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22 julho 2017

Rendimento Básico Universal



A questão, muito controversa, de poder ser instituído um Rendimento Básico Universal, tem vindo a desencadear um vivo debate acerca das suas vantagens e inconvenientes e  desperta a vontade de conhecer os resultados das experiências em curso, sobretudo nos países mais afluentes: Finlândia, França, Itália e Reino Unido.

É precisamente sobre estes quatro casos que a O.C.D.E. publicou, em Maio deste ano, um Relatório sobre os impactos de um Rendimento Básico que  seria  pago, sujeito a impostos, a todos os adultos em idade activa, em substituição da maior parte dos subsídios em dinheiro, mas sem substituir os serviços públicos de saúde, educação ou benefícios relacionados com necessidades especiais.

Os resultados nada animadores a que a O.C.D.E. chegou têm tradução expressiva no título do seu Relatório: “Basic Income as a policy option: Can it add up?

Com efeito, nele se constata não só a incapacidade do Rendimento Básico Universal (R.B.U.) para reduzir significativamente a pobreza, como seria pior a situação em que caíriam aqueles que, actualmente, acedem aos programas de protecção social. Os perdedores seriam não só os mais ricos, pois o mesmo sucederia aos mais pobres, só os grupos intermédios seriam ganhadores.

Conclui a O.C.D.E. que sem benefícios dirigidos a situações específicas, ou sem muito maiores gastos suportados por um substancial aumento de impostos, o risco de pobreza pode, de facto, aumentar, na medida em que as pessoas perdem os benefícios actuais a favor do R.B.U.

Acresce que o que vai sendo conhecido sobre os resultados do Projecto finlandês, restrito a um rendimento incondicional para desempregados, tem levantado as maiores dúvidas acerca da sua verdadeira motivação, admitindo-se[i] que esta seja o incentivo à aceitação de baixos salários e a empregos de menor produtividade. Também é importante notar que o governo finlandês, ao mesmo tempo que testava o Rendimento Básico, tornou mais exigentes os requisitos para aceder aos benefícios de desemprego, deficiências ou cuidado de crianças.

Apesar desta experiência finlandesa ser muito limitada, ela permite-nos ficar alertados para questões fundamentais do Rendimento Básico, entre as quais o risco de ineficácia no combate às desigualdades de rendimento ou no tocante à atitude das pessoas face ao trabalho e à qualidade da vida.

Preocupante é também o enfraquecimento simultâneo da rede pública de protecção social, tanto mais que, face às ameaças da insegurança, degradação ambiental e desemprego que as novas tecnologias muito acentuam, cada vez mais se exige das políticas sociais uma resposta integrada e persistente na sua aplicação.

Sendo certo que, de um dia para o outro, pode ser decretado (e também rapidamente revogado)  um sistema  R.B.U., o mesmo não é verdade para um complexo sistema de protecção social, construído ao longo de décadas e que, apesar das restrições financeiras que lhe têm sido impostas, tem jogado um importante papel de estabilizador automático em tempo de crise, defendendo a coesão social.

Reavaliar as políticas redistributivas, promotoras da igualdade e da mobilidade social, à luz da defesa dos direitos humanos, ameaçados pela mudança societal em curso, é um imperativo que se impõe se queremos salvaguardar a democracia.

Importa que sejamos capazes de o fazer com seriedade, sem esconder as dificuldades, mas sem aderir a soluções que só aparentemente são simples.


[i] Why Finland’s Basic Income Experiment Isn’t Working – by Antti Jauhiainen and Joona-Hermanni Makinen – The New York Times   July 20, 2017

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