão no mesmo sentido.
Em primeiro lugar, vale a pena recordar as consequências previsíveis da desigualdade, sendo de destacar que, para além de certos limites, ela mina os fundamentos da democracia, gera o descrédito das instituições políticas e propicia o surgimento de movimentos e forças políticas de índole disruptiva. Atente-se, por exemplo, nos resultados de actos eleitorais recentemente realizados no espaço europeu.
Por outro lado, a desigualdade tem impacto negativo na sustentação da procura efectiva, no nível de emprego e desemprego, na mobilidade social e na coesão social, na capacidade de inovação e no desenvolvimento económico sustentável. Não pode subestimar-se, também, que a desigualdade e a sua vertente extrema, que é a pobreza, dão origem a custos sociais acrescidos e, indirectamente, podem causar maior fragilidade nas contas públicas.
O Parlamento Europeu reconheceu que a recente crise e os programas de ajustamento elaborados para lhe fazer face têm vindo a agravar o nível de desigualdade e de pobreza (com particular incidência nas crianças, nas mulheres e entre os trabalhadores de baixos salários e precariedade laboral), sendo necessário adoptar medidas urgentes para contrariar esta deriva, indesejável do ponto de vista, não só da justiça social, mas também do ponto de vista político e económico.
É inadmissível, por exemplo, que o ingresso no mercado de trabalho tenha deixado de ser uma garantia de acesso a uma vida digna, devido a níveis inadequados de remuneração em certas profissões e sectores e de elevadas taxas de precariedade.
É igualmente indefensável que, mesmo no período da crise, tenha aumentado, significativamente, o grau de concentração da riqueza e do rendimento no topo da respectiva distribuição.
Assim sendo, é de louvar que o Parlamento Europeu tenha adoptado uma deliberação que considera o combate à desigualdade como uma prioridade política e se tenha empenhado em procurar definir um conjunto de princípios, normas e recursos destinados a implementá-la, cometendo tal tarefa ao próximo Semestre Europeu. Em particular, destaca-se a necessidade de rever a legislação laboral no sentido de reforçar os direitos dos trabalhadores, a adopção de mecanismos de redução da pobreza, designadamente a pobreza infantil e feminina, a harmonização da fiscalidade neste domínio.
Esta declaração vem ao encontro da recente proposta da Comissão Europeia no sentido da adopção pelos Estados membros do chamado Pilar Europeu dos Direitos Sociais, considerado por alguns como algo demasiado vago para produzir o necessário resultado neste domínio, mas que é, a meu ver, um passo dado no sentido certo e que, por isso, merece ser encorajado.
Deixo a interrogação: como vai o Parlamento português reagir a estes desafios? Pelo que fui acompanhando a propósito dos debates recentes sobre o OE 2018, fico com a convicção que esta problemática não mereceu o devido destaque. Se é assim, há que cuidar de trazer a desigualdade e a pobreza para a agenda política. Também para Portugal a desigualdade é um desafio da maior prioridade.
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