A semana que
agora termina foi fértil em acontecimentos com importante significado político.
Refiro-me, em particular, a duas conferências, ambas realizadas no passado dia
30: uma, que foi dinamizada pelo Dr. Mário Soares e teve lugar na Aula Magna da
Reitoria da Aula Magna da Universidade de Lisboa, intitulada “Libertar Portugal
da austeridade” (ver aqui e aqui) e a outra, promovida
pela Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS), para apresentar e discutir um
importante estudo com o título “25 Anos de Portugal Europeu” (ver aqui).
Vem este
apontamento a propósito de um episódio verificado durante as intervenções havidas
durante a Conferência da iniciativa da FFMS. Um dos convidados a realizar uma
intervenção foi o Prof. Elísio Estanque, que comentou o estudo, destacando três
pontos: o dinamismo da realidade económica; os aspetos relevantes para um
projeto de desenvolvimento e modernização do país (educação, inovação,
investigação e desenvolvimento) e, o trabalho e a atividade produtiva.
Durante o seu
comentário o Prof. Elísio Estanque teve o cuidado de explicitar o enquadramento
político da intervenção, bem como os pressupostos políticos de cada um dos
pontos abordados.
Durante o
período de debate, um participante entendeu pôr algumas questões aos vários
intervenientes e, simultaneamente, explicitar que passava por cima da
intervenção do Prof. Elísio Estanque, porque ela era politicamente “marcada”.
É este o meu ponto (como parece que agora se deve
dizer), que quero comentar. Em discussões deste tipo há quem faça a distinção
entre intervenções de cariz essencialmente técnico e intervenções de cariz
predominantemente político, para daí retirar a ilação de que as intervenções de
cariz predominantemente político não têm relevância, porque lhes falta o
suporte técnico que as permitiria fundamentar.
Trata-se de
uma ilação que é um completo “non-sens”,
uma vez que todas as intervenções ditas técnicas, têm pressupostos políticos e
ideológicos, independentemente de eles terem ou não sido explicitados.
Esta falta de
explicitação é, a maioria das vezes, um propósito deliberado, mais parecendo que
se atua como um lobo revestido com capa do arcanjo. É o que tem vindo a
acontecer com a maioria dos estudos técnicos elaborados, por equipas
competentíssimas (?), para fundamentar políticas, em geral de direita, e que têm
subjacentes princípios de liberalismo económico. Naturalmente que estes
comentários nada têm a ver com o estudo dos “25 Anos do Portugal Europeu”. Inversamente,
uma decisão política só tem sustentabilidade se puder ou tiver sido tecnicamente
fundamentada.
Os
apontamentos anteriores não podem deixar de colocar a questão de saber qual é o
papel da técnica, na política. Qualquer estudo técnico tem, como se disse anteriormente,
pressupostos de natureza ideológica, ou política. O estudo tem como objetivo
fundamentar decisões que devam, ou não devam, vir a ser tomadas. No entanto, o
estudo só é útil para o decisor, se os seus resultados forem capazes de
explicitar cenários alternativos, sobre os quais, tendo em conta um juízo de
oportunidade, os políticos decidem, escolhendo o que consideram mais
ajustado para o benefício dos seus representados. Este juízo de oportunidade é
uma prerrogativa dos políticos. Os técnicos, não podem invocar o rigor dos seus
estudos para justificarem uma opção política.
Assim, é
tão lamentável que se diga que um estudo está imbuído de pressupostos
ideológicos, na tentativa de o desvalorizar, como que se afirme que é
politicamente neutro, com o propósito de lhe dar maior credibilidade. Inversamente,
são pouco credíveis as opções políticas que não sejam capazes de demonstrar
a sua viabilidade ou sustentabilidade técnica.
Mostra-se,
deste modo, que a técnica e a política são complementares, embora a primeira
deva estar subordinada aos ditames da segunda.
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