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13 novembro 2015

A matemática, as identidades, o tempo e o caminhar a olhar para os pés (I)

Acabámos de assistir a tempos de intenso e crispado debate político e, se nada mudar, só poderemos esperar que continue e, porventura, se agrave. O debate tem-se caracterizado, a maioria das vezes, pela falta de rigor, pela vacuidade e pela falta de respeito mútuo, entre os diferentes intervenientes, o que só pode contribuir para a descredibilização da democracia.
Há que inverter esta situação, porque o debate sereno e refletido no Parlamento, ou fora dele, é um elemento constitutivo das sociedades modernas, progressivas e geradoras de bem-estar. Não credibilizar o debate político, pela falta de rigor no que se afirma e pela ausência de respeito pela pessoa do outro, só nos pode conduzir a situações e regimes, que usam como sustento a limitação das liberdades e a violação dos direitos fundamentais da pessoa humana.
No título faço apelo à matemática, não porque para aprofundar a democracia necessitemos de possuir, todos, conhecimentos aprofundados de matemática, mas porque o fazer política, tendo em conta algumas das regras básicas da matemática, teria como consequência uma sua maior dignificação.
São múltiplas as definições de matemática e não é por isso que ela perde a sua substância. Uma das mais generalizadamente aceites é a de que se trata da ciência do raciocínio lógico e abstrato. Ora, precisamente, uma das características mais presentes no debate político, hoje, em Portugal, mas não só, é a ausência de raciocínio lógico, isto é, a ausência de pensamento estruturado de acordo com as regras da lógica. O raciocínio pode ser dedutivo ou indutivo mas, sempre, uma afirmação terá que ser suportada por uma afirmação anterior, sem o que estaremos na presença de um raciocínio incoerente.
Porquê falar de identidades? Uma identidade enuncia um determinado pressuposto e proclama um certo resultado. Por exemplo:
          -   2 + 3 = 5 ou,
          - P = C + G + I + E – M
Complicado? Nem por isso; basta sabermos o que significa cada uma das letras; C é o consumo privado; G é o consumo público; I é o investimento; E são as exportações e M as importações e P é a produção. Quer dizer, a produção de um determinado país esgota-se nos gastos ou destinos que lhe atribui.
- P = RT + EBE
Isto é, a produção é igual à soma das remunerações do trabalho (RT) mais o Excedente Bruto de Exploração (EBE), o que resta da produção depois de pagas as remunerações do trabalho.
Nos dois casos anteriores temos a produção avaliada de duas maneiras, a primeira através da utilização que dela é feita; a segunda, por via dos rendimentos que gera. Ou seja, as despesas geradas na economia num determinado período de tempo têm como suporte os rendimentos gerados por essa economia nesse período. Isto é uma identidade e não há maneira de lhe escapar.
Este raciocínio pode, também, ser levado para o âmbito da atividade do Estado, por ex.:
- S = R  - D, onde R são as receitas, D as despesas e S o saldo orçamental; S será positivo, se as receitas forem superiores às despesas e será negativo, no caso contrário; também aqui estamos na presença de uma identidade.
Mas, estar na presença de uma identidade permite retirar alguma ilação acerca do modo como se chega ao valor de cada uma das suas componentes? Absolutamente nenhuma. Uma identidade é válida num determinado momento do tempo, mas pouco nos diz sobre as consequências da variação de uma das componentes sobre os valores das restantes componentes num outro momento futuro. E isto é assim, porque as diferentes componentes não são independentes umas das outras, ou seja, a variação de uma, hoje, pode ter consequências sobre o valor de outra num momento futuro.
Ora é precisamente isso o que se passa com o saldo orçamental. Aumentar hoje a despesa pública pode ter como efeito aumentar a receita no futuro e até diminuir o peso relativo da despesa no futuro (infelizmente não tenho aqui espaço para explicar como). Não podemos é, quando nos convém, pegar no “tempo” e colocá-lo no caixote do lixo. Não é mais nem menos senão isto o que têm andado a pregar alto e bom som, sem que ninguém os desdiga, aqueles que ganharam as últimas eleições. A isto chama-se “caminhar a olhar para os pés” e quem assim o faz pode ir caminhar para o deserto e sem que, porventura, nada lhe aconteça, mas se quiser caminhar na “cidade dos homens” rapidamente vai bater com a cabeça num candeeiro ou numa placa de rua.

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