Por mais que se repita que a política de
austeridade é inevitável e que os sacrifícios que ela implica darão os seus
frutos logo que se regresse aos mercados, muitas pessoas estão já no limite das
suas forças e poucos acreditam que, mesmo que aquele resultado se alcance, ele
traga consigo o milagre da recuperação da economia portuguesa.
Dizem-nos (e acreditamos, sem esforço) que o
caminho é estreito mas contestamos que ele deva passar por mais austeridade que
conduza a prejudicar as obrigações do Estado no que se refere aos direitos
sociais garantidos constitucionalmente.
Como observa a Dr.ª Maria João Rodrigues,
Conselheira junto das instituições
europeias, no seu artigo “ Que mensagem para a Europa?”, Portugal deveria levar
à instância política mais elevada - a cimeira da zona euro - uma mensagem
esclarecedora do caminho de austeridade percorrido e das perspectivas muito
negativas que se colocam se nela continuarmos, em particular se se
concretizarem, por exigência da troika, cortes adicionais no Estado social.
Perdeu-se, infelizmente, a oportunidade de
utilizar o Acordão do Tribunal Constitucional para defender, como se impunha, a
renegociação das condições do programa de ajustamento e o tempo escasseia para
que se possa ainda travar a espiral recessiva que ele aprofunda.
Mas as alternativas existem, tanto no quadro
europeu, como a nível nacional, e não podem continuar a ser postas de parte
pelos fundamentalistas da ideologia neo-liberal, usando argumentos de pretensa
racionalidade económica, ou invocando obstáculos de natureza legal, como se
estes fossem intransponíveis.
Recordamos, quanto ao primeiro grupo de
argumentos, o erro do FMI que consistiu numa grosseira sub-avaliação dos
impactos negativos da austeridade sobre o PIB e o Emprego e acrescentamos,
agora, o “ erro da folha de Excel”, da responsabilidade de dois economistas,
Carmen Reinhart e Kenneth Rogoff, que argumentavam, erradamente, que a dívida
pública, acima do limiar de 90% do PIB, provocava a queda abrupta da taxa de
crescimento económico.
Como seria de esperar, as ideias daqueles
influentes economistas, agora desautorizados, tiveram um papel decisivo para
que fosse abandonada a política de estímulos à economia e fossem drasticamente
reduzidas as despesas do Estado. E, entretanto, quanta austeridade
desnecessária, quanto sofrimento inútil!
Outra arma perigosa são os pretensos
argumentos de que as instituições europeias estão limitadas pelos respectivos
mandatos e, portanto, não podem intervir mais eficazmente para apoiar as economias
mais fracas do sul da Europa.
Tal é o caso do Banco Central Europeu que, no
entender de economistas como Martin Wolf, não deveria preocupar-se apenas em
manter níveis baixos de inflação mas (tal como os Bancos centrais), sobretudo
em situações de grave recessão, devia procurar que fossem atingidos os mais elevados
níveis de actividade económica compatíveis com uma inflação estável.
Um outro economista - Wolfgang Münchau -
constata que o BCE, respeitando embora o seu mandato legal, tem ao seu alcance
a possibilidade de ser mais eficaz no apoio ao crédito às empresas do sul da Europa,
pois as medidas que habitualmente toma não têm o impacto esperado sobre as
condições de acesso ao crédito por parte das empresas.
Sugere então que, para além dos incentivos
directos aos bancos para que concedam empréstimos, o que já é praticado, embora
sem grande sucesso, podia o BCE apoiar um vasto programa de concessão de
crédito, a lançar pelo BEI, para cofinanciar empresas de média ou pequena
dimensão, no quadro de uma operação de grande envergadura, rápida e sem
burocracia.
Ou, ainda, uma acção mais radical que poderia
ser a compra pelo BCE de obrigações de empresas no mercado primário e no
secundário. Embora este programa seja mais dirigido a empresas de maior
dimensão, não é, teoricamente, de excluir que dele também possam beneficiar as
de menor dimensão, através de mecanismos adequados.
Outras ideias existem certamente do que pode
ir sendo posto em prática, com o objectivo de contrariar as erradas políticas
que tanto têm afectado as economias do sul da Europa, assim evitando o agravar
de tensões sociais já tão preocupantes.
Se o caminho se faz caminhando, talvez
pequenos passos no bom sentido ajudem a travar a injustificada austeridade…
Fontes:
Jornal “Público” de 10 de Abril de 2013 -
artigo ”Que mensagem para a Europa” por Maria João Rodrigues -; Jornal
Financial Times de 7 de Abril de 2013 – artigo “The ECB’s priority should be to
fix southern Europe” por Wolfgang Münchau – e de 16 de Abril de 2013 – artigo
“How central banks beat deflation” por Martin Wolf.
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ResponderEliminarManuel Brandão Alves22 de Abril de 2013 à0 11:33
Texto muito esclarecedor sobre os muitos caminhos que podem, ainda, ser percorridos, evitando que se continue a escavar!
Mas se é assim, o que é que está a impedir que se inicie a marcha?
Em poucas, mas claras e inisivas palavras, Isabel Roque de Oliveira não só acende mais um sinal vermelho às políticas ditas de austeridade que vêm sendo aplicadas em Portugal e em outras economias do sul da Europa, em nome de pseudo inevitabilidades, como aponta possíveis caminhos, a nível nacional e europeu, para romper com a armadilha da austeridade e abrir as portas a uma necessária e urgente política económica que vise objectivos de desenvolvimento e de satisfação das necessidades das pessoas e promova o emprego dos recursos humanos disponíveis. É um texto que, a meu ver, merece chegar aos media e aos ouvidos de quem tem o poder de decisão.
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